quinta-feira, dezembro 11, 2014

Ensaio em Louvor da Nudez

3. Das fardas

O oposto da nudez não é o vestuário, é o uniforme. Nas artes plásticas e na fotografia, um nu nem sempre representa uma pessoa nua, mas sim uma pessoa uniformizada. Os sapatos de salto alto e a maquilhagem de um modelo de Helmut Newton criam um tipo que se interpõe entre quem vê a foto e a pessoa concreta que lhe serviu de modelo - e que provavelmente não seria reconhecida na rua por quem viu a sua imagem.

Uma pessoa nunca é mais reconhecível do que quando está nua - autenticamente, honestamente nua - e um uniforme é sempre uma máscara. É mais do que uma máscara, porém: é também, ostensivamente, uma protecção. E é uma marca de distinção entre nós e vós. A blindagem do polícia não é nem procura ser discreta: pelo contrário, é o mais ostensiva possível e remete especificamente para as imagens de robots, andróides e cyborgs veículadas pelos media de entretenimento.

A mensagem é clara: "Não procurem em nós humanidade. Nós estamos para além do humano."

A fraqueza desta mensagem está na discrepância entre a imagem e o real. Dentro do uniforme está sempre um polícia, um indivíduo, um ser humano nascido de uma mulher, e tão nu na sua armadura como estava ao nascer. Não admira assim que a mensagem oposta afirme muitas vezes a vulnerabilidade do corpo humano como uma forma superior de protecção.


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