quinta-feira, fevereiro 12, 2015

“Falidos mas livres” (mas não ainda)

Quem acompanha processos europeus complexos está habituado a reuniões decisivas que não decidem, adiam. Faz parte da negociação – e da encenação? – entre estados membros e assim foi ontem à noite, no “encontro do tudo ou nada” entre ministros das Finanças que não foi nem tudo nem foi nada. O destino da Grécia na zona euro fica adiado para segunda-feira. A notícia da noite foi: não houve acordo sequer quanto a um comunicado conjunto.

A falta de acordo até para fechar um comunicado é mais do que o símbolo do fracasso da reunião
. Segundo conta o Financial Times, o ministro das Finanças Varoufakis informou os presentes de que estava de acordo com a publicação de um comunicado conjunto, mas terá sido desautorizado pelo seu primeiro-ministro quando telefonou para Atenas. Eva Gaspar, no Negócios, diz que a reunião não cumpriu sequer os mínimos: "um acordo sobre o método e o calendário a seguir para tentar alcançar um entendimento concreto".

Yanis Varoufakis, que entrou como estrela da noite, fotografado entre os demais com um sorriso largo, recusava à saída em falar de derrota: “Foi-me dada uma oportunidade maravilhosa para apresentar a nossa visão, as nossas análises e as nossas propostas.” Para já, a maior pressão está na forma de assegurar o financiamento da Grécia até setembro
O encontro até começara bem, com Lagarde e Varoufakis a darem a mão e a trocarem piropos, numa inesperada demonstração  de  ternura para as fotografias que quebrou o gelo. “Ele chegou de blazer e calças pretas”, ensaiou Luciano Alvarez no Público, “ela esperava-o toda de preto e de cabedal”, e assim a reunião do Eurogrupo começou “de forma fofinha entre ele e ela. Com ambos rendidos um ao outro, perdidos entre sorrisos e olhares cúmplices.”

A questão não é se a reunião foi “fofinha”, é perceber se o ambiente institucional em torno da Grécia aperta ou distende. Hoje, Alexis Tsipras estará na sua primeira cimeira europeia, com a Grécia na maior indefinição. Tsipras e Varoufakis têm forte apoio popular na Grécia, o que ainda ontem se viu, numa manifestação contra as políticas de austeridade que juntou 15 mil na praça Syntagma, em Atenas, empunhando cartazes com palavras de ordem como “Falidos mas livres” ou “Um sopro de dignidade”.

E Portugal?
 Frase puramente opinativa: Portugal está na posição mais cínica: ao lado da Alemanha desejando que a Grécia vença. Hoje,numa carta dirigida ao primeiro-ministro, um conjunto economistas, políticos, cientistas e outras personalidades apelam a Passos Coelho que mude de posição em relação à Grécia. Os subscritores têm como base os dinamizadores do Manifesto dos 74 que propôs a renegociação da dívida, mas alargam o apoio a outras personalidades. Portugal, note-se, foi o quarto país do mundo que mais aumentou a sua dívida entre 2007 e o segundo trimestre de 2014, de 258% para 358% do PIB. Isso mesmo, 385% em dívida acumulada (Estado, empresas e famílias), segundo um estudo da McKinsey noticiado no Negócios.

Até à segunda, querida Grécia. Até depois, Portugal.

Expresso Curto