sexta-feira, fevereiro 13, 2015

Perdão?

Não me vou render ao populismo de enumerar uma série de atrocidades que foram cometidas contra os rendimentos dos portugueses para argumentar contra o perdão de 1,8 milhões de euros em taxas e taxinhas concedido ao Benfica. Porque não é preciso. A decisão é sempre escandalosa, mesmo que nadássemos todos em dinheiro.
A história é simples. Praticamente tudo à volta do estádio da Luz está ilegal. Ou estava, porque nesta reunião da câmara também passou a estar tudo conforme a lei. Ou melhor, não passou a estar conforme a lei, passou a estar legal. São coisas diferentes. E ainda dizem que Portugal não é a Grécia – passe a deselegância para com os nossos camaradas de austeridade.
Para além disso, havia uma conta de 1,8 milhões de euros que foi perdoada. Porquê? Parece que é por serem equipamentos de referência para a cidade e porque os clubes isto e aquilo. Tretas. Quando é para fazerem negócios milionários os clubes são poderosas sociedades anónimas, mas quando se trata de pagar impostos são pequeninas associações sem fins lucrativos com um papel muito relevante na comunidade.
Reconheçamos, porém, que perdoar é sempre bonito. Mas então a Câmara de Lisboa tem de perdoar todos, na medida em que os habitantes da cidade, os que lá trabalham e os que lá investem são também, bem vistas as coisas, equipamentos de referência. E em bom rigor, uma cidade até sobrevive sem clubes de futebol, sem povo é que não faz qualquer sentido. Estou a render-me um pouco ao populismo, admito, mas do outro lado temos um perdão fiscal a um clube com seis milhões – ou mais – de adeptos, portanto também posso um bocadinho.
Entretanto, estamos a falar de uma autarquia que ainda há bem pouco tempo decidiu aplicar taxas sobre os turistas. Curiosamente, uma dessas taxas tem uma previsão de receita semelhante ao valor que agora se perdoou ao Benfica.
Será que os turistas não são um “equipamento de referência” para a cidade? Claro que são. Mas levaram com uma série de taxas sem apelo nem agravo. Já sei: É só um euro por cada, não custa nada. Então nesse caso, se os seis milhões de adeptos do Benfica dessem um euro – que também não custa nada – a Câmara arrecadava seis milhões e o Benfica passava a ser uma referência ainda maior para a cidade.
Não está em causa o Benfica, atenção. Tenho imensas coisas contra o Benfica, mas esta não é uma delas. O problema é maior e de natureza política. Decisões deste tipo só tornam cada vez mais claro que em Portugal só se cresce ou meramente se sobrevive escapando aos impostos. Há quem não tenha meios e por isso tenha de penar. Há quem tenha meios e se faça à estrada. Até há quem não precise de sair do seu lugar e até possa construir à volta. Sem licença.