terça-feira, maio 19, 2015

A quem pertencem os “anéis”?

«A privatização da TAP está a suscitar no país uma polémica sem precedentes. A decisão de privatizar ou não a TAP deveria ser tomada pelo próximo governo uma vez que o actual se encontra em fim de mandato. Porém, o governo quer rapidamente privatizar a maior exportadora portuguesa, crucial para a indústria do turismo e de grande relevância e valor para a economia nacional, para as comunidades portuguesas e países da lusofonia. Querer tomar uma decisão de tamanha importância num período de tempo tão curto atenta contra o interesse nacional.

Com efeito, não parece possível que, tendo recebido ontem, 15 de Maio, as propostas de compra que oficialmente desconhece, possa, até 20 de Junho de 2015 (fim do mandato eleitoral de 4 anos do actual governo), tomar uma decisão que se fundamente na análise e negociação rigorosa das propostas dos potenciais compradores e acautele o interesse nacional. Após 20 de Junho, não tem qualquer legitimidade política para tomar essa decisão. Os eleitores elegeram o governo por quatro anos, não mais que isso. Privatizar à pressa e mal, é o pior presente de aniversário para a TAP que acabou de celebrar 70 anos e que merecia, pelo desempenho que tem tido e pelo seu contributo para o desenvolvimento do país, um melhor tratamento!

Nos últimos quatro anos, as “privatizações” têm sido feitas a um ritmo vertiginoso. Alguns exemplos: o governo, em 26 minutos, decidiu a venda da posição do Estado (via CGD) na Cimpor a um grupo brasileiro, sem discutir preço, à revelia do Conselho de Administração da CGD e assistiu de forma passiva ao seu posterior desmembramento; uma das primeiras medidas do governo recém-empossado foi desfazer-se, sem condições, das Golden Shares na Portugal Telecom (PT), EDP e Galp, por convicção; promoveu a “nacionalização” parcial da EDP e da REN pelas empresas estatais chinesas China Three Gorges e State Grid, respectivamente; instrui a CGD para vender as posições, na minha opinião estratégicas, de 10% que a CGD detinha na PT  e de 100% da Caixa Seguros; não tomou qualquer posição quando a PT fez um negócio “de fusão” com contornos muito estranhos com a Oi, apesar de deter via Novo Banco e do Fundo da Segurança Social mais de 10% da PT . Essa “fusão” entre a Oi e a PT foi catastrófica para os accionistas da PT e para o interesse do país; vendeu a ANA que, entretanto, já aumentou preços numerosas vezes; expurgou o “lixo tóxico” do BPN e injectou 600 milhões de euros na parte boa do BPN para, logo de seguida, vendê-lo ao BIC por 40 milhões de euros[1] (entretanto, as cláusulas do contrato de venda já resultaram em pagamentos ao BIC, pelo que o preço líquido deverá ter sido negativo, ou seja o BIC comprou a parte boa do BPN e ainda recebeu dinheiro do Estado).

Acordou com a troika privatizações de 5,5 mil milhões de euros. Realizou 8 mil milhões de euros de privatizações que, em teoria serviriam para abater e reduzir a dívida pública e, mesmo assim, a dívida pública não parou de aumentar atingindo níveis record.

Por outro lado: paga empréstimos antes do tempo, registando enormes menos valias; tem os “cofres cheios”, gastando cerca de 500 milhões de euros por ano em 2015 para o fazer; aumenta impostos, corta salários, pensões e apoios sociais; e despede funcionários públicos.

Prepara-se, ainda, até ao verão, para “privatizar” um banco privado com injecções maciças de dinheiros públicos, procurando formas de aumentar (de novo, com dinheiros públicos) a valorização do Novo Banco, para que se possa argumentar que a “venda” foi um sucesso e evitar que a restante banca privada se recuse a assumir as perdas do fundo de resolução.

Parece que o que interessa é vender seja por que preço for, ou até pagar para vender.