sexta-feira, maio 08, 2015

Dentro ou fora do consenso?

Vítor Bento, já totalmente recuperado das últimas aventuras bancárias, declarou ontem ter recebido “com agrado a componente liberal que é trazida a esta discussão” pelo relatório do PS. Compreendo bem o seu agrado, já que nosso é o desagrado. Este bloco central no campo intelectual abre caminho ao político, como também defendeu Bento num debate no ISEG sobre o tal relatório. Confirmando que isto está tudo ligado, o sempre subestimado Cavaco Silva, que ainda sabe uma ou duas coisas sobre hegemonia, convidou esta semana Mário Centeno para os últimos roteiros do futuro. 

Assim, o futuro parece ser mais uma década perdida para a maioria. Já serão duas: um sucesso este euro, não percam a esperança e, entretanto, tratem mas é de fazer força, enquanto as nossas elites gemem com ficções: será que a UE alguma vez poderá ser como os EUA? Sim, parece que também para amplos sectores da esquerda, os EUA são o futuro normativo que justifica os presentes sacrifícios. Com o tal “consenso europeu”, a regressão também é ideológica.

Todos estes desenvolvimentos tornam ainda mais necessária a formação de um pólo político popular e nacional, o tal povo unido, mas, ao contrário do que aqui já defendi, não deverá substantivamente tratar-se de um terceiro pólo, mas antes de um segundo, ou seja, da construção de uma verdadeira alternativa soberanista e democrática ao tal consenso intelectual e político do bloco central. Ancorada em valores de esquerda, terá de ser capaz de atrair todos os que, na direita democrática ou subjectivamente fora da divisão esquerda/direita, acham que isto ainda pode e deve ser um país, recusando aventuras federalistas, outros tantos caminhos hayekianos, em nome da recuperação nacional de instrumentos de política, sem os quais só haverá esta impotência pós-democrática.

E por todos estou a pensar, só para dar um exemplo num campo intelectual atrofiado, em Pacheco Pereira, caso este tire as ilações políticas positivas do que tem vindo a escrever nestes dias que são realmente do lixo: “Pobre país o nosso, entregue a estas cabeças e a este desastre ambulante que é hoje a Europa. Esta é das previsões mais fáceis de fazer: vai haver surpresas e todas elas fora do ‘consenso europeu’. É que a história não é feita de modelos”. As franjas, sempre as franjas, reparem.


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