quinta-feira, maio 21, 2015

Um braço de ferro com a democracia

O governo grego tem feito tudo para evitar a bancarrota e para levar uma negociação com os credores europeus (e não apenas uma rendição) a bom porto. No processo negocial com as instituições europeias, tem mostrado até disponibilidade pare suspender muitos dos seus compromissos eleitorais e fazer esforços orçamentais quase impossíveis para o País. Por estes dias, chegou a circular o rumor, talvez verdadeiro quando foi segredado aos jornalistas, de que havia um “plano Junker” para, em troca de algumas contrapartidas, libertar já a última tranche acordada com a troika e o pagamento respeitante a lucros com o programa de compra de dívida, a partir de julho. Isto permitiria que a parte difícil da negociação, que envolve as linhas vermelhas de Tsipras, pudesse ser feita com mais tempo e mais seriedade. O presidente da Comissão Europeia já veio desmentir.
A estratégia de vários poderes europeus é clara: empurrar a Grécia até à bancarrota para que esta ceda em políticas que foram recusadas pelo voto popular.Alterações nas leis laborais, por exemplo. Alterações que, a não ser nas cabeças fantasiosas dos ideólogos que tomaram Bruxelas de assalto, não correspondem a qualquer garantia de crescimento económico e que, por isso, não têm qualquer relação com a sustentabilidade da dívida grega. De resto, são os cortes do costume. E compreende-se que um país onde as 45% das pensões estão abaixo do limiar de pobreza não aceite que fazer ainda mais cortes aqui possa ser a moeda de troca para um acordo. Ou que não esteja disponível para cortar ainda mais nos salários. Estas são, e têm de ser, as linhas vermelhas de Tsipras. Para quem hoje manda nesta Europa seria ouro sobre azul se ultrapassassem essas linhas: ou o governo grego caía ou deixava de corresponder a uma ameaça ao staus quo.
A situação de impasse que as instiruições não eleitas da União estão a alimentar, procurando encostar os gregos à parede, fez disparar as taxas de juro no mercado secundário em 25%, no prazo a dois anos. Isso sim, sabemos a relação direta que terá com a insustentabilidade da dívida grega.
Aquilo a que na Europa se chama “acordo abrangente”, e que é o que continua em cima da mesa para pagar a última tranche do empréstimo, mais não é do que um ato de chantagem político para partir a espinha à democracia grega. E esta última tranche é a oportunidade de o fazer, obrigando o governo eleito pelos gregos a negociar em estado de profunda necessidade e garantindo assim, de uma forma ou de outra, a tal vacina que o movimentos do “consenso europeu” contra a democracia precisa. Até por o governo grego continua a garantir que não vai querer um terceiro resgate. A verdade é que nos 30 meses do governo de Samaras, que por cá há quem tenha o desplante de tratar como mais ponderado e sério do o de Tsipras, houve mais receitas com empréstimos do que despesas com reembolsos. Pelo contrário, desde que o Syriza chegou ao governo, não foi recebido um euro mas pagaram-se 6500 milhões de euros aos credores.
O braço de ferro com a Grécia está muito para lá das garantias de reaver a dívida. É um braço de ferro político que tem uma mensagem clara para os restantes europeus: os programas de governo já estão escritos e não têm de passar pelo escrutínio popular. Esta é a nova Europa que nos é proposta. E o seu vencimento joga-se, em grande parte, em Atenas.