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terça-feira, dezembro 05, 2006

Falácias

Ultimamente tenho ouvido muito esta palavra. No debate sobre a IVG e em alguns comentários neste blog fui acusado de apresentar argumentos falaciosos. Por isto, e por ter leccionado esta matéria recentemente, deu-me para escrever umas coisas sobre falácias.Uma falácia é um erro de raciocínio, uma inferência incorrecta. Não é uma opinião da qual discordamos. Não é falácia ser do Benfica ou do Sporting, nem considerar o embrião uma pessoa ou uma migalha de carne. Nem é a omissão de dados. Dizer que tenho razões para o que faço e não as enumerar enfraquece o argumento, mas não é um erro de raciocínio. Nem sequer é falácia partir de falsas premissas: “Como chove pianos acho melhor ir de Metro”. A premissa é falsa, e por isso podemos discordar da conclusão, mas o raciocínio é correcto: se de facto chover pianos é boa ideia ir de Metro. Vejamos algumas falácias comuns.Apelo à crença ou prática comum. Nesta falácia justifica-se uma crença ou prática por ser aceite por muitos. Mas mesmo que seja verdade que é aceite por muitos não se justifica concluir que é crença verdadeira ou prática adequada. A conclusão não segue das premissas, pelo que o raciocínio é falacioso. Exemplos: Tanta gente acredita em deuses e no sobrenatural, por isso deve haver aí algo de verdade. Tantos países no Ocidente legalizaram o aborto, por isso devíamos fazer o mesmo. Na petição de príncipio, ou raciocínio circular, as premissas dependem da conclusão. Por exemplo: Eu sei que Deus existe porque vem na Bíblia, que é a palavra inerrante de Deus. O erro não está em afirmar que algo é verdade se for verdade; essa inferência é trivialmente correcta. O erro está em concluir daqui que esse algo é mesmo verdade. Em teologia é comum ver-se esta falácia no apelo à coerência interna de um modelo. Por exemplo, dar a ausência de contradições na Bíblia como prova da sua veracidade (a Bíblia tem contradições, mas isso não é falácia, é um erro factual).Ad hominem, o ataque à pessoa, é infelizmente muito vulgar. Consiste em rejeitar um argumento com base numa característica irrelevante de quem o defende. Por exemplo, rejeitar um argumento pela protecção do feto porque é proferido por um padre ou um crente católico. Uma variante é o ad homimem tu quoque, em que se rejeita um argumento porque as acções passadas do que o defende contrariam a conclusão. Por exemplo, rejeitar que mulheres que abortaram condenem o aborto, ou pessoas que roubaram condenem o furto, ou pessoas que já mentiram condenem a mentira. Esta falácia é especialmente comum entre crianças e dirigentes de clubes de futebol, mas aparece um pouco por todo o lado.Há duas coisas que não são falácias mas que muitas vezes são confundidas com falácias. Uma é o argumento indutivo: a maioria dos pássaros voa, por isso concluo que o pinguim voa. A conclusão é falsa, mas o raciocínio não é falacioso: a menos que haja informação que indique que o pinguim é excepção, é razoável concluir que é como a maioria dos pássaros. Uma falácia comum associada ao argumento por indução é a generalização precipitada: como o pinguim não voa, a maioria dos pássaros não voa. A outra fonte de confusão é a explicação causal: chove porque a deusa do céu está triste. Isto pode parecer uma falácia mas é uma relação causal apresentada como facto e não uma inferência lógica. Resumindo, falácias são erros específicos de raciocínio, e independentes das questões de facto. É útil apontar falácias nos argumentos se identificarmos a inferência errada e o erro cometido. Mas se é inútil, e incorrecto, gritar “Falácia!” só porque discordamos da conclusão. A menos que seja num debate, para interromper o outro a meio do raciocínio...
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