Esta reflexão que pretendo realizar é suscitada pelo diálogo tido nas duas sessões do seminário. Reflexão que pretende fundamentalmente levantar interrogações onde o domínio filosófico está compreendido. Obviamente que o que acabei de dizer é pouco significativo pois se a filosofia tem um teor englobante (posição com a qual todos os intervenientes mostraram estar de acordo) todas as questões lhe dizem respeito. Mas o autor destas linhas tem as suas opções pessoais, que lhe são ditadas pelos seus interesses e pela compreensão que ele faz do mundo. É uma situação que se aplica a todos nós, aprendizes de filósofos, diferindo "somente" na importância qualitativa que atribuímos às diferentes questões. Penso no entanto que podemos estabelecer certos pontos iniciais de contacto, sem querer ser utópico. Naturalmente que não quero criar a ideia de consenso, ideia essa que é importante no domínio científico (direi mesmo mais decisiva), mas que em filosofia, pelo menos na filosofia como a entendo, é um conceito sem grande sentido porque não tem operacionalidade. Há certos pontos que quero começar por questionar. Diz-se que filosofar é interpretar. Só posso aceitar em parte esta afirmação. Filosofar é interpretar pelos motivos apontados nas sessões, mas não é só isso. Filosofar é criar, é construir. É claro que ao interpretar estamos a fazer, logo a criar, mas o tipo de construção a que me refiro é de índole diferente. Só se toca o real modificando-o, transformando-o. O mundo é um todo organizado com sentido, mas no meu entender uma organização em crise, para usar um vocábulo em voga, embora não se queira ter a ousadia de o explorar in extremis. Estou a tentar valorizar naturalmente uma prática que tanto pode ser individual como social. Melhor dizendo: deve ser individual, por um lado, mas, por outro, social. Na sessão disse-se que fazer filosofia é fazer o mundo. Acrescentarei: fazer o mundo, modificando-o. A pergunta que se coloca bem à nossa frente neste momento é a pergunta pelo como. Não quero neste momento responder directamente, mas o que se me apraz dizer é que não se apela aqui para uma solução política, como tudo poderia indicar, mas para uma solução de outro teor qualitativamente diferente, sublinho radicalmente diferente. O domínio político, o domínio ideológico, esmaga o nosso viver que naturalmente quer ser livre e não estar sujeito a categorias formais desta espécie. A filosofia, como eu a entendo, estabelece um fosso com o político embora nalguns momentos possa eventualmente ter alguns pontos de contacto com ele. Numa sociedade como a nossa, com o tipo específico de organização social que todos lhe conhecemos é difícil agir sem que isso não seja aglutinado no domínio político, ou para ser mais correcto, no ideológico, por muito inocente que essa acção seja.
Também se disse que a filosofia é obra. Fazer filosofia implica realizar uma obra nem que isso seja a vida de um homem. Sobre esta questão gostaria também de dizer duas palavras. Concordo com esta posição do fazer a filosofia e para mim fazer uma obra é primeiro que tudo fazer uma obra escrita. Dou o predomínio da escrita, sobre o oral e como exemplo relembro o caso de Sócrates. Mas essa obra que se transmitiu para o papel necessita de ter uma aplicação prática. Aqui há um problema que quero esclarecer. Há filosofias que podemos caracterizar como individualistas e não estou a utilizar este vocábulo no sentido pejorativo, que muitas pessoas lhe dão. Para esses, uma aplicação prática da sua obra está facilitada. Mas há filosofias que chamarei aqui do social e que para a sua aplicação prática implica a sua não recusa por parte dos outros. Nesse caso o autor dessa filosofia deve viver de acordo com a sua obra, ou pelo menos não agir de modo a colocá-la em xeque.
A obra de filosofia para mim está de acordo com esta frase latina: "Opus artificem probat". A obra mostra o artífice. O sentido que quero realçar é o sentido ético. A obra mostra o artífice, no sentido do homem revelar-se, mostrar o que é, pelas suas acções. Só assim a obra escrita tem a sua realidade e a sua fundamentação. Queria só falar de um caso que posso considerar paradigmático na filosofia, que é o caso Heidegger. Ainda hoje não consigo compreender como é que um homem como Heidegger -quando falo aqui em homem não me refiro à sua personalidade, porque nunca o conheci, mas ao conjunto da sua produção filosófica - pode aderir num determinado momento da sua vida ao Nacional-Socialismo. A interrogação aqui fica para quem a quiser desvendar.
Para acabar esta reflexão, quero por esta questão que poderia ser posta ao autor destas linhas. Como é possível defender-se o que aqui se acaba de defender nomeadamente a crítica à dimensão política e para tese de mestrado o autor proponha o pensamento político e social de Proudhon? Parece haver aqui uma contradição, mas é só uma contradição aparente. Sem querer entrar no pensamento proudhoniano que não cabe nesta reflexão por motivos óbvios, quero só dizer que Proudhon corresponde ao autor da obra filosófica como eu o apresentei nestas linhas e chamaria só a atenção para a sua obra de 1846, Système des Contradictions Économiques onde no rosto do livro se pode ler a seguinte sentença "Destruam et Aedificabo". Interpreto esta sentença em Proudhon, como a vontade da mudança, como a vontade da transformação. Como será essa transformação? Isso é uma outra história que não cabe nesta reflexão.
Também se disse que a filosofia é obra. Fazer filosofia implica realizar uma obra nem que isso seja a vida de um homem. Sobre esta questão gostaria também de dizer duas palavras. Concordo com esta posição do fazer a filosofia e para mim fazer uma obra é primeiro que tudo fazer uma obra escrita. Dou o predomínio da escrita, sobre o oral e como exemplo relembro o caso de Sócrates. Mas essa obra que se transmitiu para o papel necessita de ter uma aplicação prática. Aqui há um problema que quero esclarecer. Há filosofias que podemos caracterizar como individualistas e não estou a utilizar este vocábulo no sentido pejorativo, que muitas pessoas lhe dão. Para esses, uma aplicação prática da sua obra está facilitada. Mas há filosofias que chamarei aqui do social e que para a sua aplicação prática implica a sua não recusa por parte dos outros. Nesse caso o autor dessa filosofia deve viver de acordo com a sua obra, ou pelo menos não agir de modo a colocá-la em xeque.
A obra de filosofia para mim está de acordo com esta frase latina: "Opus artificem probat". A obra mostra o artífice. O sentido que quero realçar é o sentido ético. A obra mostra o artífice, no sentido do homem revelar-se, mostrar o que é, pelas suas acções. Só assim a obra escrita tem a sua realidade e a sua fundamentação. Queria só falar de um caso que posso considerar paradigmático na filosofia, que é o caso Heidegger. Ainda hoje não consigo compreender como é que um homem como Heidegger -quando falo aqui em homem não me refiro à sua personalidade, porque nunca o conheci, mas ao conjunto da sua produção filosófica - pode aderir num determinado momento da sua vida ao Nacional-Socialismo. A interrogação aqui fica para quem a quiser desvendar.
Para acabar esta reflexão, quero por esta questão que poderia ser posta ao autor destas linhas. Como é possível defender-se o que aqui se acaba de defender nomeadamente a crítica à dimensão política e para tese de mestrado o autor proponha o pensamento político e social de Proudhon? Parece haver aqui uma contradição, mas é só uma contradição aparente. Sem querer entrar no pensamento proudhoniano que não cabe nesta reflexão por motivos óbvios, quero só dizer que Proudhon corresponde ao autor da obra filosófica como eu o apresentei nestas linhas e chamaria só a atenção para a sua obra de 1846, Système des Contradictions Économiques onde no rosto do livro se pode ler a seguinte sentença "Destruam et Aedificabo". Interpreto esta sentença em Proudhon, como a vontade da mudança, como a vontade da transformação. Como será essa transformação? Isso é uma outra história que não cabe nesta reflexão.