sábado, outubro 18, 2008

Entrevista de Maria de Lurdes Rodrigues

Esta senhora, quanto mais fala, mais se enterra. Desta vez falou com a Visão. Eis alguns pontos em que deixou transparecer uma mentalidade que roça a abjecção:"A escola não é para passar o tempo, é para as pessoas se qualificarem": Errado, senhora Ministra; errado, perigoso, criminoso, desumano: uma afirmação que só podia sair da boca dum bárbaro. A escola não é para as pessoas se qualificarem, é para as pessoas aprenderem. A qualificação vem por acréscimo, e ainda bem que vem: mas um professor que se preze forma pessoas, não fabrica mão-de-obra." Mas o que é que retirava [para reduzir a carga horária dos alunos]? Retira o Inglês ou as línguas estrangeiras? A Matemática? O Português?" Retiro a Educação Visual, cujo programa (se o tem) pode ser incluído na Expressão Plástica. Retiro a Área de Projecto, que é uma invenção sinistra destinada a dar uma aparência de nexo onde o nexo não existe. Retiro a Formação Cívica, porque para formar civicamente os alunos o que é preciso é discipliná-los e responsabilizá-los, e não impingir-lhes mais uma disciplina. Retiro a Introdução às Tecnologias da Informação e da Comunicação, porque é uma disciplina de banda estreita e não ensina nada que não esteja obsoleto daqui a dez anos."Não é dramático que os alunos não tenham música ou desporto na escola". É dramático, sim, senhora Ministra. É mais que dramático: é trágico. Esta frase, senhora Ministra, mostra bem quem a senhora é e em que conceito qualquer pessoa civilizada a pode ter."Essa história do tempo para brincar é uma história nova, que surge agora com a escola a tempo inteiro." Nova, senhora Ministra? Só se for para quem aterrou agora na Terra vindo de Marte, que é a impressão que a senhora dá."No passado era uma escola pública reduzida a mínimos absolutamente intoleráveis, uma escola que funcionava das nove à uma." Durante seis anos ensinei na Suíça, onde a escola funcionava das oito às doze e trinta. Toda a gente achava isto perfeitamente tolerável. E, por muito que lhe custe, as crianças aprendiam (mas já me estava a esquecer: a sua prioridade não é a aprendizagem, é a "qualificação", seja lá isso o que for)."Nunca ouvi uma crítica ao tempo para brincar das crianças cujos pais andam com elas para a escola de música, para o ginásio, para a explicação, para aqui e para ali." Isso é falta de leituras, senhora Ministra. Leia mais livros. E se a sua intenção é impedir os pais de andarem com as crianças para aqui e para ali conforme entendem melhor, então está revelada a sua propensão totalitária."Em Portugal a maior parte das mulheres trabalham. E precisam absolutamente que a escola seja um espaço seguro e qualificado, ao qual possam confiar as crianças." E porque é que as mulheres trabalham, senhora Ministra? Por terem escolha ou por não terem escolha? Lá que precisam de um espaço seguro e qualificado ao qual possam confiar as suas crianças, lá isso precisam. Mas porque carga de água é que este espaço há-de ser a escola, que tem outras funções? (mas já me esquecia outra vez: a senhora Ministra não conhece nem reconhece estas funções)."Felizmente, temos muitos professores que aceitam, querem e consideram que estas são formas de valorizar a escola." Pois temos: são os que dizem "póssamos" e "tivestes" e escrevem "andá-mos". Destes, podemos ter a certeza que já estudaram as grelhas de avaliação e estão mais que preparados para lhes dar a volta de forma a obter as classificações mais altas. São os aliados naturais da senhora Ministra nas escolas."Hoje, o País tem milhares de jovens diplomados a querer entrar no sistema de ensino." É curioso: olhando para os meus familiares e para os familiares dos meus amigos e conhecidos, o que eu vejo mais é jovens diplomados a emigrar. Não conheço um único que não reaja horrorizado à ideia de ser professor. Mas também não conheço nenhum que diga "póssamos": deve ser por isso.
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