Calma, não comecem já a rir, até porque lido todo o texto podem, eventualmente, não achar graça nenhuma.
De facto e, por mais idiota que isto vos pudesse parecer, a proposta de Orçamento do Estado para 2009, elaborada pelo Ministro das Finanças, pretende alterar o Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro, que estabelece as normas da avaliação docente.
No artigo 138º da proposta de orçamento pode ler-se:
“Alteração do Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro
1 - O artigo 12º do Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de 10 de Janeiro, passa a ter a seguinte redacção:
«Artigo 12º
1 - [...].
2 - [...].
3 - [...].
4 - [...].
5 - [...].
6 - Às delegações previstas nos nºs 2 e 4 não se aplica o disposto no nº 2 do artigo 37º do Código do Procedimento Administrativo, sem prejuízo da possibilidade da sua afixação em local apropriado que possibilite a sua consulta pelos interessados.»
2 - A alteração prevista no número anterior produz efeitos desde a data de entrada em vigor do Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de 10 de Janeiro, aplicando-se aos actos praticados desde essa data.”
Para quem não está a par da “trapalhada” que o OE pretende abafar, a questão era esta:
O Código do Procedimento Administrativo (CPA) obriga (através do nº 2 do artigo 37º) a que na administração central, a delegação de poderes, seja publicada em Diário da República (DR). Acontece que, na generalidade das escolas (e agrupamentos), a delegação de poderes dos 4 professores avaliadores (6, no caso dos agrupamentos verticais) noutros professores titulares, se fez apenas por redacção da mesma, em acta do Conselho Pedagógico.
Lurdes Rodrigues, atrapalhada com o atropelo legal deve ter pedido ajuda e, Teixeira dos Santos, qual Dom Quixote do século XXI (ao que tudo indica, não menos alucinado que o original) sai em defesa da sua volumosa, desculpem, queria dizer afectuosa, Dulcineia, criando esta excepção. Neste caso e, apenas neste caso, não se aplica o CPA, que isso dava muito trabalho, enchia páginas e páginas do DR e atrasava essa causa suprema que é a avaliação dos malandros, perdão, dos professores.
Mas D. Quixote, perdão de novo, o senhor ministro, inebriado pela avareza, digo, pela beleza, da sua Dulcineia perde a noção do tempo e, já perto do final do seu (e infelizmente nosso) orçamento dispara este artigo 153º:
“Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009.”
Ora bem, saindo do mundo virtual dos Quixotes e Dulcineias do nosso governo, vamos aos factos…
1- Com esta proposta orçamental, o governo reconhece que neste momento, além do Presidente do Conselho Executivo, há apenas 4 avaliadores nas escolas (6 no caso dos agrupamentos verticais), pois os outros encontram-se numa situação ilegal, uma vez que as competências que lhes foram delegadas carecem de publicação em DR. É que a Lei, que terá efeitos retroactivos a Janeiro de 2008, só entra em vigor a 1 de Janeiro de 2009, portanto só a partir dessa data poderá ter retroactividade (partindo do pressuposto que juridicamente a retroactividade é possível nestes casos).
2- No meu modesto entendimento, este artigo 138º do OE é uma verdadeira pérola legislativa, repare-se na Constituição da República Portuguesa (CRP):
- No número 2 do artigo 56º: “Constituem direitos das associações sindicais: a) participar na elaboração da legislação do trabalho”;
- No número 1 do artigo 105º: “O Orçamento do Estado contém: a) a discriminação das receitas e despesas do Estado, incluindo aos dos fundos e serviços autónomos; b) o orçamento da segurança social”.
Ora, no primeiro caso, não me parece que os sindicatos tenham sido ouvidos sobre esta alteração ao Decreto Regulamentar nº 2 de 2208, até porque o acordo de entendimento assinado entre o Ministério da Educação e a Plataforma de Sindicatos não prevê nenhuma alteração legislativa relacionada com a avaliação docente, neste ano lectivo. No segundo caso, talvez fosse melhor, o governo, rápida e disfarçadamente, acrescentar uma alínea c) ao artigo 105º da CRP, para que o OE possa conter alterações a todos os diplomas legais que estejam a criar embaraços a qualquer ministro e, se não for pedir muito, talvez uma alínea d) com uma ou duas receitas de arroz-doce.
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