As democracias não se podem esgotar nas organização conhecidas e é importante que se criem outras formas de participação. Quem nunca leu alguma coisa a este respeito?
Pois é, mas quando os cidadãos querem ter voz para além da ordem existente, logo se levantam súplicas, muitas delas receosas e acomodadas, que se assustam com o exercício cívico da acção livre e apenas, na maioria dos casos, claro, comprometidas com as causas que as suas convicções democráticas inspiram. E que ninguém se engane: a desordem aparente da opinião livre e não enquadrada na regularidade, está aí e não se vai embora tão depressa: revela até, como se viu recentemente e com se está a ver agora, tendências de crescimento e de consolidação.
Parece-me que pode estar nesta formulação a génese da situação que se vive no seio dos professores portugueses.
Existe alguma perplexidade com a marcação de duas datas para manifestações no próximo mês de Novembro.
E porquê?
Recuemos ao célebre 8 de Março de 2008. Nesse dia estiveram cem mil professores em "rede" e a razão para tanta unidade deveu-se a todos:
em primeiro lugar aos professores e às suas novas formas de comunicar;
e depois às organizações existentes, e às emergentes, que souberam dar corpo à saturação desta classe profissional.
Seguiu-e um período de "entendimento" com a incompetente equipa que dirige o ministério da Educação. Essas "tréguas" foram lideradas, naturalmente, pela plataforma sindical.
Mas desde logo os mais avisados sentenciaram: isto é uma espécie de pausa, a luta seguirá dentro de momentos, lá para Outubro ou Novembro. E sabia-se isto por um motivo óbvio: a ponta do "iceberg", o modelo de avaliação do desempenho dos professores, é um monstro brutal e inexequível. Bastaria que a suspensão do modelo terminasse e que os professores "arrumassem" as tarefas iniciais do novo ano lectivo, para que o estudo dos detalhes do monstro originasse a maior das contestações.
E é aí que estamos e que estaremos até que o monstro caia por si - se olharmos para a ideia original do assombro, ele começa a ficar irreconhecível - ou que seja derrubado.
A manifestação de 15 de Novembro nasceu pela força dos professores. A plataforma sindical, que inicialmente só previa acções de rua lá para a primavera - depois para o final do 2º período, posteriormente para o final do 1º período, de seguida (está difícil encontrar sinónimos para o depois) para o mês de Novembro - marcou, com o desígnio da oportunidade temporal, para o dia 8 de Novembro. Argumento esfarrapo, convenhamos. A plataforma sindical, em vez de apoiar os professores e convocar uma manifestação para 15 de Novembro e com isso acabar logo com esta situação de divisão - e basta pensar um bocado -, decide-se por uma espécie de táctica.
Mas que raio: haverá algum problema em que os professores e um dos movimentos - o único legalizado, julgo eu - marquem uma manifestação? Nem há, nem vai deixar de se realizar a expressão pública de sentimentos individuais e grupais, parece-me.
Espero que ainda haja tempo para um entendimento. Desta vez, que não seja uma espécie, como o de Março, nem algo meramente táctico: que seja um entendimento estratégico, que defenda a resolução dos problemas dos professores e da escola pública de qualidade, que a luta é longa e está a deixar milhares de "feridos" (para ser brando) pelo caminho. Mas tem de ser rápido e envolvido num respeito pelas saudáveis diferenças e com a convicção, e com a inteligência, de que quase todos estão de boa fé. Uma leitura de Amos Os ajuda a perceber o modo de o fazer. Num dos seus livros, "contra o fanatismo" pode ler-se:
"A essência do fanatismo reside no desejo de obrigar os outros a mudar... O fanático é uma das mais generosas criaturas. O fanático é um grande altruísta"
http://correntes.blogs.sapo.pt/156561.html
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