A Direcção Geral do Orçamento do Ministério das Finanças acabou de publicar a informação relativa à execução do Orçamento de Estado de Março de 2009. E os dados publicados confirmam o descalabro que se está a verificar nas receitas fiscais, que não tem apenas como causa a contracção da economia.
No 1º Trimestre de 2009, só as receitas do IRS, e do Imposto Único de Circulação é que cresceram, embora estas últimas em apenas +13,8 milhões de euros (as do IRS aumentaram em 62,4 milhões de euros). As receitas de todos os outros impostos diminuíram relativamente ao arrecadado em idêntico período de 2008, nomeadamente as do IVA que tiverem uma quebra de -20,3% (menos 736,6 milhões do que o arrecadado em 2008). Como consequência, no 1º Trim. de 2009 o Estado arrecadou menos 991,9 milhões € de receita fiscal do que no 1º Trim. 2009.
Se o descalabro nas receitas fiscais continuar ao mesmo ritmo que o registado no 1º Trim. 2009, o Estado arrisca-se a arrecadar este ano menos 5.480,9 milhões de euros do que tinha previsto no OE2009 inicial e menos 3.750,86 milhões de euros que o previsto no OE2009 Complementar. E 5.480,9 milhões de euros correspondem a 3,2% do PIB previsto para 2009, e 3.750,86 milhões de euros correspondem a 2% do PIB. Isto significaria que o défice orçamental aumentaria entre 2,0 pontos percentuais e 3,2 pontos percentuais em 2009 só devido à quebra da receita fiscal.
Em relação à Segurança Social, a situação embora seja menos grave é também preocupante. No 1º Trim. 2009, as receitas da Segurança Social com origem nas contribuições só aumentaram 0,7% relativamente às arrecadas em idêntico período de 2008. Como o governo prevê no Orçamento da Segurança Social para 2009 um aumento 5,6%, isto significa que a Segurança Social, só no 1º Trim. 2009, tenha recebido menos 157,9 milhões de euros que o previsto no seu orçamento para este ano. Se tal diferença de receita em relação ao previsto se se mantiver, a Segurança Social poderá arrecadar em 2009 menos -500 milhões de euros, só por esta razão, relativamente à receita prevista no seu orçamento deste ano.
A dimensão da quebra que se está a verificar a nível das receitas fiscais, e nomeadamente da receita do IVA (-20,3% no 1º Trim.2009) só pode ser explicada pelo aumento significativo da evasão e fraude fiscal, e pela subida vertiginosa dos impostos retidos pelas empresas. Efectivamente, uma contracção no PIB de 4,5% não significa uma redução nas receitas fiscais de igual dimensão percentual. E isto porque a redução em 4,5% é calculada a preços constantes, e os impostos, nomeadamente do IVA, são cobrados tendo como base o PIB a preços correntes. Por exemplo, uma contracção de 4,5% do PIB a preços constantes, deverá provocar uma redução no PIB a preços correntes de apenas 3%. A quebra nas receitas fiscais totais é quatro vezes superior a quebra que o Banco de Portugal prevê no PIB a preços nominais, e na receita do IVA é seis vezes superior. Portanto, é evidente que a contracção do PIB não explica nem é causa de uma parte importante da quebra que se está a verificar nas receitas fiscais.
Esta situação é certamente consequência do discurso permissivo do governo, e de um governo cada vez mais desacreditado, assim como da mudança que se operou na Administração Fiscal com a demissão do anterior secretário de Estado de Assuntos Fiscais, e com a nomeação de uma personalidade muito mais complacente. Esperemos que o governo não venha agora culpar os trabalhadores da Administração Fiscal pelo que está a acontecer.
Numa altura de grave crise financeira e económica como é actual, o governo não pode ter nem um discurso permissivo nem uma conduta complacente face aos prevaricadores como está a ter. Muitos estão-se aproveitar da crise e do discurso da crise para multiplicar a evasão e a fraude fiscal, e para não entregar os impostos retidos aos trabalhadores e aos consumidores. O Estado deve exigir, nestes momentos de crise, um comportamento ético exemplar dos contribuintes sem, no entanto, e em casos devidamente fundamentado, ajudar os que enfrentam grandes dificuldades a cumprir as suas obrigações fiscais. Só com uma grande exigência é que o Estado poderá ter meios para apoiar as famílias mais carenciadas, os desempregados, e para dinamizar a economia.
È igualmente necessário que o governo tenha um comportamento exemplar na aplicação dos dinheiros públicos, e que não os distribua apoios, como está a suceder, sem exigir contrapartidas às empresas, a nível de modernização e reestruturação, a fim de evitar que, terminados os apoios, a situação esteja na mesma ou ainda pior. Também não pode ter um comportamento pouco transparente como está a ter na distribuição dos apoios às empresas, de que é prova a marginalização que se tem sistematicamente verificado das organizações dos trabalhadores desses sectores do processo de concessão desses apoios. O que é que o governo pretende ocultar? – É a pergunta que naturalmente se coloca.
Eugénio Rosa
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