quarta-feira, abril 15, 2009

Pico petrolífero e pico do capitalismo

O conceito de pico petrolífero pode ter uma aplicação mais generalizada do que os seus amigos e inimigos concebem. Quando caímos no segundo maior crash do capitalismo estado-unidense em 75 anos de história (com cerca de uma dúzia de "ciclos de baixa nos negócios" no intervalo entre os crashes), alguns sinais sugerem que estamos também no pico do capitalismo. O capitalismo privado (quando activos produtivos são de propriedade de indivíduos e grupos privados e quando os mercado ao invés do planeamento estatal dominam a distribuição de recursos e produtos) demonstrou reiteradamente uma tendência para explodir na super-produção e/ou inflação de bolhas de activos que arrebentam com horríveis consequências sociais. Reformas infindáveis, reestruturações e regulações foram todas justificadas com o argumento não só de livrar-nos de uma crise como também de prevenir finalmente futuras crises (como Obama repetiu esta semana). Todas elas fracassaram nos seus propósitos.

A tendência à crise parece imparável, uma qualidade inerente do capitalismo. Na melhor das hipóteses, as explosões foram dominadas antes de provocaram grande devastação, embora habitualmente isto apenas tenha adiado e agravado aquela devastação. Um caso recente pertinente: o crash do mercado de acções no princípio de 2000 foi limitado nas suas consequências em termos de danos sociais (recessão, etc) por uma redução sem precedentes históricos de taxas de juros e expansão da oferta monetária pela Reserva Federal de Alan Greenspan. A resultante bolha imobiliária temporariamente compensou os efeitos do estouro da bolha do mercado de acções, mas quando o imobiliário entrou em crash uns poucos anos depois, o que foi adiado golpeou de forma catastrófica.

O fracasso reiterado em travar esta tendência inerente à crise começa a revelar-nos a natureza do sistema. A pergunta cada vez mais insinua-se no interior de discursos com um longo historial de negação da sua pertinência: será que o capitalismo, como sistema, ultrapassou a sua vida útil?

Repetidas intervenções do Estado para resgatar o capitalismo privado das suas próprias crises auto-destrutivas ou dos movimentos políticos das suas vítimas produziram períodos maiores ou menores de capitalismo de Estado (quando activos produtivos são possuídos ou controlados significativamente ou regulados por responsáveis do Estado e quando o planeamento estatal domina os mercados como mecanismo de distribuição de recursos e de produtos). Mas os capitalismos de Estado não resolveram tão pouco as tendências do sistema para as crises. Isto aconteceu porque eles reiteradamente abriram caminho para oscilações de retorno ao capitalismo privado (ex.: a "revolução" de Reagan nos EUA, o fim da URSS, etc).

Além disso, a história dos esforços de Franklin Dellano Roosevelt para neutralizar a Grande Depressão ensina lições fundamentais acerca do capitalismo como um sistema que não pode ser eternamente adiado. Uma vez que as reformas do New Deal não chegaram a transformar a estrutura da corporações, elas deixaram intactos os conselhos de administração e os accionistas que dispunham tanto dos incentivos como dos recursos para evadi-las, minando e abolindo aquelas reformas. A evasão foi o seu foco até a década de 1970 e a sua abolição a partir daí. O capitalismo sistematicamente organiza as suas instituições chave de produção – as corporações – de modo a que os seus conselhos de administração, ao cumprirem adequadamente as suas tarefas, produzam crises, a seguir minem reformas anti-crise e portanto reproduzam aquelas crises.

Por conseguinte, a atenção está vagarosamente a mudar para o questionamento de um aspecto do capitalismo que nunca foi efectivamente desafiado, muito menos mudado, ao longo de mais de um século: a organização interna das corporações. As suas decisões sobre o que, onde e como produzir e como utilizar lucros são todas tomadas não pela massa de trabalhadores (nem pelas comunidades que elas impactam) mas ao contrário por um conselho de administradores. Compostos tipicamente por 15 a 20 indivíduos, os conselhos de administração são elites minúsculas responsáveis para com elites apenas ligeiramente maiores constituídas pelos principais accionistas das corporações. Cada administração corporativa é encarregada pelos seus principais accionistas de maximizar o lucro, a fatia de mercado, o crescimento ou o preço. A massa de trabalhadores tem de viver com o resultado das decisões da administração sobre as quais não exercem depois qualquer controle. Esta é uma posição que compartilham com as comunidades em torno dependentes destas mesmas corporações.

Esta organização capitalista da corporação gera regularmente decisões de investimento, produção, finanças, marketing e emprego que produzem instabilidade sistémica – crises económicas. Grande parte deste sistema bipolar trouxe-nos ao pico petrolífero devido aos seus desenvolvimento, de modo que as suas contradições nos trouxeram agora ao pico do capitalismo. Esta organização profundamente não democrática do sistema de produção exige transformação radical.

Suponha-se, de acordo com tal transformação, que os trabalhadores resolvam funcionar como os seus próprios conselhos de administração. Todas as programações de empregos semanais daí em diante especificariam quatro dias com tarefas particulares de produção e um dia na participação em decisões colectivas sobre o que, como e onde produzir e o que fazer com lucros. Tendo exigido autocracia política para abrir caminho a mecanismos democráticos, os trabalhadores teriam então alcançado o mesmo em relação à autocracia económica que estrutura as corporações capitalistas. A economia e a sociedade evoluiriam então de forma muito diferente do padrão capitalista. Se temos de redesenhar nossas interacções com a natureza levando em conta o pico petrolífero, por que não redesenhar nossas estruturas empresariais para levar em conta a história dos esforços fracassados para conter a disfunção do capitalismo geradora de crises?

Podemos nós considerar uma aliança mutuamente benéfica entre os que criticam o abuso dos nossos recursos energéticos e os críticos do abuso das nossas capacidades produtivas? O que acha de uma aliança concentrada numa reorganização da produção radical, democrático e portanto anti-capitalista? A ideia seria fazer cidadãos e trabalhadores – aqueles que devem viver com os resultados do que as empresas fazem – tomem decisões conjuntas centradas sobre as necessidades colectivas, tanto produtivas como ambientais.
Rick Wolff
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

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