Um enorme coro agora clama por novas regulamentações dos bancos, mercados de crédito, fluxos internacionais de crédito e assim por diante. As regulamentações, para muita gente na política, nos media e na academia, parece que se tornaram a panaceia que não só "resolverá" a actual crise económica como também impedirá futuros colapsos. Muitos sindicatos e vozes na esquerda concordam com isso.
Franklin Dellano Roosevelt defendeu as suas regulamentações do New Deal nos mesmos termos durante a década de 1930. Mas as regulamentações de FDR fracassaram em afastar os EUA da Grande Depressão e elas obviamente fracassaram em impedir as crises económicas subsequentes. A de hoje é o segundo maior crash em 75 anos, mas verificaram-se aproximadamente uma dúzia de outros períodos de baixa, menos severos, desde a Grande Depressão. As regulamentações demonstraram-se repetidamente incapazes de acabar com a instabilidade inerente ao capitalismo, a sua tendência para os ciclos de crescimento e queda com enormes custos sociais.
As regulamentações económicas fracassam devido a dois viéses fundamentais. Primeiro, elas podem ser fracamente aplicadas ou simplesmente ignoradas. Quando condições políticas permitem que líderes sejam seleccionados e/ou controlados pelos inimigos da regulamentação, eles podem bloquear a aplicação das regulamentações estatais. Segundo, mesmo quando os políticos tentam aplicar regulamentações às corporações, elas esquivam-se, enfraquecem ou eliminam a maior parte delas. É a organização das empresas capitalistas que explica ambos os viéses e a reiterada sabotagem das regulamentações.
Regulamentações contra as recessões sempre constrangeram mais ou menos a liberdade de acção das corporações na busca de fatias de mercados e de lucros. Contudo, as regulamentações passadas pararam pouco antes de mudar a estrutura básica das corporações capitalistas (e também aquelas propostas por Obama). Portanto, a vasta maioria das pessoas que participa das empresas corporativas, os trabalhadores, sempre exerceu pouco ou nenhum controle sobre as decisões que decidem o que as empresas produzirão, como e onde produzirão e o que será feito com os lucros resultantes.
Tais decisões sempre foram tomadas pelos conselhos de administração de cada corporação, geralmente 15 a 20 indivíduos escolhidos por e responsáveis para com os principais accionistas da mesma. Os accionistas nos EUA estão altamente concentrados. Dados do Federal Reserve mostram que a vasta maioria das famílias do país ou não possuem acções ou têm tão poucas que exercem pouca ou nenhuma influência sobre a selecção dos conselhos de administração ou sobre as suas decisões.
Dentro das empresas capitalistas, a enorme maioria – os trabalhadores – depende de empregos, rendimentos e condições de trabalho determinadas pela minúscula minoria, o conselho de administração. Enquanto um décimo dos trabalhadores que estão sindicalizados exerce alguma influência limitada sobre os conselhos de administração, a maior parte dos trabalhadores dos EUA não pode participar na decisão do que, como e onde produzir ou em como os lucros da empresa são utilizados. A organização capitalista de empresas é não democrática. Esta falta de democracia interna condenas as regulamentações anti-recessão ao fracasso.
Desde FDR até Obama, os crashes capitalistas provocaram intervenções do Estado na economia que sempre incluíram regulamentações novas ou melhoradas. Imediatamente depois (e algumas vezes já durante) cada fase da regulamentação, conselhos de administração e grandes accionistas de muitas corporações estado-unidenses começavam a miná-la. Elas utilizam lucros corporativos para pagar o lobby, a publicidade, campanhas de mass media, "investigação" de think tanks e assim por diante. Ao moldar a opinião pública e o entendimento académico, elas persuadem políticos a ignorar ou a ampliar minimamente as regulamentações. Ao mesmo tempo, elas contratam advogados, contabilistas e economistas para evadirem-se às regulamentações e peritos em relações públicas para mascarar ou justificar a sua evasão. Quando politicamente factível, a sua oposição à regulamentação galga um outro patamar. Elas conseguem que o Congresso, as agências federais e os governos estatuais e locais primeiro enfraqueçam e finalmente eliminem muitas regulamentações.
Os conselhos de administração corporativos têm todo o incentivo para minar regulamentações que limitam os seus lucros e as suas fatias de mercado. Os grandes accionistas exigem-no e recompensam-nos correspondentemente. Os conselhos de administração têm os lucros corporativos necessários para financiar a desmontagem dos regulamentos não desejados. A estrutura da empresa capitalista proporcionou portanto tanto o incentivo como os meios para os conselhos de administração minarem as regulações New Deal de FDR. O legado trágico de FDR foi a preservação da organização capitalista da empresa, deixando no lugar os conselhos de administração e os grandes accionistas. Se dissermos "vergonhas sobre eles" por minarem regulamentações impostas após o crash dos anos 1930 do capitalismo, teremos de dizer "vergonha sobre nós" se permitirmos que o mesmo processo decorra agora sob Obama.
Não podemos resolver este fracasso sistemático das regulamentações em travar os crashes capitalistas através de mais regulamentação diferente ou mais restritiva. As corporações demonstraram a sua força e capacidade para frustrar a estratégia da regulamentação. Nem tão pouco é solução uma tomada das empresas pelo Estado. As histórias da URSS e da China mostram que quando responsáveis do Estado substituem conselhos de administração privados, o que permanece são estruturas antagónicas e não democráticas contrapondo os trabalhadores contra o pequeno grupo que toma as decisões chave quanto à produção e à distribuição dos lucros da empresa. Responsáveis do Estado, tal como os seus colegas privados, frustram e minam as regulamentações.
Uma solução diferente, não tentada ainda, proporciona-nos a melhor oportunidade para o êxito. Ela implica uma reorganização radical das empresas, quer sejam possuída e operadas privadamente ou pelo Estado. Democratizar o lugar de trabalho pela substituição de conselhos de administração ou responsáveis do Estado pelos próprios trabalhadores a funcionarem colectivamente com o seu próprio conselho de administração. Empresas reorganizadas desta forma teriam objectivos e sistemas de prémios, incentivos e meios para realizá-los que seriam inteiramente diferentes daqueles das empresas capitalistas onde os trabalhadores confrontam os outros que tomam as decisões económicas chave. Trabalhadores que fossem também o seu próprio conselho de administração seriam menos propensos a ignorar os feitos (económico, ambiental, cultural e político) das decisões no lugar de trabalho ou nas comunidades vizinhas (onde vivem os próprios trabalhadores e as suas famílias). Tais trabalhadores estariam mais voltados para empregos mais seguros e aumentos de salários do que para aumentos de lucros ou de fatias de mercado.
Tal democratização do lugar de trabalho harmonizar-se-ia muito mais suavemente com a política genuinamente democrática: trabalhadores habituados à democracia no emprego mais provavelmente resistiriam à sua exclusão das suas comunidades de residência. Democracia económica e democracia política são condições de existência de uma e de outra. A interdependência das condições do lugar de trabalho e das condições da comunidade exigiriam e provavelmente promoveriam a negociação contínua entre as suas organizações democráticas separadas mas sobrepostas. As regulamentações que emergissem de tais negociações provavelmente mais seriam respeitadas e aplicadas pelos trabalhadores-enquanto-administradores do que as regulamentações que foram negadas tão regularmente pelas administrações de não trabalhadores ao longo do último século.
Por que não ir além da forma capitalista de empresas, quer privadas ou estatais? Não temos nada a perder a não ser as nossas crises capitalistas. Temos uma nova economia mundial a ganhar.
Rick Wolff
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
Sem comentários:
Enviar um comentário