Se dois negociantes formam uma sociedade de comércio, enquanto a sociedade durar os ganhos e prejuízos são comuns; produzindo cada um não para si mas para a sociedade, quando chega o momento da partilha não é o produtor que se considera, é o sócio: Eis o escravo, a quem o plantador dá a palha e o arroz; o operário civilizado, a quem o capitalista paga sempre um salário mínimo; não sendo sócios dos patrões, se bem que produzindo com eles, não partilham o produto. Assim, o cavalo que puxa as diligências e o boi que puxa as charruas produzem connosco mas não são nossos sócios; ficamos com o produto mas não partilhamos. É igual a condição dos animais e dos trabalhadores que nos servem: quando fazemos bem a uns o outros, não é por justiça, é por generosidade (1).
Mas poderá ser que nós, homens, não sejamos todos associados? Lembremo-nos do que disse nos dois capítulos anteriores; mesmo que não quiséssemos ser associados, a força das coisas, as necessidades do consumo, as leis de produção, o princípio matemático da troca, associavam-nos. Existe apenas uma excepção a esta regra: o proprietário não é sócio de ninguém, produzindo pelo seu direito de lucro, por consequência, não está obrigado a partilhar do produto, como também ninguém tem a obrigação de lhe dar qualquer parte. Exceptuando o proprietário, trabalhamos todos uns para os outros, nada podemos individualmente sem a assistência dos outros, fazemos trocas contínuas de produtos e serviços: o que é tudo isto senão actos de sociedade?
Ora, uma sociedade de comércio, indústria, agricultura, não pode ser concebida fora da igualdade: a igualdade é a sua condição necessária de existência: de tal maneira que em todas as coisas respeitantes a essa sociedade, faltar à sociedade, faltar à justiça, faltar à igualdade, é exactamente a mesma coisa. Apliquem esse princípio a todo o género humano; depois do que leu admito-o, leitor, bastante inabilitado para passar sem mim.
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(1) Fazer um acto de benevolência para com o próximo diz-se, em hebraico, fazer justiça; em grego fazer compaixão ou misericórdia (éléemosinen, ou em francês esmola); em latim fazer amor ou caridade; em francês dar a esmola. É sensível a degradaçâo do princípio através destas diversas expressões: a primeira, designa o dever; a segunda, semente a simpatia; a terceira, a afeição, virtude de intento, não de obrigação; a quarta, o bom prazer.
Segundo esta ideia, o homem que se apossa de um campo diz: Este campo é meu; não será injusto senão enquanto os outros homens não tiverem todos a mesma faculdade de possuir como ele; também não será injusto se, querendo estabelecer-se noutro sítio, trocar um campo contra um equivalente. Mas, pondo um outro no seu lugar se lhe disser: Trabalha para mim enquanto descanso; então, torna-se injusto, desassociado, desigual: é um proprietário.
Reciprocamente, o mandrião, o debochado, sem desempenhar nenhuma tarefa social que usufrui como qualquer outro e, às vezes, mesmo mais dos produtos da sociedade, deve ser perseguido como ladrão e parasita: não temos obrigação de lhe dar nada; mas visto que apesar disso é preciso que viva, devemos vigiá-lo e conduzi-lo ao trabalho.
A sociabilidade é como a atracção dos seres sensíveis; a justiça é essa mesma atracção acompanhada de reflexão e conhecimento. Mas sob que ideia geral, sob que categoria do entendimento percebemos nós a justiça? Sob a categoria das quantidades iguais. Daí a antiga definição da justiça: Justum aequale est, injustum lnaequale.
O que é, então, praticar a justiça? É dar a cada um igual parte dos bens sob igual condição do trabalho; é agir societariamente. Bem pode murmurar o nosso egoísmo; não há subteefúgio possível contra a evidência e a necessidade.
O que é o direito de ocupação? É uma maneira natural de dividir a terra justapondo os trabalhadores à medida que se apresentam: esse direito desaparece perante o interesse geral que, sendo o interesse social, é também o do ocupante.
O que é o direito do trabalho? É o direito de se fazer admitir na participação dos bens preenchendo as condições precisas; é o direito de sociedade, é o direito de igualdade.
A justiça, produto da combinação de uma ideia e de um instinto, manifesta-se no homem na medida em que é capaz de sentir e ter ideias; como resultado tomou-se por um sentimento inato e primordial, opinião falsa, lógica e cronologicamente. Mas a justiça, pea sua composição híbrida, se ouso chamá-la assim, a justiça, nascida de uma faculdade afectiva e de uma
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