A afirmação de Passos Coelho de que “os donos do país” estão a desaparecer, significando ele com isso os grandes grupos nacionais apoiados pelo Estado, tem de se entender como uma confissão. Passos Coelho assume, com efeito, o seu papel de agente do capital internacional para o efeito de “libertar” o capital português das suas âncoras nacionais e o levar a fundir-se por inteiro nos grandes grupos espanhóis, europeus ou mundiais. Retirar-lhe o apoio estatal é uma peça dessa manobra, como manda a UE.
É a isso que o primeiro-ministro chama “uma economia mais aberta”. E foi por desempenhar plenamente esse papel, escudado nos interesses maiores do capital europeu, que Passos Coelho, por exemplo, rejeitou os apelos de financiamento estatal por parte do grupo GES-BES — não por bravura política própria ou por pena dos contribuintes.
O sentido “anti-nacional” que tem a política do seu governo, está nisto. De resto ele não o escondeu quando, batendo-se por ser o bom mordomo da troika, deu urgência às privatizações e viu na falência de empresas um sinal de “renovação” do “tecido económico”. Mas, contra uma certa onda moralista, perpassando toda a esquerda, que vê nisso uma arbitrariedade de um governo “vende-pátrias”, é preciso acrescentar que este processo se dá pela própria dinâmica em que está envolvido, por vontade própria, o capital português.
Na verdade, a evolução a que assistimos resulta de pelo menos dois factores. Um, é a fraqueza dos capitalistas portugueses em geral face às investidas do capital estrangeiro, nomeadamente imperialista, facto que leva à liquidação pura e simples de muitos deles. Outro, é o próprio interesse de boa parte do grande capital português (da finança ou de qualquer outro sector), mas também de muito do capital médio, que, para sobreviverem, se associam ou se integram nos grupos mais poderosos, deles se tornando uma espécie de accionistas menores.