O Governador do Banco de Portugal foi reconduzido. O primeiro mandato de Carlos Costa fica marcado naturalmente pela queda do BES. Queda que não chegou a ser queda, pois neste caso, em vez de cair um banco, ficaram dois pendurados. O Novo Banco e o GES. Claro que o GES não é um banco, é um grupo que gere participações sociais, mas acaba por ser mais banco do que oficina de automóveis, até porque ficou com a parte podre do banco.
Podia ter sido pior. O bom das coisas ficarem penduradas é que até podem não cair. É o caso do Novo Banco.
Este resultado levar-nos-ia, então, a concluir que Carlos Costa foi um excelente Governador do Banco de Portugal. Logo, a sua recondução seria evidente e incontestável. Sucede que Carlos Costa não foi bom a liderar uma estratégia razoável. Do relatório da comissão parlamentar de inquérito resultam críticas à actuação do Governador. Críticas sérias.
Desde logo, quando se tomou a decisão de separar o BES do GES, também se tomou a decisão de deixar Ricardo Salgado a comandar essa operação. Com a informação que o Governador tinha, naquele tempo, já não podia confiar em Ricardo Salgado. Já não havia aquela característica indispensável para liderar bancos: a idoneidade. Uma característica que eu diria ainda mais indispensável num cenário de caos. Mas Carlos Costa confiou e a gestão de Ricardo Salgado veio a confirmar aquilo que era evidente: que não podia confiar.
Nesse processo, o líder do BES enganou o Banco de Portugal, mas porque o Banco de Portugal se deixou enganar.
A razão para Carlos Costa deixar Ricardo Salgado ao leme terá sido o famigerado risco de contaminação do sistema bancário. Se o Banco de Portugal afastasse Ricardo Salgado seria o apocalipse, já sabemos. Bom, a verdade é que Ricardo Salgado acabou por ser afastado, em piores condições, e não foi o apocalipse. Daqui resulta que o Banco de Portugal devia ter agido muito mais cedo. Deixou ficar a bomba nas mãos dos bombistas.
É verdade que havia controlo, regras e fiscalização. Ricardo Salgado tinha uma missão. Mas a missão de Ricardo Salgado era destruir Ricardo Salgado e ele era a pior pessoa para isso, como se imagina e como o Banco de Portugal devia ter imaginado. Por mais meios de controlo e de fiscalização que houvesse, diz o adágio e bem, burro amarrado também pasta.
E pastou e isso teve custos. Estão identificados actos de gestão contrários às orientações do Banco de Portugal e que visavam proteger quem até então tinha controlado o banco e o grupo. Ora, são esses custos que são da responsabilidade do Governador do Banco de Portugal, que enquanto supervisor depositou confiança em quem já manifestamente não podia depositar.
Mas será isso razão para substituir o Governador? Para um peixe de aquário não, porque já não se lembra. Mas para quem se preocupa com a supervisão bancária, talvez seja. Carlos Costa não foi o pior que aconteceu a este país no último século, de facto não foi, mas falhou onde um supervisor jamais pode falhar. Um supervisor pode cometer muitos erros, mas deixar-se enganar é o pior deles. E o Banco de Portugal, no caso do BES, deixou-se enganar. Encontrou uma solução e foi pedir ao problema para a aplicar, num estilo de pedagogia infantil “agora limpas”.
Perante isto e com o fim do mandato de Carlos Costa, justificava-se um agradecimento por ter feito o melhor que podia, mas não se justificava uma recondução. É verdade que a venda do Novo Banco está a decorrer, as eleições estão à porta e a recondução do Governador transmite uma imagem de sucesso, mas a supervisão bancária é um assunto demasiado importante para ser jogado neste tabuleiro. A instabilidade do sistema financeiro, em Portugal, ainda é enorme. O problema está longe de estar resolvido e a supervisão bancária continuará a atravessar grandes provações.
Neste contexto, teria sido melhor renovar a equipa do Banco de Portugal, procurando quem prosseguisse a missão com menos candura, ou será que podemos estar descansados com a sentinela que dorme no posto, mesmo depois de ser acordado?
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