Para que o contrato político possa cumprir a condição sinalagmática e comutativa que sugere a ideia de democracia; para que, encerrando¬ se em limites correctos, ele continue vantajoso e cómodo para todos, é preciso que o cidadão, entrando na associação, 1º tenha tanto a receber do Estado como o que lhe sacrifica; 2º que conserve toda a sua liberdade, soberania e iniciativa, menos o que é relativo ao objecto especial para o qual o con¬trato foi feito e para o qual se pede a garantia do Estado. Assim regulado e compreendido, o contrato político é o que eu chamo uma federação.
FEDERAÇÃO, do latim foedus, genitivo foederis, quer dizer pacto, contrato, tratado, convenção, aliança, etc., é uma convenção pela qual um ou mais chefes de família, uma ou mais comunas, um ou mais grupos de comunas ou Estados, se obrigam recíproca e igualmente uns en relação aos outros para um ou mais objetos particulares, cuja carga incumbe então especial e exclusivamente aos delegados da federação .
Retomemos esta definição.
O que faz a essência e o carácter do contrato federativo, e para o qual chamo a atenção do leitor, é que neste sistema os contratantes, chefes de família, comunas, cantões, províncias ou Estados, não somente se obrigam sinalagmática e comutativamente uns em relação aos outros, eles reservavam¬se individualmente, formando o pacto, mais direitos, liberdade, autoridade, propriedade, do que o que abandonam.
Não era assim, por exemplo, na sociedade universal de bens e ganhos, autorizada pelo Código civil, dita comunidade, imagem em miniatura de todos os Estados absolutos. Aquele que se compromete numa associação dessa espécie, sobretudo se ela é perpétua, está rodeado de mais entraves, submetido a mais responsabilidades do que conserva de iniciativa. Mas é também o que faz a raridade desse contrato, e que em todos os tempos tornou a vida cenobítica insuportável. Todo o compromisso, mesmo sina¬lagmático e comutativo, que, exigindo dos associados a totalidade dos seus esforços, não deixa nada à sua independência e os devota por inteiro à associação, é um compromisso excessivo, que repugna igualmente ao cidadão e ao homem.
20) Na teoria de J.-J. Rousseau, que é a de Robespierre e dos Jacobinos, o Contrato so¬cial é uma ficção de legista, imaginada para dar razão, de outra forma que pelo di¬reito divino, a autoridade paternal ou a necessidade social, à formação do Estado e às relações entre o governo e os indivíduos. Esta teoria emprestada dos calvinistas, era em 1764 um progresso, pois que ela tinha por fim trazer para uma lei da razão o que até aí tinha sido considerado como pertença da lei natural e da religião. No sistema federativo, o contrato social é mais que uma ficção; é um pacto positivo, efectivo, que foi proposto realmente, discutido, votado, adoptado, e que se modifica regular¬mente à vontade dos contratantes. Entre o contrato federativo e o de Rousseau e o de 93, existe toda a distância entre a realidade e a hipótese.*
* Pretenderam alguns, que tendo apresentado Proudhon o contrato como medida de resolver o problema político, não fez mais no fim que voltar à ideia de Rousseau, que tão duramente tinha censurado em algumas das suas obras anteriores. O mesmo Proudhon na nota anterior, apreciou o que vale o Contrato Social imaginado pelo brilhante filósofo de Genebra. Mas rapidamente, a fim de ver quanto difere um con¬trato de outro, apresenta-se aqui a clásula do de Rousseau que levará prontamente cada leitor a comparar com as que Proudhon acaba de apresentar como suas.
«As clásulas deste contrato, diz Rousseau ao falar dele que constituía o objecto do seu trabalho, quando bem compreendidas, resumem-se a uma: a alienação total de cada associado, com todos os seus direitos, à colectividade... Cada um de nós põe em comum a pessoa e os bens, sob a suprema direcção da vontade geral; e juntos rece¬bemos de cada membro como parte individual do todo»
Ao contrário de Rousseau que através desse contrato nos entrega de corpo e alma à sociedade de que fazemos parte, Proudhon pelo seu, submete-nos a essa mesma co¬lec-tividade a não ser para certos e determinados objectos, expressamente consigna¬do no pacto que celebramos ou a que aderimos. Faz aquele da colectivi¬dade, árbitro dos nossos direitos, e impõe este, pelo contrário a obrigação de asse¬gurᬠlos e pro¬tegê¬ los. Rousseau fala, numa palavra, de um contrato universal; Prou¬dhon de um con¬tra¬to especial. Há razão ou pretexto para confundir os dois contratos? (N.T.)
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