Após os dois textos em que tratamos da crise generalizada da classe média, tanto no Brasil como no mundo todo, procuraremos solidificar a relação entre “classe média” e o desemprego tecnológico.
Muitos dos nossos leitores concordaram com nossa exposição sobre o fato de a classe média estar em uma crise profunda, e que a causa disso não está especificamente ligada a um estrato populacional específico, visto como uma “espécie biológica”. Afirmamos que a crise da classe média é de fato a crise provocada pelo desemprego tecnológico.
Nesse aspecto alguns levantaram algumas objeções quanto à questão da composição da classe média. Ou seja, todos os estudos na prática se baseiam em “renda” e não necessariamente em salários.
Em obra recentemente publicada sobre o assunto (1), os autores “notam que a forte industrialização brasileira de 1930 a 1980 levou à emergência de uma ‘classe média assalariada’, formada por gerentes, administradores, burocratas e professores universitários. Ligado a grandes empresas e ao dinamismo industrial, esse estrato se contrapunha à antiga ‘classe média proprietária’, composta por pequenos proprietários rurais, proprietários de negócios comerciais e profissionais liberais”.(2)
Embora os valores possam variar de pessoas que ganham mais de três salários mínimos por mês (para o Caged – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho), de R$ 2.275,00 á R$ 25.200,00 (para o “Atlas da Nova Estratificação Social do Brasil – Classe Média”) ou de R$ 3.000,00 e R$ 15.000,00 para a “Veja” (cujo parâmetro seria semelhante ao do Banco Mundial), o fato é que sempre existe a referência apenas ao “rendimento”.
Nesse caso, temos duas variáveis a considerar: A primeira diz respeito à porcentagem da classe média que é de fato assalariada e a que obtém seus rendimentos por meio de negócios próprios, ou outras rendas. A segunda diz respeito à segmentação da própria classe média, uma vez que mesmo o grupo assalariado não é hegemônico.
Para que nossas conclusões se apliquem, ou seja, que o encolhimento da classe média seja atribuído principalmente à reestruturação produtiva, da qual resulta o desemprego tecnológico, devemos estar falando apenas de assalariados e dentro desse grupo, de profissões ou ocupações específicas.
Quanto ao primeiro aspecto, podemos afirmar que: “Com dados do IBGE, os economistas mostram que em 1980 os assalariados desse estrato social respondiam por 31,7% da População Economicamente Ativa (PEA) ocupada nas regiões urbanas. Após 20 anos, essa participação despencou para 27,1%”.(3)
Um artigo de “Veja” que mencionamos nos textos anteriores, nos informa que: “No início da década de 80 os assalariados representavam 65% da classe média. Hoje são pouco mais de 50%”.(4)
Com esses números, percebemos que de fato a crise da classe média se localiza preferencialmente no grupo assalariado, tendo pouco ou nenhum peso sobre a parte da classe média “proprietária”. Isso reforça nosso argumento de que estamos tratando de desemprego e queda de salários.
Mas devemos nos lembrar de que mesmo a classe média assalariada não é hegemônica e portanto devemos levar esse fato em conta. Para isso iremos nos valer do seguinte trecho de texto já mencionado:
“Mais emblemático da crise foi o aumento da desigualdade dentro da classe média. A fatia da classe média-baixa (professores, lojistas, vendedores, entre outros) passou de 44,5% do total do estrato, em 1980, para 54,1% em 2000. A da classe média-média (ocupações técnico-científicas, postos-chaves da burocracia pública e privada) caiu de 32,2% para 23,1%, enquanto a da classe média-alta (executivos, gerentes, administradores) teve certa estabilidade no período (de 23,2% para 22,8%) “.(3)
Ou seja, a verdadeira “perdedora”, de acordo com os autores seria a classe “média-média” onde estariam “ocupações técnico-científicas, postos-chaves da burocracia pública e privada”. Em outras palavras, é onde se localizam os profissionais mais vulneráveis aos processos de automação e informatização.
Na indústria, é onde se situam, por exemplo, os ferramenteiros e inspetores de qualidade, tornados supérfluos pelo sistema toyotista. É onde estão os torneiros mecânicos e operadores de máquinas em geral, muito reduzidos em número pelas máquinas de controle numérico computadorizadas e pela robotização.
Também na indústria é onde se situam as estruturas de “comando e controle” com seus preparadores, desenhistas, calculistas, etc.; É onde se posicionam os contadores, faturistas e técnicos em RH. Nos setores de comércio e serviços, é onde se situa toda a cadeia de comando intermediária. Todos tornados mais ou menos supérfluos ou drasticamente reduzidos em número pela informatização.
Devemos notar que professores, lojistas e vendedores (classe média-baixa) raramente são afetados por processos de “reestruturação produtiva”. Esses mesmos processos também costumam afetar os cargos de executivos, gerentes e administradores apenas de forma indireta. Isso porque essas categorias tendem a “encolher” não por sua substituição por tecnologia, mas devido ao próprio “enxugamento” das estruturas de produção.
Em resumo, podemos afirmar sem a menor dúvida que os números mostram uma forte relação entre desemprego tecnológico e crise da classe média. De qualquer forma o resultado está ai:
“Entre 1980 e 2000, como efeito do pífio crescimento da economia e do ajuste do mercado de trabalho, cerca de 10,1 milhões de trabalhadores de classe média perderam o emprego. Destes, sete milhões não conseguiram mais recuperar o posto e a renda anteriores, deixando de compor a classe média no país”.(3)
Notas:
(1) “Classe média — desenvolvimento e crise”, trabalho dos economistas Marcio Pochmann, Alexandre Guerra, Ricardo Amorim e Ronnie Silva.
(2) “Para os mais pobres, um crescimento chinês” - O Estado de S. Paulo - 12/11/2006.
(3) “7 Milhões saem sa classe média no Brasil” - Aguinaldo Novo - O Globo - 8/3/2006 - Editoria: Economia – Pág. 38.
(4) “Congelaram a classe média” - Giuliano Guandalini e Julia Dauailibi - Veja – 20/12/2006 - Pág. 68.
http://lauromonteclaro.sites.uol.com.br/
Muitos dos nossos leitores concordaram com nossa exposição sobre o fato de a classe média estar em uma crise profunda, e que a causa disso não está especificamente ligada a um estrato populacional específico, visto como uma “espécie biológica”. Afirmamos que a crise da classe média é de fato a crise provocada pelo desemprego tecnológico.
Nesse aspecto alguns levantaram algumas objeções quanto à questão da composição da classe média. Ou seja, todos os estudos na prática se baseiam em “renda” e não necessariamente em salários.
Em obra recentemente publicada sobre o assunto (1), os autores “notam que a forte industrialização brasileira de 1930 a 1980 levou à emergência de uma ‘classe média assalariada’, formada por gerentes, administradores, burocratas e professores universitários. Ligado a grandes empresas e ao dinamismo industrial, esse estrato se contrapunha à antiga ‘classe média proprietária’, composta por pequenos proprietários rurais, proprietários de negócios comerciais e profissionais liberais”.(2)
Embora os valores possam variar de pessoas que ganham mais de três salários mínimos por mês (para o Caged – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho), de R$ 2.275,00 á R$ 25.200,00 (para o “Atlas da Nova Estratificação Social do Brasil – Classe Média”) ou de R$ 3.000,00 e R$ 15.000,00 para a “Veja” (cujo parâmetro seria semelhante ao do Banco Mundial), o fato é que sempre existe a referência apenas ao “rendimento”.
Nesse caso, temos duas variáveis a considerar: A primeira diz respeito à porcentagem da classe média que é de fato assalariada e a que obtém seus rendimentos por meio de negócios próprios, ou outras rendas. A segunda diz respeito à segmentação da própria classe média, uma vez que mesmo o grupo assalariado não é hegemônico.
Para que nossas conclusões se apliquem, ou seja, que o encolhimento da classe média seja atribuído principalmente à reestruturação produtiva, da qual resulta o desemprego tecnológico, devemos estar falando apenas de assalariados e dentro desse grupo, de profissões ou ocupações específicas.
Quanto ao primeiro aspecto, podemos afirmar que: “Com dados do IBGE, os economistas mostram que em 1980 os assalariados desse estrato social respondiam por 31,7% da População Economicamente Ativa (PEA) ocupada nas regiões urbanas. Após 20 anos, essa participação despencou para 27,1%”.(3)
Um artigo de “Veja” que mencionamos nos textos anteriores, nos informa que: “No início da década de 80 os assalariados representavam 65% da classe média. Hoje são pouco mais de 50%”.(4)
Com esses números, percebemos que de fato a crise da classe média se localiza preferencialmente no grupo assalariado, tendo pouco ou nenhum peso sobre a parte da classe média “proprietária”. Isso reforça nosso argumento de que estamos tratando de desemprego e queda de salários.
Mas devemos nos lembrar de que mesmo a classe média assalariada não é hegemônica e portanto devemos levar esse fato em conta. Para isso iremos nos valer do seguinte trecho de texto já mencionado:
“Mais emblemático da crise foi o aumento da desigualdade dentro da classe média. A fatia da classe média-baixa (professores, lojistas, vendedores, entre outros) passou de 44,5% do total do estrato, em 1980, para 54,1% em 2000. A da classe média-média (ocupações técnico-científicas, postos-chaves da burocracia pública e privada) caiu de 32,2% para 23,1%, enquanto a da classe média-alta (executivos, gerentes, administradores) teve certa estabilidade no período (de 23,2% para 22,8%) “.(3)
Ou seja, a verdadeira “perdedora”, de acordo com os autores seria a classe “média-média” onde estariam “ocupações técnico-científicas, postos-chaves da burocracia pública e privada”. Em outras palavras, é onde se localizam os profissionais mais vulneráveis aos processos de automação e informatização.
Na indústria, é onde se situam, por exemplo, os ferramenteiros e inspetores de qualidade, tornados supérfluos pelo sistema toyotista. É onde estão os torneiros mecânicos e operadores de máquinas em geral, muito reduzidos em número pelas máquinas de controle numérico computadorizadas e pela robotização.
Também na indústria é onde se situam as estruturas de “comando e controle” com seus preparadores, desenhistas, calculistas, etc.; É onde se posicionam os contadores, faturistas e técnicos em RH. Nos setores de comércio e serviços, é onde se situa toda a cadeia de comando intermediária. Todos tornados mais ou menos supérfluos ou drasticamente reduzidos em número pela informatização.
Devemos notar que professores, lojistas e vendedores (classe média-baixa) raramente são afetados por processos de “reestruturação produtiva”. Esses mesmos processos também costumam afetar os cargos de executivos, gerentes e administradores apenas de forma indireta. Isso porque essas categorias tendem a “encolher” não por sua substituição por tecnologia, mas devido ao próprio “enxugamento” das estruturas de produção.
Em resumo, podemos afirmar sem a menor dúvida que os números mostram uma forte relação entre desemprego tecnológico e crise da classe média. De qualquer forma o resultado está ai:
“Entre 1980 e 2000, como efeito do pífio crescimento da economia e do ajuste do mercado de trabalho, cerca de 10,1 milhões de trabalhadores de classe média perderam o emprego. Destes, sete milhões não conseguiram mais recuperar o posto e a renda anteriores, deixando de compor a classe média no país”.(3)
Notas:
(1) “Classe média — desenvolvimento e crise”, trabalho dos economistas Marcio Pochmann, Alexandre Guerra, Ricardo Amorim e Ronnie Silva.
(2) “Para os mais pobres, um crescimento chinês” - O Estado de S. Paulo - 12/11/2006.
(3) “7 Milhões saem sa classe média no Brasil” - Aguinaldo Novo - O Globo - 8/3/2006 - Editoria: Economia – Pág. 38.
(4) “Congelaram a classe média” - Giuliano Guandalini e Julia Dauailibi - Veja – 20/12/2006 - Pág. 68.
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