quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Concurso para Titulares - Versão 1.0

Graças à simpatia da Paula Lago recebi a primeira versão do que pretende ser a regulamentação do primeiro concurso para professores titulares (se o Wordpress funciona como eu penso é só clicarem em concprofitular1.pdf).
Como de costume nestes projectos de diplomas, o articulado só parece escorreito se nos abstrairmos da realidade das coisas e das regras do pensamento lógico, já para não falar na coerência. O que quer dizer que parece ser feito por gente de gabinete e que, tenteando, espera levar os empurrões necessários para fazer uma versão final sofrível.
A análise de algumas das incongruências segue já em seguida, começando eu por implicar desde já, só para aquecer, com o fraseado do artigo 2º em que se fala em «procedimentos concursais» o que não sendo um pontapé na testa da Língua Portuguesa é um requebro perfeitamente desnecessário em peça legislativa que se quer escorreita, compreensível e sem pretensões estilísticas.
Passando já em voo planante a questão das vagas, que ainda ficam a depender, no caso do concurso para titulares de professores antes posicionados nos 8º e 9º escalões, de um outro diploma legal, entramos no meandro burocrático de um processo que claramente só pode ter sido desenhado por quem não conhece as condições concretas de funcionamento das escolas.
Antes de mais porque, e apesar de se contemplar a hipótese de alguns concursos ficarem desertos, parece desconhecer-se que o chavão do ME de que a maioria dos docentes está nos últimos escalões da carreira é manifestamente equívoco ou mesmo errado em muitas dezenas e centenas de Escolas e/ou Agrupamentos.
Em seguida porque o processo desenhado é à velha moda portuguesa do quanto mais rodriguinho processual melhor e quanto mais comissões mais perfeito é o sistema, sendo que isso acarreta tempo e, ao que parece, se pretendem atribuir responsabilidades e funções morosas a pessoas que actualmente já têm a sua carga horária completa e não se percebe como irão fazer tudo aquilo que delas se espera.
Para começar as hostilidades (artigo 7º) temos uma «comissão de certificação de candidaturas» que é teoricamente presidida pelo(a) Presidente da Assembleia de Escola, auxiliado por um(a) Vice-Presidente do CE e o (a) Chefe dos Serviços de Administração Escolar. Claro que depois, e como é óbvio, se determina que se um desses dois primeiros elementos for opositor ao dito concurso não poderá desempenhar tais funções, sendo substituído pelo(a) docente da Escola ou Agrupamento com mais tempo de serviço mas que não seja opositor ao concurso.
Isto é bestialmente estranho porque, obviamente, se supõe que o Presidente da Assembleia de Escola - ou mesmo um dos Vices do CE - seja opositor aos concursos. Aliás, se o não for não poderá sequer manter-se no cargo logo que os lugares de professores-titulares estejam providos. Essa é uma das implicações do ECD ministerial nesta matéria. Significa isto que ou é impossível que as duas pessoas em causa possam desempenhar a função que lhes é designada ou então é porque não estão nas condições daqueles cujos elementos vão verificar. Não sendo um disparate completo - afinal é só verificar as formalidades - é uma aproximação muito razoável ao non-sense.
Mas algo semelhante se passa em relação ao júri dos concursos (artigo 8º) presidido pelo respectivo Director Regional de Educação (ou um seu adjunto nomeado pelo Governo, o que é por si só coisa muito interessante), o(a) Presidente do Conselho Executivo e o Director do Centro de Formação das Escolas, caso não sejam, como no caso anterior, opositores ao dito concurso. Ora já se explicou que - em especial no concurso para os docentes que estão no 10º escalão/índice 340 - ou são opositores ou então vão avaliar quem tem mais “condecorações” do que eles. Conheço directamente casos em que isso acontece, nomeadamente na situação de Director do Centro de Formação (que na minha escola é um docente no 9º escalão). Ir buscar docentes a outras Escolas e Agrupamentos só é meia-solução, para além de nesse caso a avaliação ser completamente externa à escola e desconhecedora do desempenho quotidiano do docente. Mas mesmo que assim não fosse, como é que um Director de um Centro de Formação - de base pelo menos concelhia - vai conseguir participar em dezenas de júris? Vai tomar a poção mágica do Astérix ou passará a ter, pelo menos transitoriamente, o dom da ubiquidade e da multiplicação do tempo?
Mas o mais engraçado é que o Presidente do júri, o senhor Director (ou senhora, que isto está tudo no masculino e, portanto, é pouco real) Regional da Educação como não terá certamente tais dons, e pelo contrário terá outras coisas com que se entreter, pode ser substituído por um director-regional adjunto «a designar pelo membro do governo responsável pela área da educação».
Ora isto é uma passagem de cilindro compressor sobre toda a lógica do mérito, do valor da antiguidade e da autonomia de todo este processo por parte da tutela que, para além disso, assim poderá interferir directamente em todos os júris. E, já agora, quem nos garante a competência do tal “adjunto”? E quantos destes “adjuntos” serão precisos? E como é que lá chegaram, sendo que este é um daqueles tipos de cargo em que o cartão partidário e as práticas clientelares são os critérios fundamentais de escolha? Até que ponto isto não é o puro e simples atropelo de qualquer transparência no processo?
Ou seja, poderemos ter (teremos!) a presidir a milhares de concursos para professores titulares um qualquer “adjunto” de nomeação governamental, que ninguém conhece, que não passou por qualquer crivo meritocrático, que não seja a escolha política, eventualmente polvilhada com algum conhecimento do assunto. Se já chegaram (no passado mais ou menos próximo) ao topo da estrutura política do ME alguns vultos do gabarito de uma Maria do Carmo Seabra ou mesmo de um … (cala-te boca!), o que haveremos de esperar de um “adjunto” de um DRE? Por excepção, até pode acontecer que seja pessoa rigorosa e competente na área da avaliuação dos professores, mas só mesmo como excepção. O mais certo é a regra ser um qualquer burocrata de carreira política.
Mas fiquemos por aqui, que para amanhã ficarão os meandros labirínticos do processo de selecção.
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