quarta-feira, fevereiro 14, 2007

O escudo do cinismo

É o ladrão a gritar "apanhem o ladrão". É a imagem que mais se aproxima ao presidente Uribe, abalado pelo monstro da "narco-para-política", esse imundo Frankenstein criado pelo Estado, que hoje, incontível, o arrasta para o abismo da crise.

Sabe que tem renunciar. Que nem os colombianos nem a opinião pública internacional podem tolerar um governo indesculpavelmente mafioso. Desesperadamente lançou mão do escudo do cinismo, mas sabe muito bem que não poderá resistir por muito tempo, apesar do apoio gringo, à repreensão moral de todo um povo, que exige a sua demissão.

Atrás desse escudo Uribe pede ao Supremo Tribunal de Justiça que investigue as relações do Estado e dos últimos governos com o narco-paramilitarismo. Será preciso aplicar-lhe um electroencefalograma e uma avaliação muito rigorosa do seu estado mental a fim de verificar porque se julga imaculado, quando foi um dos mesmos dessa máfia narco-paramilitar que tomou as instituições.

Essa fantasia posta a voar a partir do Palácio de Nariño de que o descobrimento da onda podre da "narco-para-política" é uma consequência da "Seguridad Democrática" fascista, é um insulto à inteligência pública. Ninguém crê na auto-flagelação. Toda a gente percebe o zumbido de uma potentes ventoinhas a espalharem aquilo que todos sabem sobre o uribismo.

Ordenar à polícia que capture os comandantes das FARC não é mais do que um espectáculo de circo. Assim como também o é a ordem de resgate militar dos prisioneiros de guerra sob a euforia da sorte infinita do senhor de Chambacú [1] . Tais ordens são não só desvarios de um governo gangsterizado como também cortinas de fumo inúteis — assim como as cortinas letais de glifosato na fronteira com o Equador.

O mais conveniente para o país é que Uribe deixe de se fazer de louco. Que assuma sua responsabilidade no terrorismo e no narco-paramilitarismo de Estado, e que renuncia a fim de se submeter à lei que ele próprio fez aprovar a fim de favorecer os seus consentidos.

O desemprego disparou. A pobreza ascende como o Challenger [2] . Os preços dos alimentos e dos transportes extravasaram. Não existe investimento social porque o dinheiro está a ser lançado na fogueira da guerra. A Promotoria diz que foram descobertas 4000 fossas comuns de cidadãos assassinados pelo paramilitarismo. Alguns chefes "paracos" afirmam em Itagüí que nas suas áreas não há fossas porque eles lançavam os cadáveres no Rio Magdalena; outros, que não têm os 1500 sequestrados que lhes são atribuídos porque não sequestravam e sim matavam os civis detidos. Apesar de tudo, Uribe continua a manter quotas paramilitares no seu gabinete ministerial. Acabam de assassinar a dirigente camponesa Yoland Izquierdo, em Montería, quando dirigia centenas de pessoas na luta para que os paramilitares lhes devolvessem suas terras…

A este governo não lhe importa o povo e sim os lucros e a segurança das transnacionais.

Nem sequer soa bem nesta altura a ordem de Uribe de confisco cautelar dos bens dos capos narco-paramilitares recolhidos em Itagüí. Por que não o fez antes? Tão pouco os investigaram quanto à lavagem de activos, quando têm diante de sei o paraíso fiscal que construíram na República do Panamá.

Definitivamente, para libertar-nos desta máfia governante que prostrou a Colômbia, as forças democráticas, patrióticas e bolivarianas do país, presentes em todos os sectores da sociedade, devem apressar o encontro para articular a alternativa anti-fascista, que devolva o decoro à nação. Ao mesmo tempo, devemos desenvolver, junto aos povos e suas organizações, a mais intensa campanha internacional para que recuse, em todos os cenários, as desavergonhadas pretensões do governo do senhor Uribe.

[1] Alusão a um escândalo que envolveu personalidades do regime uribista. Chambacú era originalmente uma comunidade de pescadores negros, que foram desalojados a fim de permitir a especulação imobiliária. O escritor Manuel Zapata Olivella escreveu a propósito o romance "Chambacú, corral de negros".
[2] Vai-e-vem espacial.
Iván Márquez
http://resistir.info/

Sem comentários: