quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Reforma das Urgências - vender gato por lebre

Populações e autarcas têm saído à rua em resposta à tentativa de encerramento de muitos serviços de urgência que o ministro Correia de Campos pretende impor à má fila. Como é seu hábito o ministro ameaça com castigos os autarcas recalcitrantes e intensifica a propaganda com a qual pretende vender gato. O documento em que se apoia esta reforma apresenta fragilidades confrangedoras e abre caminho para uma medicina barata mas de baixa qualidade.

A forma como a rede é definida em termos de capitação, isto é da população total a ser servida por cada unidade de urgência, mostra logo como a qualidade não foi o critério por que se pautou a comissão. Assim prevê este documento um Serviço de Urgência Médico-Cirúrgico por cada 200.000 habitantes. Logo aqui se percebe a tentativa de concentrar e diminuir os meios, certamente por imposição economicista do governo, que deixa antever o cenário triste dos hospitais de campanha e das longas esperas por atendimento. A ser seguida esta recomendação a afluência exagerada de doentes a estas unidades irá provocar o seu rápido congestionamento. A França tem uma destas unidades por cada 110.000 habitantes e a vizinha Espanha, embora haja variações entre as regiões, não se afasta muito dos valores franceses.

Depois o documento não define as competências dos médicos que irão estar nas novas urgências a criar nem as qualificações técnicas do restante pessoal. Aliás não há qualquer palavra sobre quadros de pessoal, ou sobre a qualificação técnica consoante a afluência prevista, uma condição basilar para a constituição de serviços de qualidade. Este facto não deixa de ser preocupante atendendo a que pode haver a tentação de empregar mão-de-obra barata e pouco qualificada. Um critério economicista estará seguramente por detrás desta omissão.

A unidades ditas Serviços de Urgência Básica pouco mais serão do que os tradicionais SAP (Serviços de Atendimento Permanente) a que estamos habituados, mas com mais doentes para atender. Se pensarmos que o ministro pretende encerrar urgências com atendimentos abaixo dos 150 utentes diários é de crer que qualquer destas unidades básicas irá atender mais de 150 doentes. A Ordem dos Médicos estipula que um serviço que atenda entre 150 a 400 urgências por dia deverá ter pelo menos oito médicos (sendo três especialistas). O Ministro faz a coisa por menos e estipula apenas dois sem mencionar a especialidade. Isto «...prevendo eventual acompanhamento no transporte de doente» como diz o relatório na página 5. O serviço entretanto, ficará apenas com um médico, até ao regresso do que saiu a acompanhar o doente.

Dá para entender o tipo de medicina de urgência que o Ministro propõe para os Portugueses e os previsíveis estrangulamentos dos novos serviço. As consequências da transformação de 261 Serviços de Atendimento Permanente em apenas 42 Serviços de Urgência Básica e das 73 urgências hospitalares em apenas 41 unidades de Urgência de nível superior, que o documento propõe, deixa antever uma degradação intolerável das condições de funcionamento das urgências em Portugal.

É tempo de dizer basta.
http://pt.indymedia.org/ler.php?numero=114911&cidade=1

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