Ontem aconteceu um verdadeiro carnaval da fé no Vaticano. Bambolearam as sotainas, abanaram-se as mitras, arejaram-se os báculos e agitaram-se os hissopes que estavam de molho nas caldeirinhas da água benta. Apenas com 1 dia de atraso sobre o dia das mentiras.
Uma legião de calaceiros cantava hossanas e desforrava-se em latim das orações que JP2 precisava para ser beato. O cadáver, certamente indiferente, repousava no túmulo enquanto, à sua custa, uma freira exibia a cura da doença de Parkinson.
«Eu estava doente e agora estou curada» - dizia a freira em quem JP2 obrou o milagre que aprendeu em morto. Quem pode duvidar da santidade do rústico Papa polaco que acreditava em Deus e julgava que o 3.º segredo de Fátima lhe era destinado?
A ICAR dedica-se ao ramo dos milagres no campo da saúde quando a sua experiência é bem maior no domínio dos negócios, da política e da repressão. B16, um homem com experiência da vida, presidiu à missa - uma distracção obrigatória para os devotos - e refugiou-se nos aposentos com vergonha de tanta superstição e do histerismo de polacos que queriam levar já um certificado de canonização.
Os milagres são hoje o mais rendoso negócio da Igreja católica mas não tarda que venha pedir perdão pelas pessoas a quem enganou e pelo óbolo que extorquiu aos desgraçados crédulos que julgam que os milagres caem do céu e que uma freira é para levar a sério.
Todos os dias, milhões de pessoas dizem: «Eu estava doente e agora estou curada», sem necessidade de falcatruas, sem encenações obscenas, histerismos colectivos e cadáveres apodrecidos. Basta um antibiótico ou uma aspirina.
Se fosse verdadeiro o milagre, havia de perguntar-se por que razão os hospitais estão cheios e JP2 só se lembrou da freira. Já em vida, era mais conhecido pelos espectáculos que animava do que por razões de justiça. Os milagres deviam ser suspensos por uma providência cautelar para evitar que os simples fiquem mais tolos à espera do Céu.
Carlos Esperança
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