sábado, fevereiro 16, 2008

No discurso do primeiro-ministro no Parlamento

No discurso do primeiro-ministro no Parlamento na passada quarta-feira bastava substituir a palavra «professores» pela palavra «criminosos» para se perceber o que vai nas mentes destes «socialistas modernos». Era como se alguém dissesse no Parlamento mais ou menos isto: «Há trinta anos que há criminosos que não são penalizados, como nos outros países ocidentais. E nós não vamos acabar o nosso mandato sem que isso aconteça! Todos os governos antes de nós não tiveram coragem de fazer isso!». Depois, perante diversas e legítimas questões ou pedidos de esclarecimento colocados da direita à esquerda, o orador se limitasse a insistir no mesmo chavão: penalizem-se os criminosos. Não esclarecia as questões legais. Não esclarecia a calendarização das medidas e o faseamento da implementação de processos complexos. Não esclarecia se há ou não juízes competentes e com possibilidades reais/disponibilidade de aplicar as leis. Não esclarecia se há ou não condições logísticas, no terreno, para os polícias exercerem a sua missão. Não esclarecia se existiam ou não agentes credenciados e treinados para exercerem o poder coercivo legítimo exclusivo do Estado. Nem sequer esclarecia se havia ou não criminosos em número minimamente suficiente que justificassem a urgência da medida. E orador insistia: prendam-se e penalizem-se os criminosos até 2009! O resto é absolutamente (uma palavra que o orador em causa adora) secundário. Enfim, foi confrangedora a pobreza argumentativa do primeiro-ministro na Casa da Democracia. Nem a comunicação social deu por isso. Ou melhor, parece ainda nas nuvens com a «determinação» do político e das políticas para a educação. Sou também defensor da existência de um sistema de avaliação que diferencie os professores, embora pela sensibilidade social do que está em causa a seriedade de tal caminho deva ser construída com ponderação e num processo que tem de levar tempo para ser credível e justo. Mas antes disso sou defensor da democracia. Ela assenta nos processos de negociação social, na persuasão lógica-racional (é o que nos deveria afastar, no século XXI, dos totalitarismos e dos populismos laicos e teocráticos), no respeito pelo Estado de Direito. «Jamé» uma acção política cuja tónica incida radicalmente nos fins em si mesmos. Quando, como é óbvio no discurso do primeiro-ministro, os fins justificam os meios desta forma, está-se para lá da democracia. Estamos abaixo do governo de Ouagadougou.

Gabriel Mithá Ribeiro

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