sábado, março 22, 2008

The three trillion dollar war

A mentira prevaleceu sempre [...] mas a verdade é que o Iraque só se tornou num “ninho de terroristas” depois de os EUA invadirem o país.

Joseph Stiglitz

O quinto aniversário da invasão do Iraque, liderada pelas forças norte-americanas, vai ser assinalado a 20 de Março, efeméride que pode servir de pretexto para pensarmos sobre o que tem acontecido. No nosso novo livro, “The Three Trillion Dollar War”, Linda Bilmes, da Universidade de Harvard, e eu, estimamos, de forma algo conservadora, que o custo económico da guerra para os EUA ascenderá aos três biliões de dólares e, para o resto do mundo, outros três biliões. Ou seja, muito mais que as estimativas iniciais da administração Bush, que além de enganar o mundo sobre os possíveis custos, tem feito tudo para ocultar os custos reais da guerra ainda em curso. Nada disto surpreende, uma vez que vem em sintonia com a postura da administração desde antes do conflito. A mentira prevaleceu sempre: da existência de armas de destruição maciça em território iraquiano à suposta ligação de Saddam Hussein à Al-Qaeda. A verdade, porém, é outra: o Iraque só se tornou num “ninho de terroristas” depois de os EUA invadirem o país.

A administração Bush disse que a guerra custaria 50 mil milhões de dólares. É este o montante que os EUA gastam actualmente no Iraque a cada três meses. Contextualizemos: um sexto deste valor permitiria aos EUA pôr de pé um sistema de Segurança Social robusto para os próximos 50 anos, sem reduzir benefícios nem aumentar as contribuições.

Acresce que a administração Bush reduziu a carga fiscal para os escalões mais elevados no início da guerra, apesar de ter um défice orçamental elevado. Resultado? Sobrecarregou a despesa pública para pagar a guerra. É a primeira guerra que não exige sacrifícios aos cidadãos norte-americanos através do habitual aumento de impostos. O ónus vai recair sobre as gerações futuras.
Se nada mudar, teremos de somar à dívida nacional dos EUA – que rondava os 5,7 biliões de dólares quando Bush assumiu o cargo de presidente – mais 2 biliões de dólares devido à guerra, além dos 800 mil milhões do “consulado” Bush antes da guerra.
Terá sido incompetência ou desonestidade? Ambas as coisas, seguramente. O facto de a administração Bush se focalizar nos custos presentes e não nos custos futuros significa, uma vez mais, que vai comprometer as gerações futuras e os cuidados de saúde que deveria prestar aos veteranos de guerra. A administração só enviou carros blindados para o terreno três anos depois de o conflito ter começado, quando estes poderiam ter evitado numerosas mortes causadas pela detonação de bombas na berma da estrada. A administração Bush preferiu não impôr o recrutamento obrigatório, mas dada a impopularidade da guerra as tropas no terreno têm sido obrigadas a prolongar duas, três e quatro vezes as suas comissões de serviço.

A administração tentou igualmente esconder os verdadeiros custos da guerra dos cidadãos norte-americanos. Diferentes grupos de veteranos invocaram a Lei de Liberdade de Informação para poderem ter acesso aos números reais: os feridos totalizaram 15 vezes o número de baixas. Foram diagnosticadas perturbações de ‘stress’ pós-traumático em 52 mil dos veteranos que entretanto regressaram ao país. Estima-se que os EUA tenham de atribuir pensões de invalidez a 40% dos 1,65 milhões de soldados que já serviram no Iraque. Uma despesa que tende a aumentar à medida que a guerra se arrasta e que hoje se cifra em mais de 600 mil milhões de dólares.

A ideologia e a especulação também têm contribuído para aumentar os custos de guerra. E o recurso a fornecedores privados ajudou a encarecer a factura. Um guarda da Blackwater Security pode custar para cima de mil dólares por dia, valor que não inclui seguro de vida ou pensão de invalidez, pagos pelo governo. Quando a taxa de desemprego no Iraque disparou para os 60%, fazia todo o sentido recrutar iraquianos. Mas não foi isso que aconteceu. Os fornecedores militares preferiram importar mão-de-obra barata do Nepal, das Filipinas e de outros países.

A guerra só teve até agora dois vencedores: as petrolíferas e os fornecedores militares. O preço das acções da Halliburton, empresa de serviços petrolíferos presidida por Dick Cheney antes deste assumir o cargo de vice-presidente, dispararam. A procura de novos fornecedores fez com que a administração norte-americana baixasse a guarda. A incúria nesta guerra obriga a sociedade iraquiana a pagar a maior fatia da factura. Metade dos médicos iraquianos foram mortos ou abandonaram o país, a taxa de desemprego ronda os 25% e, cinco anos depois de a guerra começar, Bagdade continua a ter electricidade menos de oito horas por dia. Dos 28 milhões que constituem a população iraquiana, 4 milhões são deslocados e 2 milhões fugiram do país.

A violência do conflito banalizou a morte aos olhos dos ocidentais: quando se noticia que a explosão de uma bomba matou 25 pessoas, são poucos os que ainda prestam atenção. No entanto, estudos estatísticos sobre a taxa de mortalidade antes e depois da invasão são esclarecedores: das 450 mil mortes nos primeiros 40 meses de guerra (incluindo 150 mil mortes violentas) atingiu-se recentemente as 600 mil.

Quando há tanta gente a sofrer no Iraque, falar sobre custos económicos pode parecer algo desumano. Tal como focalizar a questão nos EUA pode parecer uma análise demasiado auto-centrada, na medida em que o país partiu para a guerra violando a lei internacional. Mas os custos económicos são enormes e vão muito além dos gastos orçamentais. Os norte-americanos gostam de dizer que “não há almoços grátis”. E eu diria que não há “guerras grátis”. Os EUA – e o mundo – vão pagar a factura nas próximas décadas.
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