Bem podem os patrões queixar-se de que a montanha pariu um rato e de que todas as promessas de “flexi-segurança” se reduziram à figura jurídica do despedimento por inadaptação a inovações tecnológicas. Representam desse modo aquela rábula sacramental dos descontentes, que não investem porque não lhes dão condições e que fariam desta economia um oásis de prosperidade se em tudo obtivessem satisfação.
Rábulas à parte, os patrões sabem muito bem que Sócrates logo que puder, talvez depois de novo mandato eleitoral, encontrará maneira de lhes dar novos recursos para libérrimos despedimentos; e que, por agora, deverão contentar-se com esta da “inadaptação”, o que já não é nada mau.
Bem pode Vieira da Silva, de cada vez que se vira para os sindicatos e para as bancadas da esquerda, jurar a pés juntos que a “inadaptação” é mesmo uma circunstância muito específica e que só se verificará em casos excepcionais. Cansados estamos todos de saber como estas coisas funcionam, desde o tempo em que Salazar inventou uma Constituição (1933) com amplas liberdades e garantias consagradas no artigo 8º, e, acto contínuo, reduzidas a zero pelo parágrafo 1º desse artigo – alçapão que definia as excepções à regra e que em breve se tornou a regra sem excepção daquele fascismo hipócrita e jesuítico.
E cansados estamos também de saber como estes neoliberais aprenderam o seu cinismo pela cartilha salazarista. Ou não fosse o Estado-patrão o maior abusador dos falsos recibos verdes e dos falsos contratos a termo. Anunciam-se agora, num horizonte próximo, as falsas inadaptações – com a particularidade de que os falsos recibos verdes servem para criar trabalho precário e as falsas inadaptações servem para destruir trabalho estável, uma coisa alimentando a outra.
Contra a “flexi-segurança”, é já aqui, neste ponto crítico, que a política do governo deve ser travada.
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