As bolhas financeiras quando em crescimento, funcionam como diques de contenção do capital excedentário. Quando se rompem, o capital contido e multiplicado sai atrás de tudo que aparentemente reluz. As bolhas são como buracos negros, sugam toda matéria que possa ser alcançada por sua força de atração, mas a mantém contida pela energia aí gerada. Se explodem, joga tudo para fora - nesse caso as bolhas, pois não se tem conhecimento de explosões de buracos negros apesar de ser um evento possível. A matéria, o dinheiro expelido, busca acomodar-se em outros buracos que lhes sejam rentáveis, não sem antes causar distúrbios por vezes violentos.
A diferença da crise atual para as anteriores, causadas também por estouro de bolhas financeiras, é que agora todos os papéis parecem suspeitos, o que tem levado o capital a se dirigir e aportar em ativos reais, principalmente aqueles, que por motivos diversos, podem ou vem sofrendo alguma pressão de demanda. O exemplo mais evidente é o do petróleo, aonde os preços já vinham subindo em função da escassez na natureza e das incertezas políticas nos países produtores. Mas só o desequilíbrio entre a oferta e a procura, não é, de forma nenhuma, suficiente para explicar o salto absurdo dos preços logo após o estouro da bolha imobiliária nos EUA, como pregam alguns arautos do sistema.
O petróleo, como outras commodities, sobe num momento em que a expectativa é a redução do crescimento mundial, ou seja, de redução da demanda, o que aponta para a existência de uma bolha. O problema é que a bolha das commodities, em particular do petróleo, é altamente inflacionária, pois sendo este a matriz energética do mundo e matéria-prima de um grande número de produtos industrializados, a inflação tende a disseminar-se por todos os setores da economia. Para tomarmos consciência da importância do petróleo na produção de mercadorias é só olhar além dos tanques de combustíveis de nossos carros, para os objetos que nos cercam, os alimentos que ingerimos e veremos o que significa o aumento de preços desse produto.
A bolha das commodities difere das demais pelo fato de o aumento dos preços se espalharem por todo planeta, não se restringindo a alguns países por ter a economia capitalista no petróleo a sua principal base sustentação. Quanto ao aumento dos preços dos alimentos, pode ter alguma relação com o consumo, mas é preciso levar em consideração os preços dos transportes, da armazenagem, dos insumos, principalmente dos fertilizantes, que direta ou indiretamente tem alguma relação com o petróleo. Mas não pode ser deixado de lado, de forma alguma, o impacto da utilização das commodities como refúgio do capital que foge dos estragos causados nas bolsas, no setor financeiro e em seus exóticos “produtos”, pela crise imobiliária americana. É só analisar a velocidade de negociação das commodities alimentares nas bolsas de mercadoria, e a voraz compra de terras produtivas e meios de produção pelos fundos em todo mundo e no Brasil.
É possível assistirmos aqui situação semelhante a dos anos setenta, quando no lançamento do Pró-álcool, terras destinadas ao cultivo de alimentos pelos pequenos agricultores e suas famílias, foram “expropriadas” pelo capital, que via na monocultura da cana-de-açúcar e na produção de álcool uma alternativa para aumentar a rentabilidade. Com o entusiasmo do governo pelos biocombustíveis e o capital global à solta, ávido por novas oportunidades, tudo fica mais fácil. Só estamos no início de um processo e a compra de terras por empresas, fundos nacionais e estrangeiros, que vão de vastas extensões a pequenos sítios, já fez subir significativamente o preço do hectare, o que deve complicar mais ainda a produção de alimentos e a inflação. As condições são propícias para uma nova onda de concentração da propriedade fundiária.
O discurso de um desajuste causado na economia pelo “choque de oferta” e pressão de demanda, como único responsável pelo aumento dos preços das commodities, não entende, ou intencionalmente tenta deixa de lado, a importância do violento movimento do capital, fictício ou não, em busca de rentabilidade na crise atual. A fragilidade do dólar frente às outras moedas, que busca compensar a queda das vendas internas americanas com as exportações, e, ao mesmo tempo, reverter o déficit na balança comercial, tende a agravar mais ainda a situação, pois a depreciação do dólar, que funciona como dinheiro universal, é causa e efeito dessa nova realidade.
Rall
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