quarta-feira, outubro 01, 2008

e no princípio de tudo...

Nem tenho por aqui um acelerador de partículas, nem me parece curial advogar uma imersão numa espécie de teoria do big bang que ajude a explicar o que se passa com os professores em Portugal.

Desta vez não me vou centrar na insuportável e estafada má burocracia que asfixia a realização do ensino nas nossas escolas. Já escrevi muito sobre isso, que pode ser consultado neste espaço, e voltarei ao assunto em breve e noutra entrada.

Por agora, o que quero é participar na discussão à volta da avaliação do desempenho dos professores. Considero, para além da atmosfera monstruosa que o modelo encerra, que o primeiro constrangimento desloca-se para a alteração no estatuto da carreira docente que conduziu à divisão dos professores em titulares e não titulares.

Há quem se refugie na contenção de custos para abençoar essa polémica decisão, remetendo para o primeiro patamar da sua argumentação a necessidade de se estabelecer cotas e vagas na progressão da carreira de professores. Pode não ser assim. Vagas e cotas podem ser estabelecidas sem a necessidade de fracturar a carreira em duas. Mais: nem sequer a ideia descomunal de credibilizar, por método concursal, os avaliadores para o processo de avaliação do desempenho joga a favor da divisão: há outras formas de o fazer.
Correndo o risco de me tornar um pouco selvagem na minha argumentação, uma vez que num registo destes a ideia de se ser sucinto é imperativa, aconselho, todavia, os leitores mais assíduos (e aos outros, claro) deste blogue para outras entradas onde os assuntos que vou focar têm sido abordados. Terei o cuidado de linkar, e já o fiz nos parágrafos anteriores, alguns conceitos para esses registos de modo a simplificar a vida de quem sinta vontade de o fazer.

A formação contínua de professores é um fenómeno que conhece em Portugal o desnorte mais absoluto. Não existe a mais ténue ligação das universidades, e dos seus centros de investigação, ao que se faz todos os dias na escola. E pode conhecer-se aí a origem de todos os males que flagelam o estado actual do estatuto dos professores, quer o decretado quer o conhecido.

Por outro lado, a formação em exercício tem contornos que ajudam a acentuar a desorientação e a permitir os desmandos conhecidos. Desvalorizámos, desde quase sempre e em quase todas as situações, o exercício de funções nas escolas. Lembro-me de, ainda jovem e a título de exemplo, ser colocado numa escola e ser o delegado do grupo disciplinar: tinham deixado o cargo para o último horário. Ou seja: ao contrário de todos os outros, era o único que não era do quadro; mas antes de ter dado a primeira aula já tinha estado no conselho pedagógico a discutir sabe-se lá o quê.

A tudo isto, misturou-se ainda a aquisição de graus académicos sem rumo e sem critério.

Resultado: quer o exercício de funções quer a aquisição de graus académicos está, na maioria dos casos, descredibilizada: há gente que preencheu muitos cargos que ninguém considera e há gente cheia de formações acrescidas, que se entreteve a receber o salário e a dar, também, péssimos exemplos de profissionalismo, que também é desconsiderado.

Resultado: há milhares de vozes que contestam os critérios que levaram alguns ao cargo de titular e não se ouve uma única voz em defesa das pontuações do concurso: têm razão e era inevitável.

Como ultrapassar isto? Desde logo com uma ideia que as democracias procuram estabelecer: rotatividade no exercício de cargos de acordo com o seguinte princípio: escolha por eleição directa e limitação de mandatos - e sem querer distrair o nosso raciocínio, lembro o facto de o novo modelo de gestão escolar prever a nomeação dos avaliadores -.
Claro que tem de ser repensado todo o processo de formação académica e contínua dos professores.

Quanto à carreira bastaria o seguinte: sempre que um professor cumpre o módulo relativo ao escalão em que está, solicita uma avaliação externa (por um par ou por um elemento exterior à escola), com a observação de duas ou três aulas no último ano, no caso de pretender mudar de escalão. Deve ser discutida a possibilidade de se realizar provas públicas para o acesso aos escalões de topo e as vagas para os outros patamares devem ser conhecidas anualmente: para todas as escolas e para todos os departamentos curriculares (ou grupos disciplinares).
De mais realismo não sou capaz. Estarei a fazer política? Mas fazer política não é pensar a situação em que vivemos? Não é pensar o mundo?
http://correntes.blogs.sapo.pt/151012.html

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