Na semana passada o Bom Deus, evidentemente, percebeu que um número insuficiente de pessoas lera a explicação de Hyman Minsky de como os ciclos financeiros acabam em esquemas de Ponzi – a etapa em que os bancos mantêm o boom em andamento emprestando aos seus clientes o dinheiro para pagar juros e assim evitar o incumprimento. Assim, Ele enviou Bernie Madoff para ocupar os noticiários durante uma semana e dar aos mass media oportunidade para informar os leitores de jornais e visionadores de TV como funcionam os esquemas de Ponzi. O que sr. Madoff fez, em resumo, foi o que a economia como um todo tem estado da fazer sob o nome de "criação de riqueza".
Se os media foram capazes de aguardar até tão tardiamente o colapso financeiro da semana passada para apresentar diagramas sobre como os esquema de Ponzi precisam manter-se a crescer exponencialmente, isso é simplesmente porque as más notícias financeiras não são consideradas valiosas na América do Norte. Mas a Europa tem estado a fazer os seus próprios ensaios, encabeçada pela Espanha – a qual, não por coincidência, está agora a experimentar a maior queda imobiliária fora das economias pós-soviéticas.
O melhor estudo de caso verificou-se dois anos atrás. Em 9 de Maio de 2006, a polícia espanhola invadiu 21 casas e escritórios da Afinsa Bienes Tangibles SA, o maior negociante de selos de correio, e uma firma rival, Forum Filatélico. Acusaram onze pessoas de dirigir um esquema pirâmide de US$6,4 mil milhões que (juntamente com a Afinsa) atingiu 343 mil investidores – 1 por cento de toda a população da Espanha, tornando a fraude uma das maiores da história do país.
Quando investidores se afastam da formação de capital tangível e preferem comprar selos de correio e objectos semelhantes uma economia ou está perturbada ou perdeu o seu senso de equilíbrio. Ao contrário da maquinaria e da tecnologia, selos não produzem bens e serviços reais. Desde há muito são impressos e vendidos pelos governos e nunca serão realmente utilizados para postar cartas. Contudo, os selos mostraram-se um grande veículo para atrair poupadores, os quais pensam que comprá-los pode produzir um crescimento de rendimentos exponencial – ou, mais tecnicamente, ganhos de "capital", se pudermos estender a terminologia económica suficientemente longe para chamar de "capital" a uma colecção de selos.
Se o valor resultasse simplesmente da escassez, então todos os selos de correio, moedas e pinturas de mestres pareceriam aumentar quase automaticamente ao longo do tempo, tal como a maior parte da terra. Mas estes troféus de riqueza não promovem a elevação da produção, do consumo ou dos padrões de vida. Como selos não rendem dinheiro empregando trabalho para produzir bens e serviços, os seus ganhos de preço não são nem lucro nem ganhos de capital como se entende no sentido clássico. Eles são o que os economistas chamam de ganhos inesperados.
O esquema espanhol dos selos de correio parece tem levantado voo em 2003, o ano que o governo conservador e favorável ao livre-mercado da Espanha desregulamentou os seguros e a supervisão para fundos de investimento não financeiros. A Afinsa Group comprou os dois terços de controle da casa de leilões de selos e moedas Greg Manning, de Nova Jersey, e fundiu-se com o leiloeiro espanhol Auctentia para criar a Escala, a terceira maior firma de leilões do mundo (após a Sotheby's e a Christie's). A Escala mudou as suas operações para a cidade de Nova York e listou as suas acções no mercado de balcão da Nasdaq. Apesar da tendência letárgica do mercado de acções, os ganhos da companhia mostraram um crescimento tão rápido que em apenas três anos o preço da sua acção subiu de menos de US$5 para US$35, triplicando apenas em 2005.
As compras da Afinsa representavam 70 por cento dos lucros da Escala, graças em grande parte ao facto de que, como seu único fornecedor, a Escala alcavalava os seus selos com uma margem de 1.150 por cento, muito além dos 25 por cento habituais. A Afinsa então estava a registar na sua contabilidade selos pelos quais pagava 58 milhões de euros a €723 milhões, mais de dez vezes os seus valores de catálogo – os quais são ficticiamente altos de qualquer forma, sendo publicados principalmente em benefício dos comerciantes de selos a fim de que possam dar aos seus clientes a ideia de que estão a efectuar uma boa compra. Mas, como explicou o presidente do Forum Filatélico, Francisco Briones, a um repórter do Financial Times de Londres, "era normal cobrar aos clientes preços tão inflacionados devido aos serviços que proporcionavam ... incluindo a custódia e conservação dos selos".
A Afinsa pagava aos seus investidores em selos uma taxa de juros anual de 6 a 10 por cento, superando a maior parte dos rendimentos competidores quando a bolha financeira global pressionava as taxas de juros para baixo. (Os títulos do governo espanhol pagavam apenas 3,5 por cento.) Para aumentar a confiança, a Afinsa dava aos seus clientes cheques pós-datados relativo aos ganhos que eram prometidos. Ela também prometia comprar de volta os selos que vendia, ao preço original. Isto dava uma aparência de liquidez ao normalmente ilíquido mercado de selos, obras de arte e outros bens coleccionáveis, em que comissões de 25 por cento para os leiloeiros são normais. Estas tácticas convenciam a maioria a simplesmente reinvestir o dinheiro para comprar ainda mais selos, os quais a companhia mantinha ostensivamente nos seus escritórios para salvaguarda e preservação.
O dinheiro era despejado ali, dando aos investidores em acções do Escala retornos muito mais elevados do que os clientes compradores de selos estavam a receber nominalmente. Como observou um repórter, por que comprar selos e moedas quando se pode investir em companhias que negoceiam com eles? Mas, uma semana após as prisões, as acções do Escala mergulharam abaixo do US$4 por unidade.
O desenlace verificou-se logo após o Lloyd's de Londres retirar-se de uma apólice de €1,2 mil milhões para segurar os selos da Afinsa. Um dos seus peritos percebeu que se US$6 mil milhões houvessem realmente sido investidos, isto teria comprado todos os selos para investimento no mundo todo muitas vezes. O facto de que os preços dos selos não reflectiam compras tão extraordinárias implicava que poucas transacções de selos de boa fé verificaram-se de todo, e que havia uma super-facturação maciça.
Quando o assunto foi deslindado, a maior parte dos selos da Afinsa não tinha valor como investimento. Isto explicava porque não havia receitas das transacções com a Escala. A polícia descobriu 10 milhões em notas de 500€ ao romper uma parede recentemente camuflada na casa de Madrid do principal fornecedor da Afinsa, Francisco Guijarro. O que não puderam encontrar foram quaisquer recibos para os selos que ele alegadamente comprara. A apesar das margens incrivelmente altas cobradas para cuidar da colecção de selos, as falsificações eram frequentes, como o Lloyd's suspeitara. Concluindo que as facturas que o Senhor Guijarro havia enviado à Afinsa eram apenas uma cobertura para uma operação de lavagem de dinheiro, os promotores acusaram os membros da família e os responsáveis que controlavam a Afinsa de desfalque, lavagem de dinheiro, evasão fiscal, bancarrota fraudulenta, quebra de confiança e falsificação.
As prisões trazem à memória uma das mais famosas fraudes dos EUA envolvendo selos de correio há 86 anos atrás, em 1920, cometida por Charles Ponzi – o homem que baptizou com o seu nome o esquema da pirâmide. Ele chegou a Boston em 1903 com apenas US$2,50 no bolso. Como não falava bem o inglês, assumiu trabalhos servis. Despedido do emprego de criado de mesa por aldrabar clientes nos trocos, mudou-se para Montreal e tornou-se caixa assistente no banco de um imigrante italiano. Este cresceu rapidamente por pagar o dobro das taxas de juros normais de 3 por cento em contas-poupança, mas fracassou quando os seus empréstimos imobiliários começaram a ir mal. A tentativa do banco de dar a impressão de solvência parecem ter dado a Ponzi a ideia de pagar juros a partir de novas entradas de depósitos ao invés de fazê-lo a partir de rendimentos reais. Enquanto os clientes sentissem que estavam a receber juros regularmente, tendiam a ficar calmos quanto ao capital principal.
Ponzi foi mandado para uma prisão canadiana por falsificação, e depois foi encarcerado em Atlanta por tentar contrabandear imigrantes italianos para os Estados Unidos. Após a sua libertação mudou-se para Boston e conseguiu um emprego num negócio de vendas por catálogo. Um cliente espanhol enviava-lhe pelo correio um coupon de resposta, o qual permitia ao seu possuidor comprar selos em países estrangeiros para o envio de retorno ao invés de utilizar o dinheiro interno para comprar um selo.
Os preços destes coupons estavam ultrapassados, tendo sido reajustados em 1907 pela International Postal Union. A I Guerra Mundial alterou drasticamente as taxas de câmbio, permitindo aos compradores pagarem uma pequena quantia na Grã-Bretanha – ou mesmo menos na Alemanha com a sua divisa desvalorizada – e obter a encomenda de um selo de retorno que era válido nos Estados Unidos.
A margem destas pequenas encomendas postais era grande. Um tostão americano podia comprar encomendas de selos estrangeiros que podiam ser convertidos em seis centavos em selos dos EUA, com um lucro de 500 por cento. O problema era que seria preciso um camião inteiro de tais encomendas para ganhar dinheiro significativo. Um milhão de dólares de investimento envolveria uma centena de milhões de coupons de tostão – os quais teriam então de serem convertido em selos e vendidos em concorrência com o U.S. Post Office, presumivelmente com um desconto, principalmente em vizinhanças de imigrantes.
Enfatizando o principio da arbitragem ao invés de uma implementação laboriosa, Ponzi explicou que podia obter um ganho de 400 por cento após despesas. Ele prometia aos investidores duplicar o seu dinheiro em 90 dias, pretendo considerar os custos e o tempo de transporte da Europa para a América. Quando a sua Securities Exchange Company pagou aos primeiros investidores os altos retornos que ele havia descrito, eles difundiram a notícia junto a outros. O influxo de fundos para Ponzi aumentou de US$5000 em Fevereiro de 1920 para US$30 mil em Março em US$420 mil em Maio. Por volta de Julho, estavam a entrar na sua firma US$250 mil por dia, principalmente de pequenos investidores que deixavam os seus créditos contabilísticos ali para aumentarem ao invés de tomarem o seu dinheiro de volta. Algumas pessoas colocaram as poupanças de toda a sua vida no plano, e até tomaram dinheiro emprestado hipotecando as suas casas.
Ponzi gastou a maior parte do dinheiro consigo próprio, comprando uma mansão e trazendo a sua mãe da Itália. O repórter financeiro Clarence Barron (editor do Barron's) observou que se ele houvesse realmente investido o dinheiro como dizia aos seus investidores que havia feito, Ponzi teria de comprar 160 milhões de coupons de resposta postal. Mas os correios informaram que poucos estavam a ser comprados internamente ou no exterior, e apenas 27 mil estavam a circular nos Estados Unidos.
Agentes federais invadiram os escritórios de Ponzi no mês de Agosto e não encontram quaisquer coupons de resposta postal, assim como a polícia espanhola não encontrou selos de correio aptos para investimento no esquema de 2006. Ponzi foi mais uma vez sentenciado à prisão, mas fugiu e tentou fazer algum dinheiro rápido vendendo imóveis na Florida. Foi logo recapturado e deportado de volta para a Itália em 1934.
O que Ponzi vendia era esperança, aproveitando-se do desejo irrealista das pessoas de acreditar que fora descoberto um novo meio de obter ganhos fáceis, sem limites superiores de por quanto tempo os ganhos podem persistir acima da própria taxa de crescimento da economia. É uma medida de quão duro é obter retornos no mundo de hoje – e portanto, quão pouca esperança precisa ser estimulada – que enquanto Ponzi prometia duplicar o dinheiro investido a cada três meses, o esquema espanhol dos selos pagava apenas 6 a 10 por cento de retorno anual. Nenhuma fraude realmente obtém quaisquer ganhos ou lucros, mas simplesmente paga aos investidores com o novo dinheiro vindo de novos actores. Os novos influxos eram tratados como rendimentos. É assim que funcionam os esquema de pirâmide.
Era quase como se os operadores espanhóis houvessem lido uma das biografias de Ponzi que começaram a aparecer quando observadores perceberam os denominadores comuns entre a bolha financeiro global da década de 1990 e as bolhas primitivas. Estas bolhas apresentavam o contraste clássico entre a riqueza real das nações e o que a imprensa de negócios destes dias chama "criação de riqueza" que toma simplesmente a forma de aumento do preço dos activos – "ganhos de capital", a maior parte dos quais são ganhos no preço da terra.
Não há dúvida que os coleccionadores de selo teriam encarado o aumento dos preços dos selos como criação de riqueza se realmente houvesse ocorrido. Mas tudo o que teria sido alcançado era o inflacionamento dos preços dos velhos selos, tal como as fileiras crescentes de bilionários do mundo estivessem a aumentar preços de pinturas de grandes mestras e de arte moderna, mobiliário de designers e casas com frente para o mar. Se todas as poupanças da economia fossem para Rembrandts e Picassos, o seu preço obviamente dispararia, assim como aplicar US$6 mil milhões em selos postais teria estabelecido níveis mais elevados para os preços dos selos.
O fluxo de fundos para qualquer categoria de activos aumenta os seus preços. Isto é verdadeiro acima de tudo para a terra, uma das necessidades económicas mais universais e medida do status do consumo de luxo. Mas será que isto realmente "cria riqueza"? Será que os preços do mercado reflectem os valores de uso, os padrões de vida e o progresso da civilização.
O requisito característico para tais ganhos de preços é na verdade da escassez, mas não demasiada de forma a que não haja o suficiente para grande número de compradores fazerem um mercado. Se a utilidade psicológica é a chave, "escassez" tem valor apenas para um carácter aquisitivo compulsivo – vício da riqueza. Isto significa ter aquilo que falta a outras pessoas, com conotações de recusa. A maior parte do dinheiro à busca de mera escassez não está a ir para troféus dos novos ricos, mas sim para o mais abundante e também o mais escassos recurso universal: terra. A natureza não está a fazer mais disto. Mas todos precisam de terra para viver, tornando-a o objecto por excelência da poupança pessoal e dos negócios. Mesmo nas economias pós-industriais de hoje, a terra e a riqueza do seu subsolo representam os componentes maiores dos balanços nacionais.
Mas visto que a terra não pode ser fabricada, as poupanças não podem aumentar a sua oferta através do investimento. Isto coloca um problema traumatizante para os economistas. As estatísticas do rendimento nacional contam qualquer dinheiro gasto que não é consumido como poupança. Seguindo John Maynard Keynes, elas definem poupança como igual a investimento. Isto lança as sementes das confusão em relação ao carácter e às pré-condições do crescimento económico. Podemos nós realmente chamar a isto "criação de riqueza" quando a sociedade dirige as suas poupanças meramente para a especulação ao invés de elevar as forças produtivas ou os padrões de vida?
Os economistas clássicos vacilavam em tratar a terra como um factor de produção ou como um direito legal da propriedade para extrair uma portagem (tollbooth) de um dado sítio e cobrar um encargo de acesso tal como um imposto ao utilizador. Um factor de produção contribui para a produção e o rendimento quando mais rendimento é nele investido. Uma propriedade da qual se obtêm rendas reduz o fluxo do rendimento económico. Neste último caso a terra é parte do sistema de propriedade institucional, não o sector de produção da economia com base tecnológica.
O que não se discute é que o imobiliário é altamente político ao nível local. O desenvolvimento urbano tende a ser moldado por negócios de iniciados e os gastos com infraestrutura pública para aumentaram os preços da propriedade local e lobbying para obter baixas avaliações fiscais. É inquestionável que quanto mais economicamente poderosa se tornar uma fonte de riqueza, maior é o seu poder político para fazer lobby em favor de vantagens fiscais especiais. Ao nível nacional, o imobiliário utiliza parte do ser rendimento para apoiar políticos que lhe proporcionam uma ampliação do favoritismo fiscal sobre este rendimento especial.
Na esfera financeira, toda bolha tem sido dirigida por governos. As bolhas precisam ser orquestradas por formadores de opinião, endossadas por responsáveis públicos para dar-lhes uma patina de confiança. A "loucura das multidões" é um eufemismo concebido para afastar a culpa dos governos e transferi-la para o público. Nos Estados Unidos, Alan Greenspan desempenhou o papel de mestre público da bolha de forma semelhante àquele que Walpole desempenhou na bolha do Mar do Sul na Inglaterra e ao de John Law na bolha do Mississipi em França cerca de três séculos atrás, nos anos 1710.
Os balanços de hoje confundem a bolha da riqueza com formação de capital real. "Investimento" tornou-se qualquer coisa que os contabilistas digam que é. De modo que ter activo e valores de dívida dá a deriva para a ficção financeira de hoje. A prática de "marcação pelo mercado" ("marking to market") permite aos contabilistas projectarem ganhos hipotéticos a taxas de juro astronómicas, ou trivializando através da actualização, aplicar funções puramente matemáticas que perderam toda a conexão com taxas de crescimento realistas. O resultado é que o próprio sector financeiro tornou-se desligado da economia "real".
A tragédia do nosso tempo é que a poupança de hoje está a ser divergida por caminhos que estão desligados da formação de capital real, mas que simplesmente acrescentam encargos da dívida e da propriedade à economia.
Suponha-se que Ponzi houvesse realmente comprado International Postal Orders e que as companhias de selos espanholas houvessem realmente investido US$6 mil milhões em selos e moedas raras, fazendo subir o seu preço a fim de criar ganhos para os investidores. A quem venderiam elas, a fim de tomarem os seus ganhos? (Isto é o problema proverbial do "louco maior".) Indo mais directamente ao principal, quão positivo teria sido o vasto efeito económico de tal inflação do preço dos activos?
As bolhas recentes do mercado de acções e do imobiliário são tal como esquemas de pirâmide no sentido de que altear os preços das acções e da propriedade é um influxo exponencial de novo dinheiro de planos de pensão e fundos mútuos (para acções) e de crédito bancário (para imobiliário). Os capitalistas de risco estão a refinanciar-se ("cashing out") enquanto administradores corporativos exercem as suas opções de acções.
Suponha-se que as companhias de empacotamento de hipotecas sejam honestas nas suas avaliações das tendências de preços actuais. A bolha imobiliária, contudo, é especulativa e pós-industrial. A analogia é revelada quando administradores financeiros endossam políticas governamentais que encorajam a inflação de preços para acções e títulos, selos e moedas, Rembrandts e arte moderna com a afirmação de que isto cria riqueza e portanto, por definição, faz avançar os padrões de vida e de cultura.
O que está errado neste quadro? Para começar, ele falha em definir valor como algo distinto do preço, ganhos inesperados e ganhos de capital como distintos do rendimento obtido. Ele também esquece o facto que os preços do mercado sobem e descem, mas que as dívidas permanecem no lugar onde estão. E quando as dívidas não podem ser pagas, as poupanças são destruídas.
Em 9 de Maio de 2006, o preço das acções da Escala caíram pela metade quando a notícia do raid da polícia difundiu-se. Na sexta-feira a sua acção havia caído quase 90 por cento. Na segunda-feira saltou 50 por cento, de US$4,34 para o fecho de US$9,45 por acção na quinta-feira. Os hedge funds estavam a fazer e perder dinheiro, minimizando os ganhos e perdas feitos com o comércio de selos. Um verdadeiro mercado no crime, a punição e a fuga ao castigo estava em causa.
O que tem isto a ver com a verdadeira formação de capital? Indivíduos estão a ficar ricos enquanto a economia está a polarizar-se entre credores e devedores, donos da propriedade e pagadores de rendas. O investimento improdutivo verifica-se quando assume a forma de ganhos de "capital" inesperados, e quando isto envolve entrar em dívida para o imobiliário, acções, títulos ou "coleccionáveis". O crédito improdutivo verifica-se quando bancos comerciais fazem empréstimos que simplesmente financiam a compra de propriedade, companhias ou títulos financeiros já existentes.
Dois séculos atrás, os seguidores franceses do conde Henry St. Simon conceberam um sistema industrial que devia ser baseado principalmente no financiamento por acções ao invés de sê-lo pela dívida (títulos e empréstimos bancários). A sua ideia era tornar a banca industrial uma espécie de fundo mútuo, de modo que as reivindicações de pagamento (e portanto o valor das poupanças) ascenderiam e cairiam de modo a reflectir o poder de rendimento da economia. A banca industrial que se desenvolveu amplamente na Alemanha e na Europa Central diferia do curto-prazista crédito comercial com colateral anglo-americano e no empréstimo hipotecário. Mas desde a I Guerra Mundial, as práticas financeiras globais têm sido mais extractivas do que produtivas.
A consequência foi que dívidas ao nível mais vasto da economia cresceram mais rapidamente do que a capacidade para pagar. Ao invés de reduzir este encargo da dívida arranjando um meio para dela sair, as economias têm procurado inchar o caminho de saída. Contudo, o modo de inflação não é a elevação familiar nos preços do consumidor, muito menos inflação de salários. É, ao contrário, inflação do preço dos activos, proveniente em grande medida dos Estados Unidos. Desde que o padrão ouro deu lugar ao padrão dólar de papel, em 1971, a economia dos EUA tornou-se a única a ser capaz de criar crédito – e dívida externa – sem constrangimento. O resultado tem sido um crescimento sem paralelo da dívida em relação ao rendimento, à produção e aos salários. Esta "poluição da dívida" tem sido comparada à poluição ambiental.
Entrámos numa era em que os mercados financeiros assemelham-se aos fundos de compra de selos. Os governos substituíram o crescimento industrial pela criação de riqueza puramente financeira na forma de bolhas do mercado imobiliário e de acções. Isto pôs o universo económico de cabeça para baixo em relação às expectativas dos escritores clássicos quanto ao progresso tecnológico desencadeado pela Revolução Industrial e suas revoluções agrícolas, comerciais e financeiras paralelas. A propriedade e o crédito tornaram-se custo ao invés de benefício, formas institucionais de extracção de renda e de juros que sobrecarregam ao invés de ajudarem.
Michael Hudson
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