Contrariando o senso comum, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, não é a falta de vaga nem de professor que emperra o ensino integral: é a baixa adesão das famílias. Pesquisa da Secretaria da Educação do município mostrou que apenas 27% dos pais permitem que os filhos fiquem o dia inteiro na escola. Para 73% deles, atividades extracurriculares não trazem grandes benefícios à educação, e alguns dizem temer que os filhos fiquem muito cansados.
"Os pais entendem que a escola é algo obrigatório, mas há um sentimento também de que educação demais é um problema", constata o secretário da Educação, Jailson de Souza e Silva, geógrafo com militância em trabalhos sociais em favelas do Rio. Ele acredita que famílias pobres precisam ver a educação do mesmo ponto de vista da classe média, como algo essencial para a liberdade individual e a construção de perspectivas. "Todo pai deseja que o filho seja doutor. Só que desejo é diferente de necessidade. A classe média transformou a escola em necessidade. Desejo é algo que se quer. Necessidade é algo que não se pode deixar de ter. Parece uma diferença sutil, mas é fundamental", define.
A opinião dos pais foi percebida após a prefeitura inaugurar há quatro anos uma expansão do ensino integral usando espaços comunitários. Chamado de Bairro-Escola, o projeto aproveita espaços de igrejas, clubes, quadras esportivas, associações e sedes de organizações não-governamentais para complementar as salas de aula.
As atividades são feitas por bolsistas de pedagogia. Os salões de estudo bíblico de igrejas emprestam o quadro negro para reforço de português e matemática. Auditórios se transformam em teatro e cinema. Piscinas grandes servem para aulas de natação e pequenas abrigam recreações aquáticas. Mães cadastradas no Bolsa Família ajudam com sugestões baseadas na realidade dos alunos. Com os filhos, fazem cinco refeições na escola, onde as crianças tomam banho e têm lição de higiene.
Para ir da escola aos locais das atividades, os alunos caminham pelo bairro, que recebe obras com base na necessidade deles. Moradores e comerciantes se comprometem a manter as calçadas reformadas, livres de obstáculos. Guardas municipais zelam pelo grupo e motoristas de ônibus se comprometem a reduzir a velocidade. Não é raro vizinhos oferecerem água gelada às crianças. Resultados aparecem: esses alunos tiveram rendimento 25% superior na última Prova Brasil, avaliação nacional feita pelo Ministério da Educação. "Eles se ocupam, dormem mais cedo, se alimentam melhor e ficam mais dispostos", diz Maria Antônia Goulart, coordenadora do Bairro-Escola.
Conscientização - Implementado em 42 unidades, este ano a proposta atingirá as 107 escolas da rede. E a aposta da secretaria para ganhar adesão das famílias será convencê-las de que a escola pode ser a saída para o cotidiano pobre, violento e carente de infraestrutura. "O conceito é impactar o território a partir da escola", diz o secretário, confiando que, ao notar que o bairro melhora com a escola, os vizinhos passam a vê-la como o caminho para uma vida melhor.
Na última chamada, foram 308 parceiros. Apesar disso, pais não deixam os filhos mais tempo na escola porque temem que fiquem cansados. Alguns duvidam que as atividades - pintar, compor, jogar, ver filme - contribuam com a formação. Outros implicam com a caminhada no bairro. E há os que precisam voltar cedo porque "tem que ajudar em casa". (AE)
Sem comentários:
Enviar um comentário