quarta-feira, abril 08, 2009

EUROPA: Adolescentes cometem 42 % dos crimes violentos

Gérard Greneron, presidente do Conselho Europeu dos Sindicatos de Polícia, esteve em Portugal para participar no II Congresso de Investigação Criminal. Numa entrevista escrita ao Expresso, Greneron descreve uma sociedade cada vez mais violenta e ameaçada pelo crime económico e pede mais vontade política para construir uma Justiça europeia.


Já existe uma consequência directa da crise económica em termos de segurança?
A crise económica leva à perda de emprego e, por consequência à perda de rendimentos, não oferecendo perspectivas de futuro. Sem confiança na possibilidade de redefinir a sua vida profissional, surgem desequilíbrios familiares, o que pode levar, em determinados casos, à delinquência. Se a crise económica é um factor agravante ela não explica, por si só, todo o aumento da violência.
O que pode, então, explicar o resto?
Na Europa constatamos um aumento de violência física contra as pessoas, e, neste tipo de violência, 42% dos casos são cometidos por adolescentes. A violência banaliza-se, também através da televisão, cinema e, sobretudo, videojogos, dos quais os menores são grandes consumidores. Esta situação traz naturalmente risco acrescido para os cidadãos mas também para as forças de segurança.

Esteve reunido com o Ministro da Administração Interna numa altura em que os sindicatos das forças de segurança portugueses estão a negociar os seus estatutos profissionais. Com que impressão ficou da sensibilidade do Governo português para essas questões?
O CESP (Conselho Europeu dos Sindicatos de Polícia) garantiu ao Ministro que iria seguir com bastante atenção a reforma do estatuto profissional da PSP, em constante ligação directa com a ASPP/PSP. Insistimos na necessidade de levar a bem esta importante reforma, como forma de garantir melhores condições de trabalho, remunerações e dignidade para os profissionais da polícia, e também oferecer uma melhor segurança aos cidadãos. Uma reforma tão importante trará consequências para vários anos, pelo que o CESP deseja que sejam o mais positivas possível. As negociações estão a decorrer e pede-se ao Governo que analise convenientemente as propostas apresentadas pela ASPP/PSP antes de tomar decisões que podem comprometer o futuro da Instituição e a própria qualidade da segurança dos cidadãos.

Mas o que está em causa neste processo de reforma das carreiras na PSP?
Estas propostas da ASPP/PSP não se limitam a reivindicações socioprofissionais, mas são, sobretudo, o reflexo da vontade de melhorar a qualidade do serviço público que é prestado. A sociedade Portuguesa reclama legitimamente uma polícia de qualidade e para consegui-la as mudanças devem oferecer perspectivas de carreira aliciantes para os polícias já em serviço e para aqueles que querem entrar. Só é possível cativar pessoas de qualidade para ingressar na PSP se existirem determinadas garantias ao nível remuneratório e perspectivas de carreira. Temos simplesmente de tornar a profissão atractiva.

Num momento de crise generalizada, com o desemprego a subir e os problemas sociais a aumentarem, como vê a capacidade negocial das forças de segurança relativamente a vencimentos, condições de trabalho e progressão na carreira? São melhores do que em momentos de "normalidade"?
Efectivamente, temos uma crise que toca o mundo inteiro, seria portanto um mau cálculo fazer uma reforma baseada numa política economicista que pode momentaneamente reduzir a despesa, mas que sairá extremamente cara no futuro, não só ao nível financeiro mas também social, pois traria um desfasamento ainda maior em relação às necessidades da polícia no futuro. Governar também é prever e a responsabilidade do Governo é de construir a polícia de amanhã.

Na sua opinião, quais são os fenómenos criminais mais preocupantes que afectam a Europa actualmente?
O mais visível e de maior sensibilidade é o aumento da violência ao nível das agressões físicas. Tem um forte impacto na sociedade, mas existe uma outra forma de delinquência, menos visível, que comporta tudo o que diz respeito à economia subterrânea que é o fruto, na maior parte das vezes, da corrupção e do crime organizado e que mina a economia das democracias. Este foi um tema importante que foi desenvolvido no 2º congresso de criminologia organizado pela ASFIC/PJ, no qual fui convidado a participar. Em Portugal constatou-se, em 2008, um aumento de 10% da criminalidade violenta, e este aumento preocupa particularmente o CESP e as duas organizações portuguesas a ASPP/PSP e a ASFIC/PJ. É urgente encontrar respostas para este problema.

As polícias europeias já aprenderam a trabalhar numa Europa sem fronteiras? Isto é, a cooperação entre os diferentes países funciona de forma eficaz ou apenas residual? Isto porque surgem notícias várias de grupos criminosos que atravessam vários países e que em todos eles conseguem 'trabalhar' repetindo os comportamentos de sempre, já conhecidos?
É necessário uma vontade política europeia para harmonizar e desenvolver as Leis como forma de podermos desencadear uma perseguição dos criminosos ao nível policial. Apesar de as fronteiras não existirem, para o trabalho da polícia elas continuam a existir. É uma tarefa que não é fácil, mas sem real vontade política nunca chegaremos a construir uma verdadeira polícia europeia. A realidade técnica é complexa, mas enquanto o poder político não se debruçar nesta matéria, jamais conseguiremos ultrapassar este obstáculo. A Justiça e a polícia são considerados pelos países europeus como domínios reservados e é difícil fazer evoluir esta mentalidade para avançarmos na construção de uma justiça e uma polícia europeia. Aceitaram-se ao nível da Europa certas normas no âmbito económico e industrial, mas nada foi definido ao nível da segurança. A Europa dos sindicatos de polícia constrói-se, no âmbito do CESP, há 20 anos, mas os membros do CESP ainda esperam que se construa uma verdadeira polícia europeia.

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