O devastador relatório de Elizabeth Warren ao Congresso dos EUA
Na terça-feira, um painel do Congresso encabeçado pela ex-professora de direito de Harvard Elizabeth Warren divulgou um relatório sobre a manipulação do Programa de alívio de activos perturbados (Troubled Assets Relief Program, TARP) feita pelo secretário do Tesouro Timothy Geithner. Warren foi nomeada em Novembro pelo líder da maioria do Senado, Harry Reid, para liderar os cinco membros do Painel de Supervisão do Congresso (COP). Desde o parágrafo inicial, o relatório Warren torna claro que o Congresso está frustrado com o chamado "Plano de resgate financeiro" de Geithner e não tem a mais pálida ideia do que ele está a tentar fazer. Aqui estão as primeira linhas da "Avaliação da estratégia do Tesouro: Seis meses de TARP":
"Com este relatório, o Painel de Supervisão do Congresso examina a estratégia actual do Tesouro e avalia o progresso alcançado até então. Este relatório volta a investigação do Painel para uma questão central levantada no primeiro relatório: O que é a estratégia do Tesouro?" É assombroso que o secretário do Tesouro já não tenha sido despedido.
Do relatório:
"Além de retirar os US$700 mil milhões concedidos ao Tesouro sob o Emergency Economic Stabilization Act (EESA), os esforços de estabilização económica têm dependido fortemente da utilização do balanço do Federal Reserve Board. Esta abordagem permitiu ao Tesouro alavancar fundos TARP bem além dos fundos cabimentados pelo Congresso. Dessa forma, enquanto o Tesouro gastou ou comprometeu US$590,4 mil milhões de fundos TARP, de acordo com estimativas do Painel, o Federal Reserve Board expandiu o seu balanço em mais de US$1,5 milhão de milhões em empréstimos e compras de títulos de empresas patrocinadas pelo governo (government-sponsored enterprise, GSE). O valor total de todos os gastos directos, empréstimos e garantias concedidos até à data em conjunto com os esforços de estabilidade financeira do governo federal (incluindo aqueles do Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) bem como os do Tesouro e do Federal Reserve Board agora excede os US$4 milhões de milhões".
Assim, enquanto o Congresso aprovou uns meros US$700 mil milhões em financiamento de emergência para o TARP, Geithner e Bernanke com habilidade contornaram a oposição pública a mais salvamentos e cavaram mais US$3,3 milhões de milhões através da porta dos fundos, via empréstimos e alavancagem em favor de papeis de hipotecas podres que nunca recuperarão o seu valor. Em acréscimo, o Fed fez um acordo com Tesouro de que, quando a crise financeira finalmente acalmar, o Tesouro assumirá as obrigações do Fed em relação às "facilidades de empréstimo", o qual significa que o contribuinte será então responsável por milhões de milhões de desconhecidos em investimentos fenecidos.
Do relatório:
"Para tratar um sistema financeiro perturbado, três política alternativas fundamentalmente diferentes são possíveis: liquidação, curadoria (receivership) ou subsidiação. Para colocar estas alternativas no contexto, o relatório avalia esforços históricos e contemporâneos para confrontar crises financeiras e o seu êxito relativo. O Painel concentrou-se sobre seis experiências históricas: (1) a Depressão estado-unidense da década de 1930; (2) a corrida bancária ao Continental Illinois, em 1984, e a sua subsequente tomada pelo governo; (3) a crises das caixas económicas do fim da década de 1980 e o estabelecimento da Resolution Trust Corporation; (4) a recapitalização do fundo de seguro bancário FDIC em 1991; (5) a crise financeira da Suécia no princípio da década de 1990; e (6) o que ficou conhecido como a "Década perdida" do Japão nos anos 1990. O relatório investiga as abordagens actualmente empregadas pela Islândia, Irlanda, Reino Unido e outros países europeus".
Esta declaração mostra que o comité do Congresso entende que o plano lunático de Geithner não tem precedente histórico e nenhuma perspectiva de êxito. O tortuoso Programa de Investimento Público-Privado (PPIP) de Geithner – o qual é concebido para remover activos tóxicos dos balanços dos bancos – é uma forma de contornar os métodos "consagrados" de consertar os sistema bancário. Na linguagem mais contida e diplomática, Warren está a dizer a Geithner que ela sabe que ele está a tramar algo desprezível.
Do relatório:
"A liquidação evita a incerteza e o compromisso ilimitado que acompanha a subsidiação. Ela pode restaurar a confiança do mercado na sobrevivência dos bancos e pode potencialmente acelerar a recuperação ao apresentar declarações decisivas e claras acerca da avaliação do governo das condições financeiras e das instituições".
O comité concorda com a vasta maioria de economistas respeitáveis, os quais pensam que os bancos deveriam ser tomados (liquidados) e os maus activos postos em leilão. Esta é a recomendação número um do comité.
O comité também explora os prós e os contras da concordata (conservatorship) (a qual implica uma reorganização na qual maus activos são removidos, administradores fracassados são substituídos e partes do negócio são alienados) e subsidiação do governo, a qual envolve injecções de capital ou a compra de activos perturbados. A subsidiação, contudo, traz o risco de distorcer o mercado (ao manter activos artificialmente altos) e criar uma drenagem constante sobre os recursos do governo. A subsidiação tende a criar bancos coxos que continuam a arrastar-se como repartições do Estado.
Liquidação, concordata e subsidiação do governo; estes são os três caminhos para consertar o sistema bancário. Não há quarto caminho. O plano de Geithner não é um plano de modo algum; é uma algaravia incoerente dignificada com uma sigla, PPIP. O secretário do Tesouro está a ser tão opaco quanto possível para ganhar tempo enquanto desvia milhões de milhões da receita pública para os seus amigos fraudadores nos grandes bancos através de injecções de capital e programas de lavagem de dinheiro que parecem excêntricos, como o PPIP.
Do relatório:
"A abordagem do Tesouro deixa de reconhecer a profundidade da baixa económica actual e o grau em que a baixa avaliação dos activos perturbados reflecte com precisão o seu valor. As acções empreendidas pelo Tesouro, pelo Federal Reserve Boar e pelo FDIC são sem precedentes. Mas se a crise económica for mais profunda do que o previsto, é possível que o Tesouro venha a precisar tomar acções muito diferentes a fim de restaurar a estabilidade financeira".
Isto é um ponto crucial. Os activos tóxicos não estão em vias de recuperar o seu valor porque o seu preço de mercado actual – 30 centavos por dólar para hipotecas apoiadas por títulos AAA – reflecte precisamente a magnitude do risco que suportam. O mercado está certo e Geithner está errado; é isto simplesmente. Muitos destes títulos são constituídos por empréstimos que foram emitidos para pessoas sem rendimento suficiente para efectuar os pagamentos. Estes "empréstimos da mentira" foram empacotados juntamente com bons empréstimos em títulos apoiados por hipotecas. Ninguém pode dizer com alguma certeza o que eles realmente valem. Naturalmente, há um prémio pela incerteza, o que é a razão porque os activos estão a valer uns meros 30 centavos por dólar. Isto não mudará não importa o quanto Geithner tenta impulsionar o mercado. O poço já foi envenenado.
Além disso, segundo o relatório Case-Schiller deste mês, os preços da habitação estão a cair ao ritmo mais rápido desde o seu pico em 2006. Isto significa que o mercado para mortgage-backed securities (MBS) continuará a afundar as perdas dos bancos continuarão a crescer. O FMI recentemente aumentou para US$4 milhões de milhões a sua estimativa de quanto papel tóxico apoiado por hipotecas os bancos têm nos seus haveres.
O sistema bancário está debaixo da água e precisa ser solucionado rapidamente antes que apareça outra crise tipo Lehman lançando a economia dentro de uma Depressão prolongada. Geithner é claramente o homem errado para a tarefa. O seu PPIP não é nada mais do que uma burla discreta de fundos públicos os quais utiliza confundindo regras e regras de orientação a fim de esconder o objectivo verdadeiro, o qual é comutar o lixo tóxico para dentro do balanço público enquanto recapitaliza instituições financeiras em bancarrota.
Assim, por que Geithner está a ser mantido no Tesouro quando o seu plano já está totalmente desacreditado e o seu único objectivo é salvar os bancos através de meios dissimulados?
Esta pergunta foi bem respondida pelo antigo economista chefe do FMI, Simon Johnson, num artigo publicado em The Atlantic Monthly:
"O crash pôs a nu muitas verdades desagradáveis acerca dos Estados Unidos. Uma das mais alarmantes... é que a indústria financeira efectivamente capturou o nosso governo – um estado de coisas que mais tipicamente descreve mercados emergentes e está no centro de muitas crises em mercados emergentes. Se a equipe do FMI pudesse falar livremente acerca dos EUA, ela nos diria o que nos diz de todos os países nesta situação; a recuperação fracassará a menos que rompamos a oligarquia financeira que está a bloquear a reforma essencial. E se quisermos impedir uma verdadeira depressão, já nos falta o tempo". ( The Atlantic Monthly, May 2009, by Simon Johnson)
Os bancos têm um controle total sobre o processo político. Muitos dos seus soldados de infantaria ocupam agora os mais elevados postos no governo. Pessoas como Elizabeth Warren estão preparadas para chamar a atenção para o golpe silencioso que se verificou e fazer o que é preciso para expurgar os agiotas do poder e restaurar um governo representativo. É uma tarefa formidável e o tempo urge.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
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