segunda-feira, abril 27, 2009

Mostrem o contrato

Marcy Kaptur, do Ohio, é a congressista democrata com mais tempo de exercício do cargo na história dos Estados Unidos. O seu distrito, que se estende ao longo da costa do lago Erie desde oeste de Cleveland até Toledo, enfrenta uma epidemia de execuções hipotecárias de casas e 11,5 por cento de desemprego. Essa região central, o Rust Belt, teve o seu coração dilacerado pelo Acordo de Livre Comércio da América do Norte, com fábricas fechadas e fazendas familiares a lutar pela sobrevivência. Kaptur liderou a luta no Congresso contra o NAFTA. Agora, ela está recomendar uma solução radical de execução hipotecária a partir do piso do Congresso dos EUA:
«Por isso digo ao povo americano, sejam ocupas nas vossas próprias casas. Não se vão embora.»
Ela critica o falhanço do resgate financeiro em proteger os proprietários que enfrentam a execução hipotecária. O seu conselho de “ocupar” explora inteligentemente um tecnicismo legal na crise hipotecária subprime. Estas hipotecas foram feitas, depois empacotadas em títulos de crédito e vendidas e revendidas repetidamente pelos mesmos bancos de Wall Street que estão agora a beneficiar do TARP (o Programa de Alívio de Activos Problemáticos). A execução hipotecária dos bancos sobre as famílias muito frequentemente não consegue localizar o contrato de hipoteca que vincula o proprietário ao mau empréstimo. «Mostrem o contrato», recomenda Kaptur àqueles que enfrentam os pedidos de execução hipotecária dos bancos.
«A posse é 90% da lei», disse-me a congressista Kaptur. «Portanto, fiquem na vossa propriedade. Obtenham representação legal adequada (…) [se] Wall Street não conseguir mostrar a escritura nem a auditoria da hipoteca… deveriam permanecer na vossa casa. É o vosso castelo. É mais que uma mera propriedade. (…) A maioria das pessoas nem sequer pensa em conseguir representação, porque obtêm um pedaço do papel do banco, e dizem “Ah, é o banco”, e tornam-se temerosas, em vez de dizer: “Este é um contrato legal. A hipoteca é um contrato. Eu sou uma das partes. Existe a outra parte. Quais são os meus direitos legais de acordo com a lei como proprietário?”.
«Se olhar para os maus papéis, se olhar para onde está o problema, 95 a 98% dos papéis passaram realmente para cinco instituições: JP Morgan Chase, Bank of America, Wachovia, Citigroup e HSBC. Têm este país preso pelo pescoço.»
Kaptur recomenda telefonar à Sociedade de Ajuda Legal local, à associação de advogados ou para o (888) 995-HOPE para obter assistência legal.
A árdua tarefa de desalojar fisicamente as pessoas e de arrestar os seus bens é em geral competência do xerife local. Kaptur condiciona o seu conselho de ocupação, dizendo: «Se é um despejo do xerife, se chegou a esse ponto, isso [permanecer em casa] é quase impossível». A menos que o xerife se recuse a levar a cabo o despejo, como decidiu o xerife Warren Evans do Condado de Wayne no Michigan. O condado de Wayne, que inclui Detroit, teve mais de 46.000 execuções hipotecárias nos últimos dois anos.
Depois de analisar o TARP, o xerife Evans determinou que as execuções hipotecárias de casas contradiriam o objectivo do TARP de reduzir as execuções hipotecárias, e que estaria a violar a lei ao negar aos proprietários com ordem de despejo a hipótese de assistência federal potencial. «Não posso de consciência limpa permitir que mais uma família seja posta fora da sua casa até estar convencido de que lhe foram concedidas todas as opções a que tem direito pela lei para evitar a execução hipotecária», disse.
Bruce Marks, da Empresa de Assistência ao Vizinho da América (NACA), com sede em Boston, está a levar a batalha a casa dos directores executivos dos bancos. Em Outubro último, enquanto o resgate TARP estava a tomar forma para beneficiar Wall Street e não o cidadão comum, a NACA bloqueou a entrada do gigante hipotecário Fannie Mae até conseguir uma reunião com os seus executivos. Agora a NACA está a trabalhar com a Fannie Mae para reestruturar as hipotecas. Marks está a organizar uma “Volta de Predadores” de três dias em todo o país, indo às casas dos directores executivos para exigir reuniões com eles. Disse-me: «Isto é o que vamos fazer com milhares de proprietários de casas, ir às suas casas [dos directores executivos] e dizer: “Quero que conheça a minha família. Quero que veja quem está a despejar” (…) Se nos vão tirar as nossas casas, nós iremos às casas deles e vamos dizer-lhes “Já chega”».
Antes da tomada de posse, Larry Summers, o director do Conselho Económico Nacional do presidente Barack Obama, prometeu aos líderes democratas do Congresso «implementar políticas inteligentes e agressivas para reduzir o número de execuções hipotecárias evitáveis, através da ajuda à redução de pagamentos hipotecários aos proprietários com problemas económicos mas responsáveis, além de também reformar as nossas leis de falência e fortalecer as iniciativas relativas à habitação existentes».
De acordo com um relatório de RealtyTrac, «Foram registados 2,3 milhões de pedidos de execuções hipotecárias sobre propriedades estadunidenses em 2008, um aumento de 81% relativamente a 2007 e mais de 225% relativamente a 2006». À medida que a crise financeira se aprofunda, as pessoas que enfrentam execuções hipotecárias deveriam seguir o conselho de Kaptur e dizer aos seus banqueiros: “Mostrem o contrato”.
http://infoalternativa.org/spip.php?article813

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