55% justificam os sequestros e 64% são contra as acções judiciais
No passado dia 28, o canal francês TV5 transmitiu um interessante debate intitulado “Patrões sequestrados: até quando?”. Em discussão, não apenas o sequestro de patrões e administradores, mas de uma forma geral as acções cada vez mais destemidas da parte dos trabalhadores franceses em resposta aos efeitos da crise, particularmente os despedimentos.
Não foram tanto as declarações feitas que deram interesse ao debate – mas sim o que, entre as diferentes posições expressas, veio ao de cima. Os jornalistas, comentadores, dirigentes sindicais, sociólogos presentes não puderam evitar de reconhecer que se assiste a um recrudescimento da luta de classes: “A luta de classes ganhou novo fôlego”, disse-se concretamente. Diante dos efeitos da crise, “há hoje uma verdadeira cólera” entre os franceses, houve quem reconhecesse.
Naturalmente, choveram as condenações às acções de sequestro. Os representantes da central sindical CGT fizeram questão de afirmar que “não as encorajavam”. Os homens da direita fizeram notar que a lei deverá ser respeitada e que “não se deve premiar o delito” senão será “o caos”. Foi lembrada a declaração formal de Sarkozy em 7 de Abril (repetida pelo primeiro ministro Fillon) de que fará respeitar “a lei da República”. Não faltou sequer o habitual apontar de dedo a “uma minoria radical”, à “extrema-esquerda” que seria responsável pelos “excessos” da massa, tida por naturalmente ordeira – tanto nas universidades como nas empresas.
Mas tudo isto foi dito de uma forma estranhamente moderada. Não em tom de ameaça, mas quase de apelo ao bom senso. Isto é, na defensiva!
A razão de ser desta postura branda percebeu-se quando foram revelados os resultados de uma sondagem recente (10 e 11 de Abril) acerca de como está a reagir a opinião pública aos acontecimentos. Com efeito, 55% dos franceses justificam não só os sequestros, como os cortes e bloqueios de estradas quem têm vindo a generalizar-se. Mais: 64% acham que não devem ser levantados processos judiciais aos trabalhadores que pratiquem sequestros ou cortes de estradas.
E mais ainda: os números desta sondagem não só confirmam o que sondagens semelhantes tinham apurado a partir de Março, como mostram uma crescente posição favorável aos sequestros – o que revela uma opinião consolidada e não de circunstância.
Na verdade, numa sondagem feita a 1 e 2 de Abril para o jornal Le Parisien 45% dos inquiridos achavam os sequestros “aceitáveis” e 50% eram de opinião contrária. Num outro inquérito feito a 2 e 3 de Abril para a revista Paris Match 30% dos franceses “aprovavam” os sequestros, 63% “compreendiam-nos mas não os aprovavam” e apenas 7 % os “condenavam”.
Quer dizer, a maioria dos franceses mostra-se favorável aos métodos de luta postos em prática, independentemente de serem legais ou ilegais! É este peso da opinião pública – que ainda há poucos meses não era igual – que torna cautelosos os homens do poder e faz, para já, das ameaças de Sarkozy letra morta.
Este pendor da opinião pública tem raiz num temor generalizado pela perda do emprego e pela degradação das condições de vida. Dados da mesma sondagem mostram que mais de dois terços dos franceses receiam não voltar a encontrar trabalho se forem despedidos. Por outro lado, as evidências falam por si: em duas horas de sequestro resolvem-se questões negociais que se arrastavam há semanas ou meses. “É a única maneira de os trabalhadores se fazerem ouvir” – reconhecia um dos participantes do debate. Ou seja, é a eficácia das acções que leva a maioria dos franceses a apoiá-las – por ver nelas o meio prático de levar por diante os seus direitos – e não o julgamento acerca da legalidade ou ilegalidade das iniciativas.
Marx dizia numa passagem de O Capital que, segundo as regras do capitalismo, o capitalista tem o direito de reduzir ao mínimo que puder o preço que paga pela força de trabalho do operário; e que o operário tem o direito inverso de obter o máximo que puder do capitalista. E acrescentava que estes direitos iguais só podiam ser dirimidos por um processo: a luta de classes. Eis pois a luta de classes!
http://www.jornalmudardevida.net/?p=1562
Sem comentários:
Enviar um comentário