[*Escrito em Março deste ano, considero que conserva toda a frescura... ]
A política portuguesa parece-se cada vez mais com um bordel em que a patroa (o grande capital, principalmente estrangeiro) põe e dispõe, jogando com as misérias e ódios vesgos de cada uma das meretrizes em relação às suas colegas.Vem isto a propósito da aproximação de mais um ciclo de eleições, num país «agitado» por declarações de pacotilha dos políticos de todas as cores, destinadas e atrair os que conservam uma falsa esperança, dos que gostam de ser enganados. Refiro-me àqueles que depositam esperança nas urnas, como se o desenlace desta continuada e vil tristeza estivesse nuns mágicos quadradinhos de papel, com as não menos mágicas cruzinhas.
Para que se perceba a inanidade deste «raciocínio», basta atentar no seguinte:
O PS de Pinto de Sousa vai arrecadar um número significativo de votos, o suficiente para ser o partido mais votado. O partido que – dentro deste sistema – é convidado a formar governo. Seja qual for a modalidade, teremos uma continuidade de políticas de submissão aos ditames dos grandes grupos.
Mais, esta continuidade será assegurada pelo PS. Teremos de certeza um governo PS: quer sozinho, com renovada maioria absoluta, quer em coligação com outra ou outras forças políticas, muito provavelmente forças à sua «direita», mas que também podem ser à sua «esquerda», o que não muda nada de substancial.
Aqueles que têm a ilusão duma política «anti-capitalista» que não seja simultaneamente e francamente anti-autoritária, que percam as suas ilusões, pois o PCP ou o BE sempre se posicionaram ao longo dos 4 anos de governação PS como rivais entre si, pela hegemonia dos trabalhadores e como «líderes» da oposição parlamentar de esquerda, nunca como uma opção alternativa de governo.
Para que isso tivesse a mínima credibilidade, eles teriam de se aproximar e fazer as pazes entre as várias facções do «comunismo» autoritário (as inúmeras facções do marxismo leninismo, desde os nostálgicos do estalinismo puro e duro, do maoismo, do guevarismo/castrismo, do trotsquismo de diversas obediências, até aos diversos marxismos ditos revisionistas). O que se viu pelas bandas quer do PCP, quer do BE, foi o oposto, um acirrar de rivalidades, numa estratégia pseudo-popular, mas na realidade, sectária no mais puro estilo «PREC» de há 30 ou mais anos atrás.Tudo somado, eles contentam-se em ser forças «de oposição» institucional, manobrando sindicatos, com um ou outro lugar no aparelho de estado central, nas autarquias, etc., mas sem a responsabilidade total do poder político.
Eles sabem perfeitamente que não seriam autorizados a exercer uma parte do poder, sem terem de ceder em muitos aspectos da sua ideologia caduca. Teriam de se converter completamente em «esquerda neo-liberal», como voz «crítica» dum PS que detém a medalha da submissão ao grande capital, já sem laivos sequer de socialismo ou de social-democracia.
A pequenez da política lusa acima resumida demonstra cabalmente a minha tese de que existe um país neo-colonial, com uma ou várias potências europeias (antes o Império Britânico, hoje o neo-império da UE, sob tutela dos USA).Perante isto, que é uma evidência, que têm a dizer os senhores e senhoras que se arvoram em «analistas» e «fazedores de opinião»? Nada; continuam a assobiar para o lado, pois eles sabem que há verdades inconvenientes; nem que seja para «negar» os meus argumentos, preferem estar calados, pois seria muito complicado sair fora das «regras» do jogo.
Regras não ditas, mas por todos/as bem compreendidas. Regra nº1: Vale falar do acessório, nunca do essencial. Pois o essencial implica a denúncia dos seus verdadeiros patrões e eles/elas não querem desagradar aos mesmos, têm destes o sustento, o tacho e a promessa de participar no rega-bofe… à custa dos mesmos de sempre, dos excluídos, dos espoliados, do «bom povo» que serve para ir, «cheio de fé», votar nas próximas eleições.É assim que se mantém a choldra, a chusma, bem-educada, polida, sem nada que a distinga da intelectualidade de Paris, Roma, Londres ou Nova Iorque… mais outro aspecto típico das burguesias dos países neo-coloniais.
Mas, infelizmente, quem não tem nada a ganhar com este jogo ainda continua a deixar-se embalar pela ilusão de que algo de novo possa surgir em resultado do circo eleitoral.
Não há salvação dentro do regime, nem sequer remendo, porque o regime está podre. Não tem salvação ou remendo, porque o próprio regime impede a transformação necessária. Não há transformação possível sem uma mudança de mentalidades e esse primeiro passo deveria partir das «elites».
Mas o que são as elites neste país? Serão verdadeiras elites ou apenas uma casta parasitária que pavoneia as suas vacuidades como se fosse pensamento?Num país sugado até ao tutano por mais de dois séculos de domínio neo-colonial, não existe burguesia empreendedora, apenas estado-dependente, apenas parasitária!
Neste país neo-colonizado não existe tão pouco classe trabalhadora autónoma, independente, produzindo o seu discurso, com os seus contra-poderes próprios; temos antes uma classe trabalhadora escravizada por obra e graça do reformismo, quer ele se exprima em partidos ditos «operários» ou em centrais sindicais completamente vendidas, porém arvorando os símbolos e aparências da luta de classe, para melhor entregar os trabalhadores, de pés e mãos atados, aos patrões e ao governo.
Não podemos esquecer que os sindicatos em Portugal se comportam como uma espécie de guarda avançada dos partidos que os manobram.Um país neo-colonial que se afoga no marasmo porque não quer reconhecer os seus enganos profundos, porque prefere continuar a viver na «doce ilusão», em vez de construir a sua própria sociedade civil independente, autónoma dos partidos e do estado.
Não existe cultura nem vida democrática; tudo é absorvido pelo espectáculo do «desporto rei».O futebol é o local geométrico onde se cruzam todos os discursos, todas as intrigas de poder, o imaginário colectivo de um povo suspenso na bota do jogador super-heroí que vem «resgatar» a «honra» de um povo… O super-homem que o vai fazer vibrar, vivendo, nas glórias e desventuras do seu herói futebolístico do momento, a pseudo-afirmação de uma identidade «nacional», há muito alienada, de qualquer maneira.
Basta ver a subserviência caricata dos portugueses a tudo o que seja estrangeiro, para se compreender que eles estão totalmente descrentes da sua identidade ou só a afirmam como servos dos «poderosos», muito orgulhosos de serem considerados um «povo gentil, afável, hospitaleiro». Basta-lhes viver na apagada e vil mediocridade. Portugal, como local de férias barato, para a classe trabalhadora dos países mais ricos do continente europeu. Tudo isto configura o complexo neo-colonial deste povo.Apenas a sua tomada de consciência poderia ser ponto de partida para sacudir o jugo bissecular da opressão, mas isso não pode ser realizado desde o cimo por uma «elite» ilustrada, que não existe.
Há apenas uma «burguesia compradora», ou seja, que aproveita as migalhas da exploração deste povo, exploração essa que continua a beneficiar os de sempre: grandes consórcios capitalistas internacionais, grandes potências que se servem de Portugal como de um súbdito (veja-se o caso dos Açores e de todas as bases e interesses da NATO).Portugal efectivamente pertence aos se aproveitam das pescas, da agricultura, dos minerais e de todas as actividades produtivas para fazerem chorudos negócios.
Quando já nada restar das riquezas naturais deste país, ainda haverá para explorar um povo semi-analfabeto, o eterno emigrante, capaz de trabalhar sem pedir muito, para voltar um dia à sua aldeia ou vila, para aí viver a sua reforma como um fidalgo, não lhe interessando o que aprendeu na estranja…Não existe, decerto, qualquer solução colectiva dentro deste regime.
Apenas com a destruição completa, total e irreversível do sistema de exploração capitalista, poderemos viver como um povo, entre os restantes povos, fraterno e capaz de viver por si, amando sua história e seu território, mas de um amor não possessivo, não egoísta. Como o amor de uma mãe orgulhosa por ver seus filhos e filhas capazes de perpetuar a sua memória, capazes de continuar e enriquecer uma cultura milenar em todos os domínios, das artes às ciências, da produção material à produção espiritual.Temos portanto de ter um enorme desejo de realização dessa pátria utópica mas alcançável, de uma pátria realmente de todos. Isso só pode ser possível na ausência de capitalismo, experimentando formas colectivas de gestão (autogestão) generalizadas a todas as áreas da produção e da sociedade.Sem esta perspectiva, não existe política de libertação, de emancipação, de autonomia e de poder democrático da classe trabalhadora.
Espero que critiquem muito este escrito, pois a discussão é necessária e eu não estou fechado a ouvir e ler vossos contra-argumentos.
Estou profundamente convencido da veracidade do quadro que pintei acima e também tenho real esperança nos caminhos que aponto.
Mas sei que as soluções aos graves problemas referidos são necessariamente colectivas e, por isso mesmo, anseio ler as vossas opiniões.
Solidariedade,
Manuel Baptista
http://www.luta-social.org/
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