Existem indícios suficientes sobre os dinheiros dos cofres públicos serem malbaratados há largo tempo, pelas equipas de turno que têm vindo a «gerir» a Portugalândia.
A «política» nesta terra, resume-se a alguns maduros pretenderem mostrar que - eles sim - seriam os impecáveis e incorruptíveis gestores da coisa pública, denunciando as traficâncias dos que estão no poder. Assim, logo que estejam no poder, poderão retomar a roubalheira, fazendo beneficiar filhos e afilhados.
A única sanção grave para os prevaricadores, mesmo os menos astutos, é serem preteridos nas listas eleitorais no ciclo seguinte eleitoral, pelo chefe do seu respectivo partido. Portanto, irão encher os bolsos, encher o bandulho até rebentar, não vá a coisa descambar para eles, não podendo continuar a comer do tacho na próxima legislatura.
Este despilfarro passa-se a todos os níveis do Estado, quer ao nível central, quer ao nível das autarquias, tanto nas mais altas figuras do Estado e suas cortes respectivas, como também ao nível do «director-geral» e abaixo.
Um curioso estudo, surgido há poucas semanas, indicava que o Estado português poderia fornecer serviços (de saúde, educação, segurança social, etc.) com a qualidade de uma Finlândia, se não fosse a enorme onda de corrupção que o atinge.
Evidentemente, tal estudo evita explicar o que causa a corrupção: a sequela de algo bem mais profundo e que não tem a ver, nem com um «défice moral» intrínseco ao povo português, nem - muito menos- com qualquer herança genética.
A continuada decadência do Estado, das instituições e também das classes que o suportam e dele se aproveitam tem uma explicação lógica claríssima.
Este país foi um vastíssimo império desde há dois séculos transformado em neocolónia com o assentimento e participação das sucessivas gerações da classe dominante (alta aristocracia, burguesia industrial, burguesia financeira...), primeiro pelo império britânico, sobretudo desde o século XIX até meados do século XX. A partir do século XX, não são várias as potências neocolonizadoras, já não apenas Grã-Bretanha como outras grandes potências europeias continentais e os EUA.
Quanto à UE, é notório o papel de potência colonizadora desde 86:
- destruição dos recursos alimentares autóctones (agricultura e pescas)
- destruição da indústria tradicional, virada para satisfazer o mercado interno
- criação de uma indústria de tipo «maquiladora» para servir as multinacionais.
- enfraquecimento da população autóctone, negando-lhe bens de saúde essenciais, apesar de uma das mais altas taxas de impostos e de descontos para a segurança social, se comparadas com o PIB per capita, da Europa e do mundo.
- manutenção do todo um sistema clientelar que faz obstáculo permanente a quaisquer decisões bem-intencionadas.
- manutenção de um estado de ignorância com a massificação do «espectáculo rei», destronando quaisquer preocupações sérias, melhor, sendo o escape obrigatório para as gentes não se angustiarem com as coisas sérias, deixadas para os «senhores que sabem»!
... E a lista poderia continuar por muitos e muitos itens.
Face a este estado de coisas, tanto à esquerda como à direita, em todo o espectro político, a única e exclusiva preocupação é «agarrar» o eleitor, fazendo uma campanha destinada a «fazer passar a mensagem» de que «se votares no partido X, terás de certeza isto e isto e mais aquilo».
Um exemplo típico disso vem no programa eleitoral do PS, partido socratoíde, ao decretar que haverá uma chuva de benefícios, desde um subsídio universal de nascimento (200 €, uma fortuna!), apenas resgatável quando a criança perfizer 18 anos (paciência se tiver o azar de morrer antes!), passando pelo reforço das ajudas às famílias monoparentais (sobretudo, muitas divorciadas ou separadas com filhos menores) até à generalização das bolsas de estudo para o ensino secundário.
Tudo promessas sem qualquer consistência, pois implicariam, a serem seriamente aplicadas e abrangendo a totalidade dos grupos considerados, uma subida enorme das despesas do Estado com a Segurança Social, para as quais não haveria obviamente contrapartida de receitas.
O «macaco de rabo pelado» Alberto João Jardim disse, com ironia, que eles deviam aplicar já essas medidas, pois nada os impedia de o fazer. Com efeito, sendo eles a maioria absoluta, poderiam ter - há largo tempo - obtido a fácil aprovação, no parlamento, de tais medidas.
Ao atirarem com todas estas medidas em campanha eleitoral, como bôdo aos pobres e à classe média, estão simplesmente a desprezar o povo português, a desconsiderá-lo, estão a tomá-lo por colectiva e generalizadamente estúpido!
Porém, à direita do PS, aquilo que vem ao de cima, é mais o reflexo do marasmo que reina no maior partido da direita/direita, o PSD. Não existe uma única ideia-força sobre a governação, não se descortinam que propostas, muito inteligentes e originais, irão produzir no seu programa eleitoral de governo.
De qualquer maneira, os políticos sabem que os programas eleitorais - e mesmo os programas de governo- são para rasgar e lançar no cesto dos papéis, à primeira ocasião, assim que for conveniente para a governação, para se manterem no poder.
À esquerda do PS, as coisas também não parecem minimamente encaminhadas, pois tanto a CDU como o BE, globalmente, propõem mais do mesmo: ou seja, a mesma política reformista, o mesmo estilo de «partidos de protesto», o mesmo uso das autarquias captadas para o respectivo partido, para fazerem - em pequena escala - o que os outros fazem à escala do país inteiro.
Mas, sobretudo, nunca por nunca, se irão entender num programa comum, preferindo a querela ao nível dos sindicatos, das autarquias e, por vezes, em frente dos holofotes da comunicação social. Para manterem as bases bem separadas, brindam-se periódica e reciprocamente com diversos epítetos, mimos esses destinados a mostrar quem detém a hegemonia na classe trabalhadora!
Confrangedor... pois eles são também integralmente responsáveis pelo facto da classe no poder ter as mãos livres para fazer o que muito bem quer e entende, neste «cantinho à beira mar plantado», para ir lixando a classe trabalhadora.
Uma oposição de esquerda reformista a sério, seria benéfica, embora só no curto prazo, para os trabalhadores. Não se traduzia na mudança estrutural do regime, mas apenas numa evolução em sentido menos desfavorável.
Infelizmente, para fazer uma política reformista a sério é preciso mais do que boas intenções. Mas nem o PCP, nem o BE, sequer isso têm!!
Com efeito, objectivamente, ambos mostram uma grande falta de vontade. Porque, apenas em coligação, poderiam ser um desafio capaz de mudar algo, capaz de se submeter à prova da governação, pelo menos, em municípios onde a sua aliança tivesse maioria!
Mas disso, fogem eles como «diabo da cruz», revelando assim as suas verdadeiras intenções: bem podem os militantes de base destes partidos sonhar com uma frente social (e não apenas eleitoral!), os aparelhos respectivos continuam o braço-de-ferro para quem detém a primazia de vanguarda iluminada da classe trabalhadora!
Isto seria cómico, se não fosse trágico: é que a maior central sindical (CGTP) é arrastada - há anos- para uma política inconsequente, de grande fogo-de-vista, mas com uma acção no terreno, ou completamente ausente (onde estão os militantes sindicais nos momentos em que é preciso?) ou (ainda pior) em que organiza a capitulação face ao patronato e ao estado, em vez de organizar a luta, a resistência e a capacidade reivindicativa, em vez -em suma- de acumular forças para um combate de classe.
Temos, portanto, os dados lançados: o país vai continuar a afundar-se, a tornar-se mais dependente, mais clientelar, mais corrupto (tudo consequências e não causas) por mais uns bons anos, com colaboração activa de toda a casta política - ou seja: os que detêm responsabilidades no aparelho de Estado (cargos eleitos ou de nomeação política) e ainda os que detêm cargos directivos nos aparelhos partidários.
Por detrás deles, sempre a controlá-los, encontra-se uma outra casta, que mexe os cordelinhos do dinheiro e não está disposta a gastar em vão o seu pecúlio. Os grandes empresários industriais, os donos e gestores da finança (banca, sociedades financeiras diversas, seguradoras...), os capitalistas estrangeiros, com interesses ou com vistas nos despojos desta terra.
Ambas as castas, a política e a dos negócios, contam com a colaboração prestimosa da UE, da NATO, da OCDE, cada qual possuíndo uma caterva de «técnicos», sempre prontos a parir um parecer jutificando tais ou tais medidas, de cunho neoliberal!!!
Alternativas?
- Sim, existem, partem do princípio que temos de nos unir na base, não em torno de ideologias, mas em torno da resolução dos problemas concretos. Surgirão soluções, necessariamente, quando as pessoas deixarem de ter medo e constituírem assembleias, auto-convocadas, realmente de democracia participativa, ou seja, assembleias onde as pessoas se regem por uma lógica de base, sem representantes, mas com mandatos sempre definidos e controlados, com possibilidade de serem retirados a qualquer momento.
Manuel Baptista
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