O Estado e o governo democrático
Existe, em todas as sociedades, pelo simples facto de haver sociedade, uma coisa positiva, real, a que é permitido chamar Estado. Consistiu, essa coisa: 1.º, numa certa força, essencial ao grupo, a que chamamos forca de colectividade; 2.º, na solidariedade que esta força cria entre os membros do corpo social; 3.º, nas propriedades e em outras vantagens comuns que a representam e que dela resultam. Eis o que é o Estado, metade força ou poder, metade propriedade, coisa aliás completamente objectiva, como a própria matéria...
Mas a autoridade, princípio subjectivo, não é absolutamente nada disto. É o meio de que se serve um indivíduo, uma associação ou uma casta, para dispor à sua vontade para um fim só dele conhecido, e sem garantia nem responsabilidade da sua parte-da força pública, dos interesses gerais; isto é, do próprio Estado, e até certo ponto das fortunas e propriedades particulares, tudo isto em virtude dum direito que se pretende divino ou de conquista, da superioridade de raça, ou mesmo duma procuração do povo. Este princípio de autoridade, que foi até aqui o verdadeiro apanágio, não do Estado, mas do pessoal governamental, negamo-lo e repelimo-lo como incompatível com a dignidade do homem e do cidadão, incompatível com a Justiça, incompatível com a própria noção de Estado.
O Estado, com efeito, resulta da força colectiva de um pais, forca produzida pela relação, não de hierarquia ou de subordinação, mas de comutação que existe entre os cidadãos, de modo que, afirmar o Estado, isto é, a força pública, a coisa pública, rem publicam, é, no fundo, negar a autoridade, e reciprocamente... (Justice, L'État.)
O direito moderno, implantando-se na voz do direito antigo fez uma nova coisa: colocou em presença uma da outra, na mesma linha, duas forças que até então tinham estado numa relação de subordinação; essas duas forças são o Estado e o indivíduo; noutros termos, o governo e a liberdade.
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