sábado, novembro 21, 2009

O NEGRO E O VERMELHO

AS SUAS TRÊS CARACTERISTICAS

A. O seu foco: Justiça e imanência moral

Terá esta força de Justiça o seu foco em qualquer parte dentro do homem ou fora do homem?
Aqui dividem-se de novo as opiniões ...

a) Justiça, lei inerente a toda a natureza

Qualquer que seja a Justiça, e seja qual for o nome que lhe chamem, a necessidade de um princípio que aja sobre a vontade, como uma força, e a determine no sentido do direito ou da reciprocidade dos interesses, independentemente de toda a consideração de egoísmo, esta necessidade é incontestável. Constatar a realidade da Justiça... é hoje inteiramente ética. Ora há duas maneiros de conceber a realidade da Justiça:
- Ou como uma pressão do exterior, exercida sobre o eu;
- Ou então como uma faculdade do eu, que, sem sair do seu foro intimo, sentiria a sua dignidade na pessoa do próximo com a mesma vivacidade que sente na sua própria pessoa, e julgar-se-ia assim, esmo conservando a sua individualidade, idêntico dequado ao próprio ser colectivo.
No primeiro caso, a Justiça é exterior e superior ao indivíduo, quer ela resida na colectividade social, considerada como ser sui generis, euja dignidade ultrapassa a de todos os membros que a compõem - o que encaixa na teoria comunista - ; quer se coloque a Justiça mais alto ainda, no ser transcendente e absoluto, que anima, inspira a sociedade, e a que se chama Deus.
No segundo caso, a Justiça é íntima ao indivíduo, homogénea à sua dignidade, igual a esta mesma dignidade, multiplicada pela soma das relações que supõe a vida social.

b) Justiça, força moral comum ao homem e à sociedade

Dêmos uma ideia dos dois sistemas.
Sistema da Revelação:
O primeiro destes sistemas e o mais antigo em data, aquele que faz aderir a si a massa das populações do globo, ainda que perca, cada dia, terreno nas nações civilizadas, é o sistema da transcendência vulgarmente, da revelação.
Todas as religiões e quase-religiões têm por objectivo inculcá-lo: o Cristianismo, desde Constantino, tem sido o principal órgão. Aos teólogos, ou teodiceianos, é preciso juntar a multidão dos reformados que, mesmo separando-se da Igreja e do próprio Teísmo, permanecem fiéis ao princípio de subordinação externa, pondo no lugar de Deus a Sociedade, a Humanidade, ou qualquer outra Soberania, mais ou menos visível e respeitável... Quanto aos filósofos que negam todas as espécies, de revelação - ou que não têm estas em conta, tais como Saint-Lambert, d'Holbach, Bentham, Hobbes, Hegel, e os panteístas modernos - esses caem, sob o nome de Lei Natural, uns, no comunismo e no despotismo; os outros, no egoísmo, no utilitarismo, no organicismo, e no fatalismo; quer dizer: eles negam, com a liberdade, a Justiça...
Sistema da Revolução:
O outro sistema, radicalmente oposto ao primeiro, a que a revolução teve por objectivo assegurar o triunfo, é o da imanência, ou do facto de a Justiça estar inata na consciência. Segundo esta teoria, o homem, ainda que vindo duma completa selvajaria, produz incessantemente, pelo desenvolvimento espontâneo da sua natureza, a sociedade. Só por abstracção ele pode ser considerado no estado de isolamento e sem outra lei que não seja o egoísmo. A sua consciência não é dupla, como o ensinam os transcendentalistas; não revela, por um lado, animalidade, e pelo outro, Deus; ela só está polarizada.
Sem dúvida, antes da sua imersão na sociedade - ou, melhor dizendo, antes que a sociedade tenha começado a provir dele, pela descendência, pelo trabalho e pelas ideias - o homem, circunscrito no seu egoísmo, limitado à vida animal, nada sabe da lei moral... A experiência das coisas, necessária à produção da ideia não é menos necessária ao desenvolvimento da consciência... Mas... por mais que se produzam os factos da vida social e a inteligência deles apreenda a relação, esta relação nunca se traduzirá, para a vontade, numa lei obrigatória, se uma preformação... que faça notar ao indivíduo, nas relações sociais que o abarcam,... uma espécie de comando secreto dele próprio a ele próprio.
A ciência da Justiça e dos costumes... assenta, por um lado, numa faculdade especial... pelo outro, na experiência.
Parte integrante duma existência colectiva, o homem sente a sua dignidade, ao mesmo tempo, nele próprio e noutrem e alberga em si o princípio duma moralidade superior ao individual. Este princípio, não o recebe ele doutro lado; ele é-lhe íntimo, imanente. Constitui a sua essência, a essência da própria sociedade. É a forma própria da alma humana, forma que não faz senão tornar-se precisa e aperfeiçoar-se cada vez mais, pelas relações que em cada dia a vida social faz nascer...
A Justiça é humana, inteiramente humana, somente humana... ela não supõe nem exige a existência de Deus e a imortalidade das almas. Ela seria uma mentira se tivesse necessidade de semelhantes sustentáculos. Eis em que sentido preciso, livre de qualquer reminiscência teológica e supranaturalista, me sirvo da palavra imanência. A Justiça tem o seu foco na humanidade, ela é progressiva e infalível na humanidade, porque é da humanidade: tal é o meu pensamento, extraído, ele próprio, do mais profundo da consciência...

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