sábado, janeiro 02, 2010

Treta da semana: proibir casais.

A possibilidade de eliminar a lei que restringe o casamento a pessoas de sexo oposto deixa muita gente preocupada. Uns, talvez julgando que o casamento homossexual seja obrigatório, têm medo que lhes estrague o seu. Outros dizem que é um ataque às tradições, como se isso fosse mau, ou acusam o governo de dar privilégios a uma minoria. O José Policarpo, apesar de não se casar, diz que tais coisas «ferem gravemente a compreensão cristã do homem e da sociedade»(1). Seja lá o que isso for.

Isto são tretas porque não têm nada a ver com legislação. É legítimo não querer casar-se com alguém do mesmo sexo. Até partilho essa preferência. E se alguém achar que um casal homossexual fere gravemente uma compreensão qualquer, pois tem o direito à sua opinião. Mas nada disso justifica que a lei proíba casamentos em função do sexo dos nubentes. Do outro lado fala-se em discriminação e direitos dos homossexuais, o que não está errado – a lei como está é discriminatória e viola alguns direitos – mas também não é o mais importante. O problema fundamental aqui não é a homossexualidade nem o casamento. É o limite dos poderes que a nossa sociedade deve conceder aos legisladores.

Nós temos de eleger algumas pessoas para fazer as nossas leis. Não há outra forma prática de regular a sociedade. Mas não é sensato dar-lhes carta branca. São pessoas como nós, e não as queremos a meter-se nas nossas crenças, a ditar que companhias podemos ter ou o que pensamentos podemos exprimir. E entre as coisas que estão fora do âmbito legítimo da legislação estão o sexo e a orientação sexual. Até a Constituição o diz, no ponto 2 do artigo 13º:

«Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.»

A alteração à lei do casamento não é apenas uma questão de direitos dos homossexuais. Nem sequer é o casamento que importa. A questão de fundo é muito mais importante. Seja qual for a opinião da maioria, do governo ou do José Policarpo, não é legítimo que uns legislem sobre o sexo ou a orientação sexual dos outros. O que está em causa é o limite do poder que damos aos legisladores, e qualquer lei que tenha efeitos em função do sexo das pessoas é uma lei abusiva que devemos rejeitar.

1- Ecclesia,
Defesa do casamento é questão civilizacional

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