§ 3.1 - Determinação da terceira forma social
Conclusão
Portanto, nada de governo, economia política, administração possíveis com base na propriedade.
A comunidade procura a igualdade e a lei: a propriedade, nascida da autonomia da razão e do sentimento do mérito pessoal quer, sobre todas as coisas, a independência e a proporcionalidade.
Mas a comunidade, tomando a uniformidade por lei e o nivelamento pela igualdade, torna-se tirânica e injusta: a propriedade mostra-se dentro em pouco opressiva e instável, pelo seu despotismo e invasões.
O que a comunidade e a propriedade querem é bom: o que uma e outra produzem é mau. E porquê? porque ambas são exclusivas e desconhecem, cada uma por seu lado, dois elementos da sociedade. A comunidade rejeita a independência e a proporcionalidade; a propriedade não satisfaz a igualdade nem a lei.
Ora, se concebermos uma sociedade fundada nestes quatro princípios, igualdade, lei, independência, proporcionalidade, encontramos:
1.º - Que consistindo a igualdade apenas na Igualdade das condições, quer dizer dos meios, não na Igualdade de bem-estar, que deve ser a obra do trabalhador com meios iguais, não viola de nenhuma maneira a justiça e a equidade;
2.º - Que resultando a lei da ciência dos factos, apoiando-se por consequência na própria necessidade, nunca choca com a independência,
3.º - Que derivando a Independência respectiva dos indivíduos ou a autonomia da razão privada, da diferença de talentos e capacidades, pode existir sem perigo nos limites da lei;
4.º - Que não sendo a proporcionalidade admitida senão na esfera da inteligência e sentimento, não na das coisas físicas, pode ser observada sem violar a justiça ou a Igualdade social.
Esta terceira forma de sociedade, síntese da comunidade e da propriedade, chamá-la-emos de LIBERDADE (1).
Para determinar a liberdade não reunimos a comunidade e a propriedade sem discernimento, o que seria um eclectismo absurdo. Procuramos por um método analítico o que cada uma delas contém de verdadeiro, de conformidade com o voto da natureza e as leis da sociabilidade, eliminando o que contêm de elementos estranhos; e o resultado dá uma expressão adequada à forma natural da sociedade humana, numa palavra, a liberdade.
A liberdade é igualdade, porque a liberdade só existe no estado social e fora da igualdade não há sociedade.
A liberdade é anarquia porque não admite o governo da vontade mas só da autoridade da lei, quer dizer da necessidade.
A liberdade é variedade infinita porque respeita todas as vontades, nos limites da lei.
A liberdade é proporcionalidade porque deixa toda a latitude à ambição do rnérito e à emulação da glória.
Agora podemos dizer, como Cousin: «O nosso princípio é verdadeiro; é bom, é social; não receamos tirar dele todas as consequências.»
A sociabilidade no homem, tornando-se justiça por reflexão, equidade por engrenagem de capacidades, tendo por fórmula a liberdade é o verdadeiro fundamento da moral, o princípio e a regra de todas as nossas acções. É esse móbil universal que a filosofia procura, que a religião fortifica, que o egoísmo suplanta, que a pura razão nunca completa. O dever e o direito nascem em nós da necessidade, que é direito se se considerar em relação aos seres exteriores e dever em relação a nós próprios.
Comer e dormir são necessidades: é um direito procurarmos as coisas necessárias ao sono e à alimentação; é um dever usá-las quando a natureza o pede.
É uma necessidade trabalhar para viver: é um direito, é um dever.
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(1) Libertas, liberare, libratio. libra, liberdade, libertar, libertação, balança (livre), tudo expressões cuja etimologia parece comum. A liberdade é a balança dos direitos o deveres: Tornar um homem livre é nivelá-lo com os outros, quer dizer, pó-lo ao nível de todos.
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