O objectivo supremo do Estado é a liberdade, colectiva e individual.
Mas a liberdade não aparece do nada; não se chega lá de um salto: resulta, não somente da energia do sujeito, mas das condições mais ou menos felizes no meio das quais ele está colocado: ela é o termo de uma sequência de movimentos oscilatórios, de avanços e recuos, cujo conjunto compõe a evolução social e leva ao pacto federativo, à república.
Entre as influências cuja acção pode acelerar ou retardar a criação da liberdade, a mais elementar e a mais decisiva é a do solo e a do clima. É o solo que dá o primeiro molde à raça; são as influências reunidas da raça e do solo que formam de seguida o génio, suscitam e determinam as faculdades da arte, da legislação, da literatura, do engenho; são por último todas essas coisas em conjunto, que tornam mais ou menos fáceis as aglomerações. Daí os sistemas de instituições, de leis, de costumes; daí as tradições, tudo o que faz a vida, a individualidade e a moralidade dos povos. Sem dúvida, no meio dessas influências cujo ponto de partida é a fatalidade, a razão permanece livre; mas se a sua glória é a de se assenhorar do destino, o seu poder não vai ao ponto de o destruir; ela dirige o movimento, mas na condição de ter em conta a qualidade das forças e de lhe respeitar as leis.
Quando então a propósito da unidade italiana fiz apelo à geografia e à história, não era para fazer de certos acidentes do destino uma chicana; é um todo organizado, é a Itália em pessoa, no seu corpo, na sua alma, espírito, na sua vida, a Itália em toda a sua existência que eu tinha em vista, e que, criada, a meu ver, para a federação, como o pássaro para o ar e o peixe para a água, protestava no meu pensamento contra o projecto de a centralizar.
A Itália, quis eu dizer, é federal pela constituição do seu território; é¬ o pela diversidade dos seus habitantes; é¬o pelo seu génio; é¬o pelos seus costumes; é¬o ainda pela sua história; ela é federal em todo o seu ser e desde todo o sempre. Falais de nacionalidade: mas a nacionalidade na Itália, como na Suíça, é a mesma coisa que a federação; é pela federação que a nacionalidade italiana se coloca, se afirma, se certifica; pela federa¬ção a tornareis tão livre que ela formará Estados independentes; ao passo que com a unidade ireis precisamente criar para ela um fatalismo que a asfixiará.
Porquê então, uma vez mais, essa unidade fictícia, que não tem raízes senão na fantasia jacobina e na ambição piemontesa, e cujo primeiro e deplorável efeito foi o de acorrentar desde há quatro anos o pensamento dos Italianos a este problema insolúvel: Acordo da unidade política com a descentralização administrativa?
Pelo menos, o que a fisiologia geral dos Estados parecia dever proibir, as circunstâncias, por excepção, autorizá¬lo¬iam? Haveria para a Itália perigo de morte, questão de salvação pública? Aqui, a habilidade do par¬tido vai mostrar¬se à altura da sua filosofia.
Consideremos que a anulação da influência austríaca na Península de¬via levar a toda a Itália uma mudança de regime: os duques, o rei de Nápo¬les, mesmo o Papa, iam ser forçados a conceder aos seus povos constitui¬ções. A questão, para uma democracia inteligente, patriota, consistiria então em os dominar todos, fazendo convergir as reformas em direcção à liberdade geral. Não aconteceu assim. O Sr. de Cavour concebeu o projecto de confiscar o movimento em proveito da casa de Sabóia: no que foi perfeitamente servido pelos democratas unitários. A independência ainda não estava conquistada e já se pensava fazê¬ la pagar à Itália, imersa nos fundos baptismais piemonteses.
37) Ver sobre este tema Municipalismo e Unitarismo italianos, do Sr. BÉCHARD, bro¬chura de quarenta e cinco páginas, na qual o autor dá conta dos esforços tentados pelos jurisconsultos italianos para conciliar as liberdades municipais e provinciais, que todos eles defendem, com a centralização monárquica, cujo dogma adoptaram. Depois do que acaba de ser dito da constituição geográfica e etnográfica da Itália, e da exposição que fizemos do princípio federativo, o leitor dir¬se¬á que o problema com o qual se obstinam neste momento os legistas ultramontanos, é como o movi¬mento perpétuo, para não dizer pior. A Itália, dada a sua constituição geográfica e fisiológica, tende invencivelmente para as liberdades federais. A esta tendência imperiosa que ela possui do íntimo da sua natureza, e que para mais tem a vantagem hoje de estar na linha dos princípios e nos dados do futuro, substitui¬se artificial¬mente uma outra, inventada pelo espírito demagógico de acordo sobre este ponto com a ambição príncipesca, e cujo resultado deve ser a absorção de toda a liber¬dade. Ferrari dizia um dia no Parlamento de Turim: Quando toda a Itália se reunir para me afirmar que ela é unitária, eu responder¬lhe¬ei que ela se engana. – Ele tinha cem vezes razão.
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