Não tenho de me ocupar com os interesses dinásticos envolvidos ou comprometidos na expedição. Atacado por pretensos liberais, democratas e republicanos, é no ponto de vista da república, da democracia e da liberdade, que tenho de me defender. Digo portanto que a política a seguir era aquela que, afastando a absorção piemontesa, colocasse os príncipes, os reis e o Papado na mão dos liberais: era a política federalista. De um lado as pequenas monarquias italianas iam encontrar¬se entre dois perigos: perigo de absorção por uma delas, ou de subalternização a uma autoridade federal. Ao princípio da representação parlamentar e da separação dos poderes que iam resultar das novas constituições, se vós acrescentardes o de um laço federativo, que restaria do antigo absolutismo? Nada. Em contrapartida, a liberdade ganharia tudo o que iam perder as velhas soberanias, já que é precisamente o efeito da federação que a liberdade se desenvolva, para os cidadãos de cada Estado, em razão da garantia que lhes dá o pacto federal. O dever dos chefes da democracia, de Garibaldi e de Mazzini em primeiro lugar, era portanto oporem¬se às ideias do Sr. de Cavour, apoiando¬se se necessário no Imperador dos Franceses. Nada obrigaria a provocar desde logo a decadência das dinastias, que seria impossível afastar em massa, mas que teríamos dominado tanto pelas suas rivalidades como pelo novo direito.
Eis o que prescrevia, no começo de 1859, a sã política, de acordo com o interesse das massas e o senso comum. Uma vez desmascarados os projectos do Piemonte, a democracia teria tido como auxiliares, com Na¬poleão III que não poderia recusar, o rei de Nápoles, o Papa e os próprios duques, obrigados todos, para conservar as suas coroas, depois de terem assinado com os seus súbditos respectivos um novo pacto, a refugiarem¬se na confederação. Porquê Garibaldi, Mazzini, preferiram a esta conduta tão simples, tão segura, os ziguezagues da sua táctica unitária? Coisa estranha! Foram os homens que levaram a bandeira da democracia que tomaram a seu cargo e responsabilidade a grande obra monárquica; e são os príncipes, doravante absolutos, que invocam o direito e a liberdade. Foi assim que os revolucionários italiotas se tornaram monárquicos e os prín¬cipes federalistas.
Claro, se a vontade do povo italiano é dar¬se a Vítor¬Emanuel, ou, o que é o mesmo, constituir¬se em Estado unitário com presidente ou ditador, não tenho nada a objectar, e estou disposto a crer que, não obs¬tante Imperador e Papa, a Itália acabará por se dar ao passatempo. Mas que não se fale então mais de liberdade ou de república: a Itália, dizendo adeus à sua tradição federal, declara¬se ipso facto retrógrada. O seu princípio é doravante o mesmo que o dos velhos Césares, a menos que não seja o da monarquia burguesa, centralista e corruptora, onde a burocracia substitui a união das comunas, e o feudalismo financeiro a federação agrícola e industrial.
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