sexta-feira, setembro 24, 2010

ENTRE A MANIA DA POUPANÇA E A MANIA DAS GRANDEZAS

Quanto mais o capitalismo invoca a racionalidade, mais ele parece irracional. A concorrência pela sobrevivência nos mercados levou a uma política empresarial de corte de custos a qualquer preço. Cada vez menos pessoal tem de lidar com cada vez mais tarefas. Os salários devem cair, as pausas devem de preferência desaparecer. A sovinice é fixe quando se trata das condições de trabalho. A crise acelerou ainda mais essa mania de poupança, mesmo à custa do controlo de qualidade. Devoluções, avarias, falhas e escândalos não param de subir. A radicalização da economia empresarial vinga-se na própria economia empresarial. Isto acontece simplesmente porque a noção capitalista de "eficiência" é completamente oca. Ela não se refere a qualquer conteúdo específico da produção, mas somente à maximização do lucro abstracto, que parece ter atingido definitivamente o seu nível de incompetência histórica.

É justamente por essa razão que é preciso estender a mania da poupança da economia empresarial à vida quotidiana. Escolas, institutos científicos, teatros e infantários têm de ser administrados como empresas e orientados segundo o ponto de vista da redução de custos, o mesmo acontecendo até com as relações pessoais. Cada ser humano é considerado uma administração de empresa com duas pernas e nos testes (por exemplo, do Serviço de Emprego) chamam-lhe a atenção para despropositados "potenciais de racionalização" da sua opção de vida. O slogan satírico "dorme mais depressa, camarada" surge como séria brutalidade do capitalismo; e a pressão geral para o "aumento da eficiência" sem sentido atingiu a dimensão de uma neurose social compulsiva.

No entanto, o imperialismo da economia tem duas caras. Enquanto, por um lado, domina uma sovinice até ao último tostão no regimento do tempo abstracto, e nas empresas até a ida à casa de banho é controlada, por outro lado, impõe-se uma cultura de esbanjamento perfeitamente feudal. À mania de poupança da economia empresarial corresponde a mania das grandezas da economia empresarial, que faz medrar as suas flores na corrupção política. Um bom exemplo é actualmente o dos caminhos-de-ferro alemães, com o absurdo projecto de prestígio Estugarda 21. Os custos estimados, segundo uma consultora independente, subiram de 4 para 7 e agora para um total de 12 mil milhões de euros. Para as linhas de tráfego local e de mercadorias não há dinheiro, mas para o tráfego do ICE [o TGV alemão – Nt. Trad.] entre metrópoles, que irá competir com o avião, já pode haver mãos largas. Esta pirâmide em construção também vai cair, ao que tudo indica, sobre os seus autores, pois o resultado previsível é a ruína do investimento.

O pensamento ruinoso da economia de prestígio também se estendeu a todos os sectores da sociedade, tal como a fúria de poupança sovina. São as duas faces da mesma moeda. Municípios que reduzem o pessoal nos serviços e nos transportes anseiam por grandes eventos (ver o caso de Duisburg e o desastre da Love Parade), outros querem construir de raiz estádios para jogos internacionais, apesar de já estarem a racionar quase até o papel higiénico. E os próprios "empresários da sua força de trabalho", que se deixam fazer de bobos da pressa do serviço, da vigilância omnipresente e de programas sem sentido de racionalização do tempo de vida, afogam-se em dívidas por causa de consumos de prestígio ainda mais neuróticos, dívidas para cujo serviço tiram depois à própria boca. Se a sociedade oscila entre comportamentos extremamente contraditórios, tal não constitui propriamente um sinal de estabilidade. Quem se racionaliza até à morte precisa, em compensação, de pavonear-se com grandezas maiores que a vida. Em ambos os casos se trata de esgotamento total alienado; mas agora é o mundo que se está a afundar com requinte.

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