Ciência Social e Revolução
A Síntese socialista, esta terceira forma de sociedade, que Proudhon chamará “Liberdade” ou “Justiça”, está para “descobrir”. É portanto indispensável elaborar a ciência da sociedade que faz tanta falta à humanidade na sua procura de soluções ao problema social. Proudhon quer-se iniciador desta ciência cuja finalidade é partir duma análise crítica das categorias económicas, políticas e sociais, traçar em plano o “Templo de Justiça e de Liberdade”, quer dizer a sociedade real, sociedade evolutiva à vontade duma dinâmica de tensões “evoluindo num campo de forças estruturando o movimento social” (31).
Toda a vontade revolucionária está votada ao desaire, ao perpétuo recomeço do que já foi, se não tem como preliminar esta realização teórica:
“Trabalhemos para o futuro. Descrevemos a Revolução; ela chegará quando puder. Além disso é preciso conhecê-la, se quisermos que ela chegue” (32).
As leis fundamentais desta ciência devem ser prioritariamente procuradas na esfera económica. Organizar o político ou o jurídico só por si seria uma ilusão se as contradições económicas subsistissem. Em compensação, a organização racional e justa do trabalho e da troca permitirá, produzirá mesmo, espontanea-
mente, as formas políticas e jurídicas que ela “merece”. É assim que a organização hieráquica e desigual da oficina (inteiramente contida no princípio de apropriação privada), cria o Direito e o Estado “burguês” do mesmo modo que a vida social (exploração, alienação...).
Existe portanto indiscutivelmente, para Proudhon, uma primazia da economia no sentido amplo (33); a organização económica determina a estrutura política, a alienação económica gera a alienação política (34),... “no ponto de vista da organização, as leis da economia política são as leis da História” (35).
A ciência social deverá portanto construir-se a partir de interpretações económicas aliadas a uma aproximação sociológica. Com efeito, se a análise do elemento determinante que é a economia permanece preponderante, a “ciência da sociedade” não pode ocultar os envólucros políticos, ideológicos e jurídicos...que fazem da sociedade um todo coerente (36):
“A propriedade não constitui todo o sistema. Vive num meio organizado, rodeada dum certo número de funções análogas e de instituições especiais (...), com as quais por conseguinte, é preciso contar.” (37)
Contudo, é à apropriação privada dos meios de produção que regressa a responsabilidade da “insociabilidade essencial das relações de produção” (38), causa primeira dos disfunciona-
mentos económicos e sociais na troca (produção, consumo, valor,...) como na organização (submissão do trabalho ao capital, repartição igualitária das riquezas,...), cristalizando-se socialmente no “antagonismo de classes” (39). A origem primeira das contradições económicas, como dos antagonismos sociais, resume-se assim no açambarcamento proprietário. Demasiados socialistas não souberam ultrapassar a acusação sistemática das divagações do mercado e a exploração dos trabalhadores; ora esta diligência volta a tomar o efeito pela causa, e mais ainda, a condenar tudo o que pode existir no arsenal económico liberal. É deste modo que a concorrência económica é negada pela maioria dos socialistas sem uma real análise, sem tomar em consideração o seu papel económico motor, sem mesmo ver a relação de necessidade que ela mantêm com a concorrência, ou com a liberdade política:
“A concorrência (...) é o modo segundo o qual se manifesta e se exerce a actividade colectiva, a expressão da espontaneidade social, o emblema da democracia e da igualdade, o instrumento mais enérgico da constituição do valor, o suporte da associação. Como impulso das forças individuais, é a caução da sua liberdade, o primeiro momento da sua harmonia, a forma da responsabilidade que as une a todas e as rende solidárias. Mas a concorrência abandonada a ela mesma e privada da direcção dum princípio superior e eficaz, não é mais que um movimento vago, uma oscilação sem objectivo do poder industrial, eternamente agitada entre estes dois extremos igualmente funestos: dum lado as corporações e o patronato (...), doutro lado o monopólio”. (40)
O funcionamento capitalista arrasta um estado no qual “a concorrência destroi a concorrência” (41) naquilo que ela tem de mais necessário: garantia das liberdades individuais e associativas, “estimulando o insubstituível” (42), “força motriz” fora da qual “não resta a não ser esta alternativa: o encora-jamento, uma mistificação ou o sacrifício, uma hipocrisia” (43).
Por fim, a ciência social deve pôr em evidência os mecanismos de constituição, de determinação, de socialização do valor; ora esta “não pode ser descoberta a não ser pela concorrência, nunca por instituições comunistas ou por um decreto do povo” (44). Não constitui questão destruir a concorrência, “trata-se de encontrar o equilíbrio, diria de boa vontade a polícia” (45).
A Revolução não pode criar do nada, do mesmo modo que ela não se pode conceber como meramente destruidora; ela é, ao mesmo tempo, destruição e conservação. É à ciência social que pertence prepará-la, defini-la, anunciá-la, de lhe dar uma “Ideia Geral”; falta-lhe reconhecer as leis reais das quais as formas parciais ou enviesadas (46) aparecem na sociedade oficial (47). Só a teorização científica destas leis permitirá compreender as divagações passadas mas também as condições, os meios, o fim da Revolução. “A teoria do Progresso, é o caminho de ferro da liberdade” (48), é por ela que a classe oprimida (mas também a pequena burguesia vítima da tendência monopolista do mercado) dará um sentido à espontaneidade da sua acção.(49)
A Síntese socialista, esta terceira forma de sociedade, que Proudhon chamará “Liberdade” ou “Justiça”, está para “descobrir”. É portanto indispensável elaborar a ciência da sociedade que faz tanta falta à humanidade na sua procura de soluções ao problema social. Proudhon quer-se iniciador desta ciência cuja finalidade é partir duma análise crítica das categorias económicas, políticas e sociais, traçar em plano o “Templo de Justiça e de Liberdade”, quer dizer a sociedade real, sociedade evolutiva à vontade duma dinâmica de tensões “evoluindo num campo de forças estruturando o movimento social” (31).
Toda a vontade revolucionária está votada ao desaire, ao perpétuo recomeço do que já foi, se não tem como preliminar esta realização teórica:
“Trabalhemos para o futuro. Descrevemos a Revolução; ela chegará quando puder. Além disso é preciso conhecê-la, se quisermos que ela chegue” (32).
As leis fundamentais desta ciência devem ser prioritariamente procuradas na esfera económica. Organizar o político ou o jurídico só por si seria uma ilusão se as contradições económicas subsistissem. Em compensação, a organização racional e justa do trabalho e da troca permitirá, produzirá mesmo, espontanea-
mente, as formas políticas e jurídicas que ela “merece”. É assim que a organização hieráquica e desigual da oficina (inteiramente contida no princípio de apropriação privada), cria o Direito e o Estado “burguês” do mesmo modo que a vida social (exploração, alienação...).
Existe portanto indiscutivelmente, para Proudhon, uma primazia da economia no sentido amplo (33); a organização económica determina a estrutura política, a alienação económica gera a alienação política (34),... “no ponto de vista da organização, as leis da economia política são as leis da História” (35).
A ciência social deverá portanto construir-se a partir de interpretações económicas aliadas a uma aproximação sociológica. Com efeito, se a análise do elemento determinante que é a economia permanece preponderante, a “ciência da sociedade” não pode ocultar os envólucros políticos, ideológicos e jurídicos...que fazem da sociedade um todo coerente (36):
“A propriedade não constitui todo o sistema. Vive num meio organizado, rodeada dum certo número de funções análogas e de instituições especiais (...), com as quais por conseguinte, é preciso contar.” (37)
Contudo, é à apropriação privada dos meios de produção que regressa a responsabilidade da “insociabilidade essencial das relações de produção” (38), causa primeira dos disfunciona-
mentos económicos e sociais na troca (produção, consumo, valor,...) como na organização (submissão do trabalho ao capital, repartição igualitária das riquezas,...), cristalizando-se socialmente no “antagonismo de classes” (39). A origem primeira das contradições económicas, como dos antagonismos sociais, resume-se assim no açambarcamento proprietário. Demasiados socialistas não souberam ultrapassar a acusação sistemática das divagações do mercado e a exploração dos trabalhadores; ora esta diligência volta a tomar o efeito pela causa, e mais ainda, a condenar tudo o que pode existir no arsenal económico liberal. É deste modo que a concorrência económica é negada pela maioria dos socialistas sem uma real análise, sem tomar em consideração o seu papel económico motor, sem mesmo ver a relação de necessidade que ela mantêm com a concorrência, ou com a liberdade política:
“A concorrência (...) é o modo segundo o qual se manifesta e se exerce a actividade colectiva, a expressão da espontaneidade social, o emblema da democracia e da igualdade, o instrumento mais enérgico da constituição do valor, o suporte da associação. Como impulso das forças individuais, é a caução da sua liberdade, o primeiro momento da sua harmonia, a forma da responsabilidade que as une a todas e as rende solidárias. Mas a concorrência abandonada a ela mesma e privada da direcção dum princípio superior e eficaz, não é mais que um movimento vago, uma oscilação sem objectivo do poder industrial, eternamente agitada entre estes dois extremos igualmente funestos: dum lado as corporações e o patronato (...), doutro lado o monopólio”. (40)
O funcionamento capitalista arrasta um estado no qual “a concorrência destroi a concorrência” (41) naquilo que ela tem de mais necessário: garantia das liberdades individuais e associativas, “estimulando o insubstituível” (42), “força motriz” fora da qual “não resta a não ser esta alternativa: o encora-jamento, uma mistificação ou o sacrifício, uma hipocrisia” (43).
Por fim, a ciência social deve pôr em evidência os mecanismos de constituição, de determinação, de socialização do valor; ora esta “não pode ser descoberta a não ser pela concorrência, nunca por instituições comunistas ou por um decreto do povo” (44). Não constitui questão destruir a concorrência, “trata-se de encontrar o equilíbrio, diria de boa vontade a polícia” (45).
A Revolução não pode criar do nada, do mesmo modo que ela não se pode conceber como meramente destruidora; ela é, ao mesmo tempo, destruição e conservação. É à ciência social que pertence prepará-la, defini-la, anunciá-la, de lhe dar uma “Ideia Geral”; falta-lhe reconhecer as leis reais das quais as formas parciais ou enviesadas (46) aparecem na sociedade oficial (47). Só a teorização científica destas leis permitirá compreender as divagações passadas mas também as condições, os meios, o fim da Revolução. “A teoria do Progresso, é o caminho de ferro da liberdade” (48), é por ela que a classe oprimida (mas também a pequena burguesia vítima da tendência monopolista do mercado) dará um sentido à espontaneidade da sua acção.(49)
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