segunda-feira, dezembro 06, 2010

Julian Assange quer mudar o mundo com a WikiLeaks, começando pelos EUA

Enquanto se ouvem políticos americanos a classificar como terrorista o fundador do site que publicou a maior fuga de informação da história, ele apela à demissão de Clinton e Obama

As ambições de Julian Assange, o fundador e a alma por trás do projecto WikiLeaks, o site que divulgou as mais de 250 mil comunicações diplomáticas norte-americanas, não são pequenas: "Haverá um antes e um depois do Cablegate", ou seja, do escândalo dos telegramas diplomáticos, disse numa entrevista ao jornal El País. Mudar o mundo é, nem mais nem menos, a sua ambição.

É legítimo duvidar se conseguirá. Mas é verdade que Assange estoirou nos céus do planeta mediático desde o Verão como um cometa veloz - e arrisca-se a receber o título de "homem do ano" da revista Time.

Isto apesar de se ter transformado no inimigo número um dos Estados Unidos, com a duvidosa honra de ouvir o ex-speaker republicano da Câmara dos Representantes Newt Gingrich dizer que ele deve ser classificado como um "combatente inimigo" - uma outra maneira de dizer terrorista.

"Digo isto muito seriamente", afirmou Gingrich ontem na televisão Fox News. "A guerra da informação também é guerra. E Julian Assange está a fazer guerra. O terrorismo da informação, que faz com que sejam mortas pessoas, é terrorismo. E Julian Assange faz terrorismo. Deve ser tratado como um combatente inimigo e [o site] WikiLeaks deve ser encerrado de forma permanente e definitiva."

Assange está escondido porque há um mandado de captura contra ele, a pedido da Suécia. As autoridades querem interrogá-lo devido a queixas apresentadas por duas mulheres, relativas a violência sexual - acusações que ele nega, e diz terem sido apresentadas para o travar. Veio a lume que o motivo terá sido falta de preservativo num segundo acto sexual.

Mas se não se vê Assange, a sua pre- sença foi sentida em entrevistas e chats. Foi assim que apelou à demissão da secretária de Estado americana, se se verificar que foi por ordem de Hillary Clinton que foram espiados elementos das Nações Unidas - entre os quais o próprio Ban Ki-moon.

E mais: "Toda a cadeia de comando que soube desta ordem e a aprovou de- ve demitir-se se os Estados Unidos querem ser vistos como uma nação credível que obedece às leis", respondeu ao El País, quando interrogado sobre se o Presidente Barack Obama não deveria demitir-se também.

Não é talvez surpreendente que os EUA tenham reagido à divulgação dos seus telegramas diplomáticos com fúria. Mas o Departamento de Defesa e outros serviços federais, noticia o New York Times, emitiram uma ordem para que os funcionários públicos não vejam sequer os documentos divulgados pela WikiLeaks. Na Biblioteca do Congresso, desde sexta-feira que não é possível aceder ao site.

Esta reacção, que parece saída de 1984, de George Orwell, numa altura em que a informação está disseminada, será um ponto a favor de Assange e da sua vontade de mudar o mundo - ou os EUA, que são o seu alvo.

Várias empresas americanas cortaram relações com a WikiLeaks, supõe-se que em resultado de pressões políticas - como a Amazon, que alojava o site nos servidores de uma sua filial, e a empresa de processamento pagamentos on-line Paypal.

Ontem, a WikiLeaks acabou por ficar reduzida a alojar o site num servidor sueco. Mas Assange reagiu com um jogo de cintura próprio de uma organização com base na Internet - uma start-up de um novo tipo, como escreveu no site da revista New Yorker Raffi Khatchadourian, que este Verão publicou um belo perfil de Assange.

O acontecimento de domingo foi a mobilização, através do Twitter - que continua a ser a principal forma de comunicação da WikiLeaks -, para encontrar servidores que alojassem versões-espelho do site, com os telegramas do Departamento de Estado.

Ontem à noite, a lista destes servidores "oficiais" ia em 76, de toda a parte do mundo. Ofertas de pessoas prontas a seguir o lema da WikiLeaks, criado para incentivar as fugas de informação: "A coragem é contagiosa."

Sem comentários: