quarta-feira, dezembro 22, 2010

Parece que a História é sempre a mesma estória...

"…plantai batatas, ó geração do vapor e de pó de pedra; macadamizai estradas; fazei caminhos-de-ferro; construí passarolas de Ícaro, para andar, a qual mais depressa, estas horas contadas de uma vida toda material, maçuda e grossa, como tendes feito esta que deus nos deu, tão diferente do que a que hoje vivemos. Andai, ganha-pães, andai; reduzi tudo a cifras, todas as considerações deste mundo a equações de interesse corporal; comprai, vendei, agiotai. - No fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana? Que há mais umas poucas de dúzias de homens ricos. E eu pergunto aos economistas-políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico. – Que lho digam no Parlamento inglês, onde, depois de tantas comissões de inquérito, já deve de andar orçado o número de almas que é preciso vender ao Diabo, o número de corpos que se tem de entregar antes do tempo no cemitério para fazer um tecelão rico e fidalgo como Sir Robert Peel, um mineiro, um banqueiro, um granjeeiro -seja o que for, cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis."

Almeida Garrett
Viagens na minha terra, cap III
Livro publicado em 1843


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