Para uma dialéctica da compreensão do poder
(soares versus cavaco)
As pessoas não podem embandeirar em arco com isto...
Do público:
A sala irrompia em aclamação ao ex-Presidente da República Mário Soares, depois de este ter exigido a demissão do Presidente da República. Fosse na galeria superior como na inferior, a Aula Magna vaiava Cavaco Silva, chamava-lhe “cobarde”, ao mesmo tempo que ovacionava o fundador do PS. E, no entanto, um pequeno grupo na primeira fila não aplaudia. Eram poucos, mas estavam ali a representar os partidos – Alberto Martins, líder parlamentar do PS, estava de mãos no colo, assim como o ex-secretário-geral do PS Ferro Rodrigues. E ainda alguns comunistas, liderados pelo histórico Domingos Abrantes, que estavam na fila da frente.
A postura destas personalidades contrastou com o ambiente apoteótico com que a audiência acolheu o violento discurso que Mário Soares proferiu. O ex-chefe de Estado não perdeu muito tempo a ir directo ao assunto. “É por isso que digo: o Presidente e o Governo devem demitir-se, enquanto podem ainda ir para suas casas pelo seu pé. Caso contrário, serão responsáveis pela onda de violência que também os atingirá”, exigiu.
Soares repetiu a exigência mais de uma vez. E os aplausos aumentavam a cada referência. “Por isso, ouso dizer, patrioticamente: Senhor Presidente, demita-se!”, atirou no fim da sua intervenção, que gerou na sala cheia a repetição em bloco da palavra “demissão”.
Sem esquecer que isto existiu e aconteceu!...
Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/83
Vêm sendo frequentes os comportamentos assumidos por
grupos de pessoas, mais ou menos numerosos, que ofendem ou põem em perigo
interesses juridicamente protegidos, públicos ou privados,
perturbando ou impedindo o funcionamento de serviços públicos essenciais, tais
como os de transportes, sequestrando pessoal e exercendo coacção sobre
funcionários ou agentes da Administração Pública, desobedecendo a mandados
legítimos da autoridade e afectando o livre desenvolvimento de
actividades económicas.
Tais comportamentos, de todos conhecidos, pela sua frequência e
pela divulgação que lhes é dada pelos órgãos de comunicação social, geram na
opinião pública um sentimento de insegurança e a falsa ideia de que a ordem e a
tranquilidade públicas podem ser impune e publicamente violadas pela lei do
mais forte ou do mais ousado, com total descrédito das instituições e do
prestígio da autoridade democraticamente legitimada, o que é inadmissível num
Estado de direito.
Quaisquer que sejam as motivações dos promotores e agentes de tais condutas e por mais justas que se apresentem as reivindicações desses grupos de pressão, não pode o Governo demitir-se do dever de garantir a legalidade e a normalidade da vida social e, bem assim, a integridade de pessoas e de bens, perante actos de frontal desrespeito da lei e de provocação ao poder legitimamente constituído.
Quaisquer que sejam as motivações dos promotores e agentes de tais condutas e por mais justas que se apresentem as reivindicações desses grupos de pressão, não pode o Governo demitir-se do dever de garantir a legalidade e a normalidade da vida social e, bem assim, a integridade de pessoas e de bens, perante actos de frontal desrespeito da lei e de provocação ao poder legitimamente constituído.
Entre nós, como em qualquer sociedade civilizada, os actos que
integram os comportamentos acima referenciados constituem infracções
penais puníveis com rigor, pelo que não pode o Governo quedar-se na passividade
perante a sua prática sem trair um seu dever essencial, qual seja o do
exercício do poder punitivo do Estado pré-ordenado à defesa da sociedade e à
tutela dos seus valores vitais.
Não poderão ser tolerados os comportamentos ilícitos que se
traduzem em cortes de estradas e interrupção do tráfego rodoviário, cortes de
vias férreas para impedir a circulação de comboios, sequestro de pessoas,
designadamente de gerentes ou administradores de empresas, perturbação de serviços públicos,
coacção ou ameaças sobre funcionários Públicos, desobediência a mandados
da autoridade, desvio de meios de transporte públicos, ocupação de casas
de habitação, coacção sobre órgãos de soberania e das autarquias locais.
Assim:
O Conselho de Ministros, reunido em 8 de Setembro de 1983, e tendo em vista um maior rigor e intensificação da acção policial e penal, bem como o esclarecimento dos cidadãos em geral, resolveu:
O Conselho de Ministros, reunido em 8 de Setembro de 1983, e tendo em vista um maior rigor e intensificação da acção policial e penal, bem como o esclarecimento dos cidadãos em geral, resolveu:
Determinar que as forças de segurança, em coordenação de
esforços e uniformidade de acção, tomem, de imediato, as medidas legais
adequadas à prevenção dos referidos comportamentos e à responsabilização
criminal de todos os seus agentes e promotores, no quadro da lei penal vigente.
Presidência do Conselho de Ministros. – O Primeiro-Ministro,
Mário Soares.