terça-feira, setembro 02, 2014

De reforma em reforma

Reformite crónica Reformar, reformar, reformar. Reformar como se não houvesse amanhã. Reformar como se não houvesse pessoas. Reformar como se mudança fosse sempre significado de melhoria e nunca de retrocesso social. Reformar sem dar à sociedade e à economia tempo para absorverem os contornos da reforma anterior. Reformar com a garantia de que se reforma diante de uma plateia apática que não usa o voto para punir e para premiar. Reformar muito, reformar sempre. Até ao negócio final. É a vez da Justiça. Ao todo, são perto de 35 milhões de euros que foram ou vão ser adjudicados por ajuste directo, incluindo a contratação de juristas, informáticos e até a aquisição de serviços de imagem e comunicação. As empreitadas, umas custam acima de 1,4 milhões de euros, outras não chegam aos dois mil. Em comum, as mais de 100 empreitadas previstas para os tribunais portugueses no âmbito do novo mapa judiciário têm a ausência de concursos públicos, o Governo teve o cuidado de fabricar um regime de excepção para conferir legalidade a negócios que de outra forma seriam completamente ilegais. E o pior é que o pior dos piores de mais esta malfadada reforma nem sequer são todos estes milhões, nem tão-pouco a falta de transparência das adjudicações. Se a nossa indignação se concentrar exclusivamente neles, fazemos o grande favor de contribuir quer para que não se repare na quantidade de gente cujo acesso à Justiça ficará definitivamente comprometido, quer nos acréscimos de ineficiência e de ineficácia que alimentarão ainda mais aquela impunidade que sempre se esconde atrás das cortinas de fumo às quais a fúria reformista da última década tem tido o cuidado de dar forma de "interesse nacional". A reforma da Justiça de que Portugal necessita para se ver a salvo de governantes, banqueiros delinquentes e toda a restante fauna de parasitas corruptos não é esta. Esta foi apenas mais uma que eles voltaram a engendrar para poderem adiar novamente aquela outra que nunca teremos enquanto não alterarmos radicalmente a forma como temos acomodado todas as anteriores.

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