quinta-feira, outubro 23, 2014

Prioridades: da longa série "reformas estruturais necessárias"

Pareceres, estudos, trabalhos especializados. Às vezes são mesmo necessários, noutras, pelo contrário, são tão desnecessários que qualquer cêntimo que seja gasto na sua aquisição inscreve-se naquela definição clássica de “gordura do Estado” que nas últimas décadas tem servido como argumento para desmantelar as raspas de Estado social que os nossos impostos puderam construir. O Estado recorre a fornecedores externos mormente em duas situações: ou quando o decisor se confronta com duas insuficiências, a de não haver na Administração Pública quem os realize capazmente e a de não haver vontade política para contratar os quadros necessários para suprir de uma vez por todas a primeira inexistência, ou quando o decisor se confronta com a sua própria necessidade de dar a ganhar a alguém que lhe é próximo determinada soma, nem sempre pequena e nem sempre posteriormente repartida por baixo da mesa ou com quem autoriza o negócio, ou com os cofres do partido respectivo.

No caso dos trabalhos especializados, estudos e pareceres realmente necessários, não é indiferente ter meios próprios para os realizar ou confiá-los a terceiros, como ficou demonstrado com o caos gerado pela recente falência do Citius, órfão de responsáveis, ou como se pode facilmente constatar pelos milhões que se desperdiçam todos os anos por não haver uma aplicação informática de contabilidade e gestão pública de utilização universal em todo o Estado.

No caso dos trabalhos especializados, estudos e pareceres inúteis e completamente desnecessários, é perfeitamente indiferente qual dos três partidos do nosso rotativismo é que está no poder. Quando, por um acaso excepcional, lá calha que uma ex-ministra do PS é condenada pela fortuna que pagou ao amigo para tirar umas fotocópias compradas e vendidas como “estudo”, é a vez da claque laranja apontar o dedo e a da claque rosa de se mostrar indignada com tamanha injustiça. Quando, pelo contrário, é a vez de um Governo PSD/CDS fazer desaparecer das “gorduras” da Educação os cerca de 700milhões que fez aparecer nas “magrezas” dos seus estudos, pareceres e trabalhos especializados, os papeis das duas claques invertem-se. A alternância é garantida pela capacidade infinita de auto-flagelação dos portugueses, que não hesitam em devolver o poder a uns para punir os outros. Mudar, sim, mas pouco, que “a estes, ao menos, já os conhecemos”.