"Devia haver uma disciplina sobre o mundo digital"
Diz, "empresário na área de produção de conteúdos digitais
Estes são dois títulos da imprensa de hoje, que me chegaram às mãos. Não estranharia que tivessem sido publicados mais deste teor. Explico porquê."Violência doméstica vai ser tratada nas escolas"
Diz secretária de estado da Igualdade (Sol, 07/11/2014, p. 24-25)
1. A escola passou a ser vista como a tábua de salvação para todos os problemas que afectam a sociedade e que a sociedade não sabe ou não quer resolver:
se as pessoas não vão votar, pede-se à escola para resolver,
se se entende que as pessoas não têm uma alimentação correcta, pede-se à escola para resolver;
se se entende que as práticas sexuais se desviam da cartilha; pede-se à escola para resolver;
se se entende que somos responsáveis pela desgraça económica, pede-se à escola para resolver;
se se entende que existe discriminação de qualquer tipo, pede-se à escola para resolver;
se se entende que se bebe ou fuma demais, pede-se à escola para resolver;
se se entende que os hábitos de higiene não são os melhores, pede-se à escola para resolver;
etc, etc, etc.
Pode-se alegar a importância, a extrema importância, a urgência, até, de cada uma destas "educações para...". Em geral é isto que acontece. "Se não for a escola a..." - é o argumento. Um argumento "mais-que-estafado", que me recuso a aceitar.
Uma razão é que, com tantas solicitações à escola, esvai-se o tempo e a disponibilidade para se ensinar e se aprender o essencial, as matérias que nenhuma outra instituição trabalha com a mesma extensão e profundidade
Outra razão é que as "educações para..." decorrem de opções ideológicas e de outras ainda menos confessáveis. Ora, a escola não serve para doutrinar ou para empurrar, mas para ensinar o que tem sentido que ensine.
2. Instalou-se a ideia de que qualquer pessoa, grupo, conselho, associação, empresa... pode e deve dar opinião sobre o currículo escolar, com destaque para a sua composição. Mais, pode e deve fazer pressão para que nele conste "mais isto", ou que nele conste "isto em vez daquilo".
Pode-se alegar a importância da participação da comunidade na escola, na medida em que a escola a todos diz respeito. Não nego a relevância dos processos de auscultação à comunidade, mas a educação formal (também) tem de ser ponderada por quem entenda do assunto. Em concreto, o currículo não pode ser visto como uma soma de partes desconexas, introduzida uma agora e outra logo, tendo uma o sentido A, outra o sentido B... O currículo tem de ser encarado como um todo consistente, um todo que decorre de decisões amadurecidas por referência ao que é Bem para os alunos, para a Sociedade e para a Humanidade e nunca num horizonte de curto prazo.
Trata-se de decisões as mais da vezes demoradas e sempre difícies que não nada têm a ver com a ligeireza das propostas que cada vez mais pessoas e entidades fazem, em função daquilo que as preocupa ou dos interesses que têm num determinado momento.
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